Morre a artesã Francisca de Brito Carvalho, esposa do mestre Espedito Seleiro

Natural do Crato, ela faleceu às 21h30 da última quinta-feira (9), no Hospital Regional do Cariri

Escrito por Roberta Souza , roberta.souza@svm.com.r
Legenda: Dona Francisca e Seu Espedito
Foto: FOTO: ALLAN BASTOS

Foi-se uma parte do coração do mestre da cultura Espedito Seleiro. Sua esposa, Francisca de Brito Carvalho, faleceu na última quinta-feira (9), às 21h30, no Hospital Regional do Cariri. A artesã esteve hospitalizada nos últimos 15 dias. De acordo com a família, ela morreu devido à insuficiência respiratória e o laudo não declarou os motivos. Um exame inicial, porém, já havia dado negativo para Covid-19. Familiares aguardam o resultado de um segundo teste. 

Dona Francisca sofreu um Acidente Vascular Cerebral (AVC) há seis anos e, desde então, convivia com movimentos reduzidos, além de alguns problemas na garganta, no pulmão e, mais recentemente, no coração. Dos 15 dias que passou entre hospitais da região do Cariri, oito foram em leitos de UTI e apenas um em casa, o último domingo (5). 

Seu enterro aconteceu de forma breve, ainda na manhã desta sexta-feira (10), às 9h, no cemitério de Nova Olinda, seguindo os protocolos determinados pela Justiça do Ceará no período da pandemia.  

Espedito Seleiro não esteve presente. Ainda na noite de quinta (9), o artesão se despediu da esposa. "Ele tinha certeza que era a última vez que ia vê-la. Ficou muito debilitado, está chorando muito, e não aguentou ir para o cemitério", disse Irenilda Carvalho, nora do casal e esposa de Maninho Seleiro, em entrevista ao Diário do Nordeste.  

 Memórias 

 Dona Francisca casou com o mestre do couro na década de 1960 e teve nove filhos com ele. Desses, sobreviveram seis herdeiros. O casal já soma cinco netos, incluindo dois adultos, que atuam no mesmo ofício.

"Ela trabalhou todo tempo, sabia fazer só tudo, foi quem deu o pontapé junto com Espedito nos negócios da família. Enfrentou todas as dificuldades, cresceu junto com ele, que era meio danado. Ela foi a força maior de tudo", reconhece Irenilda, emocionada. 

Legenda: Seu Espedito ao lado de Dona Francisca e familiares, em Nova Olinda
Foto: FOTO: THIAGO GADELHA

Essa fortaleza de dona Francisca ficou registrada na série de reportagens do Diário do Nordeste:  “Mãos que fazem história - a vida e a obra de artesãs cearenses”,  publicada em 2009 pelas jornalistas Germana Cabral e Cristina Pioner. A série virou livro homônimo no qual Francisca ganhou uma página de destaque mais do que merecida, afinal, ela sempre foi a fonte inspiração do mestre da cultura. 

Quando Francisca conheceu Espedito, o artesão tinha acabado de retornar de São Paulo, onde passou uma temporada de dois anos trabalhando em cafezais.

"Eu nunca pensei na vida em me casar com ninguém, porque pra mim, casamento era uma coisa que não era legal. Eu tinha minhas namoradas, mas não pensava em casar não, só brincar, né, conversar e tal, bater um papo. Aí foi quando eu conheci ela, a primeira vez que eu vi ela, passou assim...Fiquei  olhando assim, e digo, eita menina bonita da peste! Aí foi que comecemos a se encontrar", lembrou Espedito em entrevista ao Diário do Nordeste por ocasião de seus 80 anos, comemorados em outubro de 2019. Um mês antes, o mestre Espedito foi contemplado pelo troféu Sereia de Ouro, em sua 47ª edição, concedido pelo Sistema Verdes Mares.

Legenda: Francisca foi entrevistada pra o livro "Mãos Que Fazem História", publicação do Diário do Nordeste

No mesmo depoimento, o artesão recordou que o pai de Francisca era muito seguro com as filhas, todas mulheres, e a mãe era uma rezadeira "dessas que o rosário é deste tamanho", disse enquanto indicava um longo cordão.  

 "A gente se encontrava mais só na Renovação. Ela tinha um medo do pai dela pra danar. Eu nunca pensei em casamento, mas essa daqui eu não dispensei não. Porque existe essas coisas que acontece na vida. Essa daqui não tem jeito. Eu falei com pai dela, ele aceitou e a gente se casou", detalhou o artesão. 

O amor entre os dois também ficou registrado nas palavras da própria Francisca, por ocasião do aniversário de 80 anos do companheiro. "Eu gosto é de tudo nele. Sou feliz, graças a Deus, graças a Deus! Eu acho bom demais, família tudo unida, tudo em casa, tudo gosta do trabalho, tudim. A nora que entrou gosta também, e assim vamos, até o dia que Deus quiser", declarou, no que pode ter sido sua última entrevista

 

Assuntos Relacionados