Pandemia pode afetar formação de garotos da base nos clubes brasileiros

Atletas do sub-20 ficam próximos do limite da idade para renovação de contrato e não disputaram jogos em quantidade significativa na temporada. Diretorias trabalham em estratégias digitais para diminui o impacto do novo coronavírus

Legenda: O Ceará hoje tem a melhor categoria de base do Nordeste, de acordo com sites especializados e por títulos conquistados
Foto: Pedro Chaves / FCF

O futebol foi afetado como um todo pelo novo coronavírus. Seja com ausência de bilheteria, corte de patrocinadores ou premiações. Mas a pandemia também afeta diretamente a formação dos atletas das categorias de base.

Na escala de evolução técnica, o impacto é maior na categoria sub-20, a última antes da profissionalização. Sem torneios, os garotos perdem a chance de mostrar serviço, o que dificulta a perspectiva de investimento do time no futuro.

É o caso do atacante Giovani Felippi, de 19 anos. Atleta da base do Atlético/MG e às vésperas de terminar o ciclo de formação, teme que a interrupção do calendário desperdice oportunidades para ser promovido ao elenco principal.

A insegurança se repete em outras centenas de garotos brasileiros com menos de 20 anos, idade limite antes da assinatura do novo contrato. A covid-19 forçou clubes a interromperem os trabalhos e levou os futuros profissionais a se tornarem inimigos do tempo. 

"A parte física e tática ainda conseguimos amenizar devido às atividades aplicadas pelo clube, mas a parte técnica com certeza será mais prejudicada", disse o atacante do Galo.

Legenda: O Leão passa por um período de transição das categorias de base, aumentando o investimento por melhores resultados

O dilema se estende também ao cenário competitivo. Com as competições paralisadas e o foco na categoria principal, os dirigentes aguardam uma posição da Confederação Brasileira de Futebol para adotar uma posição, como relatou Marcelo Paz, presidente do Fortaleza.

“Neste momento, além do custo da base, tem o porém do limite de idade. Os jovens vão se profissionalizar sem atividade e virar profissional. Tem a Copa São Paulo de Futebol Júnior em janeiro, vai ter mudança? O cenário é em aberto, ficamos de mãos atadas sem saber qual decisão tomar”, alerta.

O investimento tricolor é de R$ 250 mil mensais. Em 2020, mudou a estratégia de capacitação e contratou uma consultoria para realizar o diagnóstico dos mecanismos de formação do time.

O cuidado com as revelações é similar ao do Ceará, apontado como a melhor base do Nordeste em levantamento do portal especializado Da Base. O presidente alvinegro, Robinson de Castro, revelou que a CBF não traça discussões sobre ajustes no calendário da base, divisão sem perspectiva de competições.

“É um grande problema porque (a base) sequer entrou em alguma pauta, está totalmente fora, vai sofrer um descontinuidade. Nós iriamos para torneio sub-23, Copa do Nordeste sub-20 e campeonatos locais. No nosso CT frequentam entre 200 e 300 crianças, como vamos testar todos? Não dá”, questiona o dirigente,

Processo de formação

Os danos também se refletem aos mais jovens. A paralisação atrapalha o processo de crescimento. Em geral, as equipes costumam monitorar esse aspecto principalmente antes do sub-20 pois em poucos meses os atletas dessa faixa etária ganham estatura e precisam ser submetidos a avaliações.

"Os meninos crescem muito rápido entre 14 e 17 anos. Se não tiver um treino adequado e um bom aproveitamento, a formação pode ser comprometida. É preciso ter um trabalho individualizado e um acompanhamento fisiológico e na parte de fisioterapia", afirmou o consultor das categorias de base do Fortaleza, José Carlos Brunoro.

O processo pode ser mais especializado quando se tem uma metodologia uniforme e divisão por faixas etárias. Como no caso do Ceará, que trabalha com três módulos principais na base: iniciação (até 12 anos), lapidação (12-17) e transição (18-23).

"Logo que surgiu o coronavírus, a base recebeu auxílio dos assistentes sociais com informações para diminuir o risco de contágio da covid-19. Internamente, buscamos integrar a base com o profissional. Assim, eles têm treinos por vídeos e indicações nutricionais e de preparadores físicos”, apontou Israel Portela, diretor de futebol amador do Vovô.

A estratégia virtual é a mais adotada pelos clubes brasileiros. Mesmo os que ficam em alojamento, como o próprio Giovani Felippi, foram encaminhados para casa.

"Os garotos estão amadurecendo à força, porque voltam para casa e muitas vezes para outra realidade. Muitos têm famílias em condição vulnerável e agora enfrentam condições de vida e de alimentação inferiores às que encontram quando estão morando na Cidade do Galo", disse o coordenador da base do Atlético/MG, Júnior Chávare.

Outro ponto em análise é a rotina escolar. As aulas presenciais também estão suspensas e muitos sequer funcionam por plataformas digitais. Assim, será preciso conciliar o calendário de ensino com os torneios.