Projeto Viver une realidade virtual à terapia contra a labirintite, dentre outros transtornos

Iniciativa é nova solução para o tratamento de desequilíbrios do corpo humano e está em fase de desenvolvimento no Ceará

Escrito por Felipe Gurgel , felipe.gurgel@diariodonordeste.com.br
Legenda: Óculos, balança e um aplicativo de celular compõem a proposta do Projeto Viver, cujo protótipo está na fase de elaboração do hardware

No Brasil, três a cada 10 pessoas sofrem de transtornos de equilíbrio do corpo. A informação, creditada à Sociedade Brasileira de Otologia (SBO), dá dimensão de como é comum, para os profissionais de saúde, lidar com a frequência de pacientes com tontura, vertigem, labirintite - dentre outros sintomas e diagnósticos próprios do desequilíbrio.

A fim de otimizar o tratamento da "reabilitação vestibular" e gerar resultados mais rápidos para as pessoas que precisam cuidar da saúde corporal, uma solução inovadora já está em desenvolvimento no Ceará.

O projeto "Viver" (sigla para o termo em inglês "Virtual Vestibular Reabilition") envolve os médicos Magno Peixoto e Carla Marinelle, além de técnicos de informática e animação da startup Valente Studio, com apoio da Fundação Cearense de Apoio ao Desenvolvimento Científico e Tecnológico (Funcap) e do Laboratório de Inovação da Universidade de Fortaleza (Unifor).

A plataforma criada pelo Viver disponibiliza um par de óculos preparado para projetar imagens de realidade virtual, uma balança e um aplicativo de celular alinhados aos propósitos do tratamento. O projeto já tem um primeiro protótipo e está na fase de elaboração do hardware.

Legenda: Imagens de realidade virtual são projetadas a partir dos óculos desenvolvidos por meio do Projeto Viver, o qual visa contribuir no tratamento do equilíbrio do corpo

Segundo o otorrinolaringologista Magno Peixoto, idealizador da iniciativa, a solução impactaria o cenário dos tratamentos de saúde no Brasil por conta do custo mais acessível. Os exames de "posturografia" normalmente têm altos custos e pouca oferta, mesmo na rede privada.

Magno recorda que a ideia de desenvolver o Viver surgiu quando ele conheceu o (BRU), um equipamento similar, de fabricação uruguaia. No entanto, observa:

"O BRU tinha três entraves: é grande, não tem portabilidade; se utilizava de uma realidade virtual muito primária, tinha alguns estímulos em 3D, mas não era um ambiente de imersão; e o terceiro era o custo. O equipamento ficava restrito a grandes instituições, só disponível para pesquisa. Você não tinha acesso para as terapias".

Idosos

O médico enfatiza ainda que a necessidade de inovar o tratamento se ampara no crescimento da população idosa no País - a maioria dentre os pacientes de transtorno do equilíbrio. Magno exemplifica como a tecnologia do Viver pode aprimorar o atendimento nesses casos.

"Existem pacientes idosos que quando estão num ambiente de muito estímulo visual, como esses fliperamas de shoppings, têm uma sensação de desequilíbrio. Você vai poder inseri-los em ambientes como esses (por meio da projeção das imagens virtuais), mas eles vão estar na segurança de um consultório", sintetiza o médico.

Dr. Magno vislumbra que, um paciente submetido a 10 sessões de tratamento analógico, poderia ter alta com cinco ou até sete consultas baseadas no estímulo de realidade virtual.

Com a metodologia analógica, atualmente os pacientes são avaliados com bolinhas de tênis, adesivos colados na parede, dentre outros estímulos materiais.

"Com o Viver, o nosso limite, nesse caso, é a criatividade. Você poderá colocar o paciente no topo de um prédio (virtual), se ele tiver um transtorno de equilíbrio relacionado com o medo de altura, por exemplo", explica.

A tecnologia do projeto Viver é dividida em dois módulos. O primeiro, identifica Magno Peixoto, investiga como manter a postura do paciente frente a estímulos visuais e proprioceptivos (propriocepção é a capacidade de sentir o posicionamento do nosso corpo no espaço). E o segundo módulo trata-se da terapia em si.

Dentro do "arsenal terapêutico", enfatiza Magno, a reabilitação vestibular se sobressai, como uma espécie de "fisioterapia do equilíbrio". "São exercícios em que o terapeuta promove estímulos visuais, de movimento, pra fazer com que o indivíduo tenha algum déficit de equilíbrio e possa treinar essas situações. A nossa proposta é que isso seja feito através de realidade virtual", detalha o médico.

Tripé

Para diagnosticar as necessidades de um paciente com transtorno de equilíbrio, a medicina considera um "tripé". O sistema visual, por meio do qual a visão humana transmite informações acerca do ambiente e da posição relativa dos objetos ao nosso redor.

O segundo ponto é o sistema proprioceptivo, que processa informações sobre a posição do corpo para além da percepção visual; e o terceiro seria o sistema vestibular, envolvendo o labirinto e as estruturas na parte interna do ouvido, sensíveis às informações relativas ao movimento da cabeça.

Indagado se a tecnologia do Viver abarca toda essa complexidade do organismo, reduzindo a interferência do olhar dos médicos, Magno identifica que há uma complementaridade.

"A gente aprende na faculdade que a Medicina é ciência e arte. Não é puramente cartesiana. Tem um lado de subjetividade, que depende sempre da atuação do humano. Da proximidade, do toque, da interação", reflete o otorrino.

O médico ainda especifica: "no caso desse equipamento, de forma alguma ele elimina esse papel. É apenas um instrumento de avaliação e terapia. Mas você precisa do avaliador e do terapeuta. Nossa ideia é contribuir com uma ferramenta que tenha a confiabilidade e seja acessível", resume.

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