'Dói, mas precisamos parar', diz presidente do Santos sobre futebol na pandemia

Declaração vem em apoio ao desabafo do técnico Lisca

Legenda: Rueda reunido com Holan, novo treinador do Peixe
Foto: Ivan Storti / Santos FC

O desabafo do técnico Lisca, do América-MG, que pediu o adiamento da Copa do Brasil em razão do momento atual da pandemia no país, durante uma transmissão ao vivo na noite da última quarta-feira (3), não foi um caso isolado.

Contudo, as palavras mais fortes oriundas do âmbito futebolístico sobre o tema vieram de Andrés Rueda, presidente do Santos. Ele foi além do treinador e sugeriu, em entrevista à reportagem, nesta quinta (4), a suspensão de todo o futebol no país diante do aumento de casos e mortes pelo coronavírus.

"Com dor no coração, a situação está nos assustando muito, estamos perdendo a sensibilidade, falamos de vidas que não têm sentido de serem perdidas. Qualquer medida para salvar uma vida vale", questionado pela reportagem se defendia ou não a manutenção das competições.

"É uma opinião pessoal muito minha", prosseguiu o mandatário. "O Santos cumpre os protocolos, mas praticamente o elenco inteiro já pegou. Seria mais prudente, embora doa na carne, entrarmos em um período de paralisação. Suspender o campeonato mesmo, embora as entidades tenham tomado um cuidado excelente."

Para o dirigente, a pausa no futebol traria prejuízos aos times em relação às cotas de TV e patrocinadores, mas afirmou que isso não poderia estar acima de qualquer vida.

Rueda revela que o clube contratou dois infectologistas para rever todos os seus protocolos sanitários e aperfeiçoá-los. Também estuda realocar parte da estrutura de trabalho do clube para o home office. Apesar disso, ele sabe o impacto de uma paralisação para a saúde financeira do futebol brasileiro.

O dirigente enfatizou os 1840 óbitos registrados no Brasil nas últimas 24 horas, pelo consórcio de imprensa, um recorde em toda a pandemia. O país também ficou, pelo 42º dia seguido, com a média móvel acima dos mil mortos. Números que colocam o Estado brasileiro no pior momento da crise sanitária.

"O protocolo [do futebol] é coerente, mas, mesmo assim, a coisa foge do controle de uma maneira geral. E o futebol também tem que ter uma participação no sofrimento, isso dói, mas precisamos parar", completou Rueda.

Apesar de o governador João Doria (PSDB) ter decidido na última quarta fazer todo o estado de São Paulo entrar na fase vermelha - a mais rígida - do plano de contenção da pandemia, a bola continuará rolando a partir do próximo sábado (6).

"Vamos seguir o mesmo modelo que vem sendo seguido na Europa, onde vários países instituíram lockdown e mantiveram o futebol e esporte sem plateia'', disse José Medina, do Centro de Contingência paulista contra o coronavírus. "Esse tipo de atividade é controlada, até porque a população precisa de algum tipo de diversão, de entretenimento."

Rueda desabafou um dia depois de Lisca também fazer um forte apelo à Confederação Brasileira de Futebol e às autoridades para que fossem adiados os jogos da Copa do Brasil.

"Nossa classe [treinadores] realmente é uma que não se posiciona muito, com medo de represálias. Sempre que tu emite uma opinião, vai ser analisado. Nossa classe poderia se posicionar mais, usar o espaço e divulgação do futebol para trabalhar essas causas sociais", disse ele por telefone à reportagem, nesta quinta.

"Não quero que pare futebol, não. Defendo um adiamento da Copa do Brasil", afirma. "Essa competição é nacional, tem times que não têm nem série, times da Série D, sem condição de dar segurança ."

A fase inicial do torneio nacional tem 80 times, representantes de todas as regiões do país, e a disputa começa no próximo dia 9.

No entedimento de Lisca, pelos próximos 20 dias, o Campeonato Mineiro e outros estaduais poderiam encher as grades de televisão e seriam torneios seguros por não haver necessidade de deslocamentos por aeroportos.

"Minha colocação foi em relação a times pequenos e médios, que não têm condição de fazer um voo fretado, porque fazer um voo de carreira é muito complicado, conviver nos aeroportos. Ainda com essa nova cepa, há uma mudança no cenário de segurança que tinha anteriormente, é um novo momento", continuou.

Em Minas Gerais, onde o treinador trabalha, o governador Romeu Zema (Novo) decretou lockdown em duas regiões mineiras e vê um cenário de colapso se desenhar: foram quase 19 mil mortes nas últimas 24h, e 74% de ocupação geral das UTIs.