Fantasias de Carnaval provocam debate sobre preconceito e dividem opiniões

Parte da população reproduz posturas de intolerância de forma inconsciente, reflete socióloga

Escrito por Redação ,

A irreverência do período que inicia no Pré-Carnaval e se estende até a Quarta-feira de Cinzas anima os foliões para tirar a fantasia do guarda-roupa ou levar para a rua um meme recente. Algumas fazem sucesso, mas outras têm gerado questionamentos desde outros carnavais, como as que retrataram mulheres e grupos étnicos. 

Suely Bezerra, artivista e engajada em movimentos feministas, LBGTs e negros, pontua que as fantasias ajudam a reforçar as discriminações. "As pessoas estão sempre reproduzindo todas as formas de preconceito com a população LGBT, negra, indígenas, que são grupos completamente invisibilizados e excluídos cotidiamente. E no Carnaval, essas pessoas se acham no direito de colocar uma pena, se vestir de índio, homem se vestir de mulher. Para nós que estamos dentro desse movimento feminista, a gente sabe que isso é uma reprodução da questão das violências", afirma. 

"Uma pessoa que coloca uma peruca black power, uma pena, se traveste, só reforça essa opressão e mostra nitidamente que essas determinadas populações só são para tirar onda e servir a grande burguesia", explica Suely e completa. "São pessoas que estão dentro de um padrão normativo da sociedade e que no Carnaval, Pré-Carnaval, essas épocas, se fantasiam do oprimido". 
 
O carnavalesco e vice-presidente do Maracatu Vozes da África, Márcio Santos, avalia que qualquer adereço pode ser usado, contanto que a postura de quem usa seja permeada pelo respeito. "Nada que reforça o preconceito é legal. Mas também não pode ser tão extremista, você tem que ver o contexto. Eu gosto muito de usar cocar, por exemplo, e apesar de me reconhecer como negro, sou da região dos [índios] Pitaguarys e já fui abordado de forma agressiva por estar usando", pondera. 

"Eu não acho que devo usar e o outro não pode usar. Acho que não é bem por aí. Não pode é denegrir. Se você usa de forma respeitosa, porque uma pessoa branca brasileira não pode usar um turbante? Pode, por que não? Desde que não esteja denegrindo o negro", defende Márcio Santos.  

A Doutora em Sociologia Paula Vieira observa que uma parcela da sociedade por vezes usa fantasias sem a compreensão do caráter depreciativo que a peça pode conter. "São valores que são interiorizados pelas pessoas e que não necessariamente estão manifestando o preconceito de forma consciente. São parte da cultura popular e isso é reproduzido ao longo dos anos e gerações".

A especialista aponta que o ideal é não usar símbolos de uma cultura para uma brincadeira ou como uma forma de deboche. "Há pessoas que se fantasiam de índio e fica aquela dúvida se é uma homenagem, uma grande brincadeira, ou pode dar um tom de inferiorização da cultura, que é como os indígenas e negros têm falado". 
 

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