APCA elege "Melancolia", de Carlos Cardoso, como melhor livro de poesia de 2019

Poeta carioca apresenta o sentimento sem preconceito e com vigor poético

Escrito por Paula Dume* , Especial para o Verso
Legenda: O premiado "Melancolia" é a quarta obra assinada por Carlos Cardoso
Foto: Foto: Nana Moraes

"Melancolia", livro de poemas de Carlos Cardoso, lançado em outubro pela editora Record, chegou às livrarias com um propósito distinto: abordar o tema sem preconceito e com vigor poético. E atingiu seu intento. No volume, o sentimento é apresentado pelo poeta carioca como personagem principal, com um sentido amplo e uma imagem intangível.

Não é à toa que a obra foi eleita a melhor de 2019 na categoria poesia pelos membros da APCA (Associação Paulista de Críticos de Artes) na segunda-feira (9).

No extenso poema que dá título ao exemplar, o poeta diz brincar com plástico bolha ao embrulhar o boneco do livro e acaba envolvendo os signos linguísticos também no invólucro.

Armado com uma folha de papel e uma caneta, ele dispara sua centelha verborrágica que provoca explosões reflexivas:

“Para esse livro/ não escreverei/ o que é fácil de entender/ o que é fácil de ler/ o que é fácil de não ser/ o que realmente sou”

Nos versos de "Hoje", Cardoso estreita ainda mais sua relação com o leitor ao dizer que a melancolia está na sua alma, na perna com câimbra e nas coisas que não fez. O sentimento aparece vivo e pulsante em sete dos 39 poemas do volume.

Outro tema recorrente e humanizado é a pedra, presente no título de cinco poemas além de estar posicionada em várias estrofes da obra. O autor faz com que o elemento mineral percorra caminhos físicos e, por meio deles, veredas psicológicas são reveladas.

Apesar de descrevê-lo como rígido no poema "Pedra", o narrador não o torna inflexível. Pelo contrário, altera e expande sua estrutura ("só o que se retrai se expande,/ só o que é pedra me atrai").

Legenda: Na poética de "Melancolia", Cardoso homenageia ainda escritores como Silviano Santiago, Caio Fernando Abreu e Vinicius de Moraes
Foto: Foto: Nana Moraes

Dimensões e homenagens

O escritor insere não só a melancolia e o mineral em atmosferas independentes, mas os tempos passado, presente e futuro. Nos versos de "Passado", as horas envelhecem, o passado permanece e é nele que o autor busca o conhecimento ("O passado é fonte de riqueza/ é nele que busco o saber/ é nele que encontro o que busco").

Ele também ressalta a importância de não fugir ou calar o ontem em "Não hoje" e "Viver não é o que não significa".  

Quanto à métrica, as rimas se articulam de forma descompassada, aparecendo e desaparecendo como se fizessem uma revoada repentina em cada página. Quando o leitor pensa que não aparecerão, elas pousam de forma inesperada no desfecho das estrofes.  

Cardoso homenageia ainda os escritores Silviano Santiago, Caio Fernando Abreu e Vinicius de Moraes com os poemas "Um sopro de ar", "Assim como a neve" e “Poeminha”, respectivamente. Os versos não são apenas dedicados, mas escritos para eles. Devido ao tom confidencial, o leitor terá a impressão de ler cartas.  

O livro tem a orelha assinada por Heloisa Buarque de Hollanda e o posfácio pelo acadêmico e crítico literário Antonio Carlos Secchin. O permanente diálogo do poeta com as artes plásticas está transposto na capa, concebida pelo pintor e escultor Carlos Vergara. Os versos iniciais de “O pato de pedra”, escrito para o artista, reproduzem sua instalação.

*Paula Dume é graduada em jornalismo pela Faculdade Cásper Líbero. Traduz e edita livros desde 2011.

Melancolia
Carlos Cardoso
Record
2019, 112 páginas
R$ 32,90

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