A dificuldade de acesso a corpos para os estudos de Anatomia levou, em 2016, à criação, por lei estadual, do Conselho Estadual de Distribuição de Cadáveres para fins de Ensino (Cedice). "O objetivo é regulamentar a doação de cadáveres para fins de ensino com um detalhamento que propicia transparência e justiça nessa distribuição, estabelecendo critérios e uma ordem de destinação", explica o presidente do Conselho, Francisco Hugo Leandro, coordenador de Medicina Legal da Perícia Forense do Estado (Pefoce).
Atualmente, as oito escolas médicas do Ceará têm assento no Cedice e recebem doações em esquema de rodízio, começando com as públicas, seguidas das privadas, por ordem de fundação. Desde o início da atuação do Conselho, cinco corpos não-reclamados já foram doados efetivamente e outros sete estão em processo de doação. Também participa do conselho o Serviço de Verificação de Óbitos (SVO).
O Conselho ajudou a "fazer a fila andar", mas os trâmites ainda são morosos pela complexidade, em si, da doação. A legislação faz exigências. "A lei federal proíbe a destinação de corpos de vítimas de morte violenta para fins de estudo. Então são, necessariamente, corpos de pacientes vítimas de morte natural, identificados ou não. Os identificados, esses necessariamente, são corpos que não são reclamados pelos familiares", explica o presidente do Cedice.
A Pefoce possui, desde 2015, um Laboratório de Identificação de Desconhecidos e Desaparecidos. O especialista em Papiloscopia cruza informações de características físicas e impressões digitais no sistema de busca automática, para descobrir a identificação. "Se a pessoa fez um RG de 2007 pra frente, essa impressão digital, muito provavelmente, já está no sistema. Se ela foi identificada criminalmente, em alguns casos também é possível buscar essas informações", explica Humberto Quezado, assessor técnico da Pefoce.
Em caso de óbito, aqueles identificados de morte natural podem ser doados, desde que haja publicação dos editais em jornais de grande circulação por 10 dias. Passado um mês sem reclamação da família, o corpo vai para a universidade listada pelo Cedice. O processo pode durar até um ano. A doação daqueles que, mesmo depois de análise no sistema da Pefoce, não foram identificados, é mais rápida, dura de três a quatro meses.
Diante da burocracia na obtenção de corpos de forma legal, as universidades partem para a implantação de alternativas para driblar a falta de material para estudo de futuros médicos do Ceará. Esse é o tema da próxima edição, publicada amanhã, na série especial "Além da Vida".