Primeiro trabalho solo do cearense Diego Lucena investe no experimentalismo

Disco "Diego Lucena e O Submerso" conta com a parceria de Vitor Colares no serviço de produção

Escrito por Antonio Laudenir , laudenir.oliveira@diariodonordeste.com.br
Legenda: Diego recorta vivências para aprimorar o duelo entre guitarra e a batida eletrônica
Foto: FOTO: ANIE BARRETO

Possuir o domínio do processo criativo e controlar os destinos da composição. Para inúmeros realizadores, é sedutor investir na liberdade de criar, gravar e lançar ao público as próprias músicas. Do chamado "mainstream" ao mercado alternativo da música, é farta a seleção de artistas acostumados a autogerir as canções. Diego Lucena se insere na lista de músicos apreciadores da solidão, da reserva. Em "Diego Lucena e O Submerso", primeiro trabalho solo, o guitarrista cearense reencontra influências pessoais e parte na aventura de desbravar novos cenários.

Filhote do "faça você mesmo", o material independente apresenta oito faixas e conta com produção assinada por Vitor Colares, figura proeminente da cena experimental fortalezense dos anos 2010. Trata de quem já atuou por palcos e estúdios ao lado de 2FUZZ, Fóssil, Daniel Groove, dronedeus e Missjane; além dos discos pessoais "Eu entendo a noite como um oceano que banha de sombras o mundo de sol" (2017) e "Saboteur" (2016). Outro apoio pontual advém da concepção gráfica do disco e do registro fotográfico de Lucena, protagonizados respectivamente por Gabi Tavares e Anie Barreto.

Rebentar

Pesquisador, professor, fotógrafo e dado a fazer filmes caseiros, Diego Lucena redescobriu a guitarra no fim de 2018. "O Submerso" é o retorno à superfície, um reencontro com a Fortaleza natal, depois de anos atuando como docente em chão estrangeiro. Representa a materialização, no formato de música, de um longo processo reflexivo. Da escolha de timbres à melhor maneira de adequar batidas e riffs. Tudo está no disco.

Foto: ANIE BARRETO

O lamento "Zehro" abre a iniciativa no modo protocolar até a chegada de "Dilacerado". Junção de cordas, compasso eletrônico e sobreposição de frases na guitarra. Para quem se agarra ao expediente de referências para um entendimento mais fluído da obra, vale apontar a reverberação de nomes como John Frusciante e Jonny Greenwood. Todavia, o som fantasmagórico pretendido por Lucena também rasga do metal ao shoegaze. Sapeca The Mars Volta e Melody's Echo Chamber na esteira dos brazucas Cartola (1908-1980), Rodrigo Amarante e Cidadão "Catatau" Instigado.

Foto: ANIE BARRETO

"Fantohxes" é esfumaçada e se ancora pela base grooveada. Remonta a uma trilha chuvosa e etérea. Em seguida, "Terra Transcende" consegue sintetizar bem a visão musical proposta por Diego Lucena em seu "O Submerso". Aqui, a orquestração do autor encontra a melhor sintonia e "Visagi" compartilha do mesmo esforço. As letras sussurradas ecoam até agressivas em certas partes. É uma descida. Escolha pelo estranhamento.

Foto: ANIE BARRETO

A instrumental "Submerso" chega sem a mesma sinuosidade das duas faixas anteriores, mas cumpre a função dentro do projeto. "Consome Consume" é fúnebre até os ossos e conclui a estreia do guitarrista de maneira comovente. Definido como "disco-meditação" pelo professor e pesquisador Jorge Adeodato, autor do texto de apresentação do álbum, "Diego Lucena e O Submerso" envereda como o primeiro mergulho por águas tão espessas. Daqui em diante, por função das escolhas sonoras, novos álbuns deverão exigir mais fôlego do guitarrista. Isso é sobreviver.

"Diego Lucena e o Submerso"
Diego Lucena
Independente
2019, 8 faixas
Disponível para streaming

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