12 sedativos para intubar pacientes com Covid-19 estão em falta

Dos 22 medicamentos necessários à internação por ventilação mecânica, maioria está sem estoque no Ceará. Outros três devem durar menos de 10 dias. Entidades cobram articulação entre estados e Ministério da Saúde

Escrito por Nicolas Paulino , nicolas.paulino@svm.com.br
Ceará tem falta ou carência de medicamentos sedativos para intubar pacientes com Covid-19
Legenda: Ceará tem falta ou carência de medicamentos sedativos para intubar pacientes com Covid-19

Pelo menos 12 medicamentos sedativos, como anestésicos e relaxantes musculares, estão em falta no Ceará, segundo levantamento do Conselho Nacional de Secretários de Saúde (Conass) realizado junto às Secretarias Estaduais entre os dias 19 e 22 de junho. A lista realizou a checagem de 22 fármacos considerados importantes em procedimentos de intubação de pacientes com Covid-19, cujos agravos respiratórios precisam ser submetidos a ventilação artificial. O problema é recorrente em outros 21 estados.

Entre os insumos zerados no Ceará, estão medicamentos com consumo médio mensal entre 23 mil e 465 mil unidades, como rocurônio e besilato de atracúrio. Outros dois - besilato de cisatracúrio e citrato de fentanila - só dariam cobertura para mais um dia, e, o midazolam, para mais 10 dias. Três fármacos da lista devem durar menos de um mês. Apenas quatro deles têm situação mais "confortável", com duração estimada entre 35 e 90 dias.

"Estamos prestes a ter desabastecimento em todos os estados de medicamentos que a gente chama 'kit de UTI', relaxante, anestésico, etc. Vamos competir de novo na área internacional por medicamentos. Isso demonstra um erro grave de política de planejamento nacional", alertou o secretário-executivo do Conass, Jurandi Frutuoso, durante participação no Seminário de Gestores Públicos - Prefeitos Ceará, na última quarta-feira (24).

Na tarde do mesmo dia, o consultor de assistência farmacêutica do Conselho, Heber Dobis, levou a lista à uma reunião técnica da Comissão Externa de Ações Contra o Coronavírus, da Câmara Federal. Segundo ele, 18 secretarias estaduais estão com atrasos na entrega dos produtos, e 13 dos 20 novos procedimentos de compra abertos nos últimos meses não encontraram fornecedores. A entidade denuncia o desabastecimento dos sedativos desde o fim de maio.

Articulação

A Secretaria da Saúde do Ceará (Sesa) destacou que "há uma dificuldade generalizada na compra desses itens, e o mercado farmacêutico não consegue absorver as demandas de todos os estados brasileiros". A Pasta indicou uma articulação do Conass junto ao Conselho Nacional dos Secretários Municipais de Saúde (Conasems) para evitar o desabastecimento de medicamentos em todo o País.

Explicou ainda que, no "kit intubação" proposto pelo Conass, existem medicamentos "não padronizados pela Sesa". Questionada sobre os protocolos recomendados para manter as internações dos pacientes mais graves, a Secretaria afirmou que, no contexto da Covid-19, "os medicamentos podem ser substituídos por outros da mesma classe terapêutica, em consonância com a oferta do mercado".

"A morfina é de uso corriqueiro para dor e pós-cirúrgicos, principalmente. A falta desses medicamentos, no geral, influencia na qualidade da assistência, na segurança do paciente e no custo", explica a mestra em Ciências Farmacêuticas e professora universitária Patrícia Fernandes.

"Isso pode provocar o adiamento ou cancelamento de procedimentos, que vão aumentar o tempo de internação do paciente".

Segundo a especialista, a substituição dos fármacos não dá segurança de eficácia suficiente aos médicos da linha de frente. Patrícia evidencia que a logística de produção e distribuição dos medicamentos é complexa e, principalmente no Brasil, as indústrias importam insumos por via aérea - e muitos voos foram cancelados por causa da pandemia. "A cadeia terrestre também foi afetada, sem falar na demanda, que aumentou muito", pondera Patrícia.

Má colocação

O ranking do Conass coloca o Ceará na última posição do Nordeste, junto com o Maranhão, onde também faltam 12 fármacos. No Rio Grande do Norte, a falta atinge 10 medicamentos, e os demais devem durar menos de um mês.

Os estoques dos 14 sedativos restantes de Pernambuco só têm cobertura para mais uma quinzena. Apenas Alagoas informou uma situação confortável: todos os medicamentos estão assegurados por quatro meses.

A Comissão Externa da Câmara pedirá ao Ministério da Saúde (MS) e à Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) uma relação de todas as empresas que fazem a distribuição de medicamentos usados no combate à Covid-19 com os respectivos estoques, a fim de avaliar por que estados e municípios vêm enfrentando dificuldades para adquirir os medicamentos.

Há uma semana, a Anvisa divulgou uma lista de 66 medicamentos registrados no órgão com permissão para manejo de pacientes com necessidade de ventilação mecânica.

"O objetivo é fornecer aos gestores das secretarias de saúde de estados, municípios e do Distrito Federal (DF), bem como de hospitais e serviços de saúde, a relação de todas as opções terapêuticas", informou o órgão.

Em nota, a Agência respondeu que está "trabalhando junto ao MS e aos detentores de registro a fim de mapear os estoques disponíveis e capacidades produtivas".

Também reforçou que "medidas necessárias" têm sido adotadas para permitir o aumento da disponibilidade desses medicamentos, mas lembrou que "cabe ao MS e aos Estados o abastecimento da rede de saúde".

No Ceará, a Sesa garantiu que o processo de compras "é contínuo, sempre baseado nas demandas dos serviços e seus respectivos estoques", embora ressalte um grande incremento das quantidades de compra desses medicamentos no período de pandemia. Perguntada sobre a possibilidade de desabastecimento de outros fármacos da lista, declarou que "a duração dos estoques é variável por cada medicamento".

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