Tangerina, uma vítima da violência

Legenda:
Foto: Reprodução

Um garoto nascido em Sobral nunca pensou que um dia estaria jogando no Chile e por cima, vestindo a camisa do São Paulo. Isso aconteceu com Tangerina, meia que foi revelado pelo Guarany de Sobral no final da década de 70 e se firmou no futebol cearense em 1980 quando foi escolhido o craque revelação do ano.

Com o seu jeito humilde, mesmo aos 44 anos, Tangerina diz que sempre sonhou em ser jogador de futebol e hoje sente saudades daquele tempo que se jogava por amor e não pela ganância ou pensando no dinheiro.

“Hoje em dia tudo está mais fácil. Os campos são melhores e os treinadores montam suas retrancas, mas fica melhor para quem tem habilidade. Quando eu jogava os estádios praticamente não tinha gramado ou era o capim, mas sempre entrava em campo para mostrar as minhas qualidades, além de correr e brigar pela bola. Afora isso, as condições dos clubes eram outras. Viajávamos de ônibus, muitas vezes sem nenhum confronto, mas em campo retribuíamos com boas partidas. Sempre joguei pensando no grupo, nunca fui egoísta. Participei de grandes equipe aqui e fora, mas os companheiros melhores colocados recebiam as bolas para dar seqüência ao lance ou finalizar. Acho que este foi o meu sucesso. Não sei como certas pessoas querem jogar futebol, pois não tem o menor cacoete. Bater na bola é um dom que poucos têm atualmente no Brasil”.

Quando surgiu no futebol, defendendo o Guarany, Tangerina, que foi batizado como Raimundo Constâncio Neto, jogava como meia-direita, mas sempre deixava sua marca devido a sua habilidade e senso de colocação em campo. Em 1983, era o grande nome do Cacique do Vale e foi negociado com o Fortaleza onde ficou até 1986.

Ainda no Tricolor do Pici, Tangerina conseguiu o título estadual de 1985 naquele time comandado por Pepe.

A sua transferência para o São Paulo foi um prêmio pelo seu desempenho defendendo o Leão. No time do Morumbi, Tangerina jogou ao lado de grandes nomes do futebol brasileiro e sul-americano, Gilmar, Zé Teodoro, Careca, Sidney, Pita, Nelsinho e do uruguaio Daryo Pereira, dentre outros. Lá conseguiu fazer seu pé de meia e mostrar as suas qualidades técnica, conquistando um título brasileiro (86) e um paulista (87).

“Só tenho à agradecer a Deus pelo que me deu o dom de jogar e assim consegui comprar uma casa e educar meus dois filhos e fazer muitos amigos”.

A vida de Tangerina não foi só de alegria. Em 1988, ele veio emprestado ao Ceará, mas jogou somente quatro partidas devido a uma grave contusão. Sua estréia foi contra o Calouros do Ar, depois enfrentou América e Guarany. Passou três anos sem jogar futebol e sendo submetido a quatro intervenções cirúrgicas, pelos médicos Júlio Parente, Marcos Aurélio Cunha e Agripino Magalhães. Quando participava do jogo diante do Quixadá, Tangerina foi atingido no joelho esquerdo pelo seu marcador, Batista. Começava seu sofrimento.

Voltou a jogar somente em 1991 no Fortaleza onde foi bicampeão. Tangerina peregrinou por Moto Clube (93), Flamengo (PI/94), Bacabal (MA), quando formou um meio-campo que ele chama de “notáveis”, pois era formado por jogadores como Flávio Araújo, Andrade e Adílio que jogaram no Flamengo do Rio. Hoje, Tangerina sempre mostrando aquele ar sereno, de menino do interior, vive de sua aposentadoria e ainda joga suas peladas defendendo o time de Master formado pelos amigos. Afora isso, trabalha com transporte escolar em Fortaleza.

Jader de Moraes