Três mulheres são as vencedoras do Prêmio Oceanos de Literatura 2019

Cerimônia de anúncio aconteceu na manhã desta quinta-feira (5), no Itaú Cultural (SP); prêmio literário é um dos mais importantes entre os países de língua portuguesa

Escrito por Diego Barbosa , diego.barbosa@svm.com.br
Legenda: Djaimília Pereira de Almeida, Dulce Maria Cardoso e Nara Vidal tiveram obras premiadas no Oceanos - Prêmio de Literatura em Língua Portuguesa 2019
Foto: FOTO: DIVULGAÇÃO

Com um auditório apinhado de amantes da literatura – compreendendo desde visitantes a efetivos participantes da cadeia do livro – foram anunciadas, na manhã desta quinta-feira, na sede do Itaú Cultural (SP), as três obras vencedoras do Oceanos - Prêmio de Literatura em Língua Portuguesa 2019. Em primeiro lugar, ficou “Luanda, Lisboa, Paraíso”, da portuguesa Djaimília Pereira de Almeida; em segundo, “Eliete”, da também portuguesa Dulce Maria Cardoso; e, em terceiro, “Sorte”, da brasileira Nara Vidal. As escritoras eram as únicas mulheres a figurar na lista de finalistas. 

Djaimília Pereira de Almeida teve a obra vencedora publicada pela Companhia das Letras em Portugal e no Brasil. O romance narra a saga de Cartola e Aquiles, pai e filho que deixam Angola em busca de tratamento médico em Portugal nos anos 1980. Segundo a escritora Maria Esther Maciel, que comentou a obra durante mesa na cerimônia, trata-se de um romance sobre diáspora, solidão e, paradoxalmente, amizade e solidariedade.

Legenda: O livro “Luanda, Lisboa, Paraíso” foi escrito pela portuguesa Djaimília Pereira de Almeida
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“A autora se destaca pelo apurado trabalho com a linguagem, domínio da narrativa e engenhosidade na costura íntima de detalhes. Apresenta também personagens densos que podem representar essa coletividade de uma maneira contundente e delicada”, explicou Maria Esther, uma das integrantes do júri.

Por vídeo, Djaimília, tomada pela emoção, dedicou o livro ao marido, a todos que o leram e a várias pessoas vivas, como seus avós. “São várias imagens e pessoas que passam por mim neste momento, nunca imaginei a gravar esse depoimento. Muito obrigada”.

Por sua vez, o segundo colocado, “Eliete", de Dulce Maria Cardoso (publicado pela editora Tinta-da-China), é o livro que pôs Portugal a falar, pela primeira vez, sobre os retornados, o maior tabu da história recente do País. Comentada com efusão pelo crítico literário Manuel Frias Martins, a obra, de acordo com ele, “pode soar ofensiva para muitos por ter uma linguagem crua, colada ao real”, mas que se projeta enquanto um romance brilhante do ponto de vista da construção artística. “Não há nada mais contemporâneo que este romance de formação”, sublinhou Manuel.

Legenda: A história fala sobre os retornados, o maior tabu da história recente de Portugal
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A autora, também em vídeo, comentou: “É a primeira parte de um romance que será eterno, que durará enquanto minha vida durar. Espero que ele tenha uma longevidade muito maior que a minha”.

Por fim, Nara Vidal, em “Sorte”, publicado pela Editora Moinhos, traz à superfície Brasil (ou Hy-Brasil), uma ilha mítica na costa irlandesa onde o mar tem cor de chumbo. Uma ilha da fantasia, de mentira e que fundamenta sua existência numa ilusão. Nas palavras do poeta português Daniel Jonas, também jurado do prêmio, trata-se de um livro extremamente denso e sóbrio, sem margem para leveza e que, por isso, aliado à escrita inteligente e com extremo rigor, emerge como um dos destaque entre os finalistas.

Legenda: "Sorte" da brasileira da brasileira Nara Vidal ficou na terceira posição do prêmio
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Além de dedicar à mãe, que lhe proporcionou o contato com as letras, Nara Vidal também dedicou o livro “às mulheres que foram massacradas, que são mulheres do passado, do presente e, infelizmente, do futuro”.

Concorrência

Entre os autores selecionados, concorreram cinco brasileiros, quatro portugueses e um angolano. O júri – formado por nove profissionais de diferentes nacionalidades cujo idioma oficial é o português – destacou a capacidade de associar a qualidade literária às questões contemporâneas.

Na lista, figuraram sobretudo narrativas que tratam temáticas relacionadas à desterritorialização, inquietação existencial e sexualidade. As obras finalistas compreenderam nove romances e um livro de contos.

Presente pela primeira vez na cerimônia, o Cônsul Geral de Portugal em São Paulo, Paulo Jorge Nascimento, afirmou que o fato de o Prêmio Oceanos estar em sua quinta edição é prova da relevância que alcançou no mundo das letras. “A importância dele se reflete também no número de candidatos, estes não apenas oriundos de Portugal e Brasil, o que demonstra uma pulsão literária para além dos dois países”, sublinhou.

Nas mesas de debate realizadas antes do anúncio dos vencedores, os jurados da fase final leram trechos dos livros e conversaram sobre o atual momento da literatura em língua portuguesa a partir dos 10 títulos finalistas.

A crítica literária Eliane Robert Moraes, por exemplo, comentou que imergir na leitura das obras “foi uma possibilidade de atualizar a literatura a partir de um olhar específico sobre temas tão frequentes hoje nos escritores em língua portuguesa, como exílio e fuga”. Por sua vez, a escritora Maria Esther Maciel destacou que a “leitura dos livros representou um fôlego de esperança nestes tempos tão sombrios, para não dizer catastróficos, que vivemos no Brasil”.

Novidades

Esta mais uma edição do Oceanos trouxe um número recorde de concorrentes. Foram 1.147 livros de 10 países diferentes, publicados por 314 editoras. O júri inicial, com 72 membros de 5 países, elegeu os 53 livros semifinalistas; o segundo júri, formado por 9 profissionais de 3 países, selecionou os dez finalistas.

Neste ano, o valor total da premiação foi aumentado de R$ 230 mil, em 2018, para R$ 250 mil. O Oceanos passou a contemplar três livros (as edições anteriores premiavam quatro), de modo a valorizar a singularidade de cada prêmio. O livro vencedor receberá R$ 120 mil; o segundo colocado, R$ 80 mil e o terceiro, R$ 50 mil, sendo que livros de diferentes gêneros literários concorreram entre si.

O corpo curatorial do Oceanos 2019 foi composto pela linguista Adelaide Monteiro, curadora da Biblioteca Nacional de Cabo Verde, pela escritora e jornalista portuguesa Isabel Lucas; pela gestora cultural Selma Caetano e pelo crítico literário Manuel da Costa Pinto, ambos do Brasil.

O Oceanos é realizado em parceria com o Banco Itaú, com República de Portugal (por meio do Fundo de Fomento Cultural Português) e com a CPFL Energia, e conta com o apoio do Itaú Cultural, do Instituto CPFL e do Ministério da Cultura e das Indústrias Criativas de Cabo Verde. 

Confira a lista completa de obras finalistas, com o destaque às vencedoras:

- Alguns humanos, de Gustavo Pacheco – contos / Brasil, Tinta-da-China

- A tirania do amor, de Cristovão Tezza – romance / Brasil, Todavia

- Eliete, de Dulce Maria Cardoso – romance /Portugal, Tinta-da-China

- Ensina-me a voar sobre os telhados, de João Tordo – romance / Portugal, Companhia das Letras Portugal

- Luanda, Lisboa, Paraíso, de Djaimilia Pereira de Almeida – romance / Portugal, Companhia das Letras Portugal

- Meio homem metade baleia, de José Gardeazabal (pseudônimo de José Tavares) – romance / Portugal, Companhia das Letras Portugal

- O imortal, de Mauricio Lyrio – romance / Brasil, Companhia das Letras

- O preto que falava iídiche, de Nei Lopes – romance / Brasil, Record

- Sorte, de Nara Vidal – romance / Brasil, Moinhos

- Sua Excelência, de corpo presente, de Pepetela – romance / Angola, Dom Quixote/Texto Editores

*O jornalista viajou a convite do Itaú Cultural

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