Novo livro do cearense vencedor do Jabuti é lançado em Varjota nesta quinta-feira (6)

"Passeio pelas ruas de mim [e de outros]" é a quinta obra de Mailson Furtado

Escrito por Diego Barbosa , verso@verdesmares.com.br

As linhas em direção à outra margem poderiam ser continentes inteiros. Sob a pena do poeta, contudo, são pontes a interligar vivências. Feito sentinela, com uma lanterna acesa a descobrir vestígios de uma cidade-mapa, Mailson Furtado avança em direção a ruas, praças, estabelecimentos e pessoas tendo como norte o descobrir-se. É uma travessia que não exige esforço de compreensão, mas conta com a atenção dos leitores para mergulhar nos diminutos detalhes do porvir.

"Passeio pelas ruas de mim [e de outros]" é mais uma homenagem do autor à Varjota, cidade já inclusa na cartografia cultural do País por ser mãe daquele que trouxe o primeiro Prêmio Jabuti de Livro do Ano para o Ceará, com a obra "à cidade". O município ganha destaque hoje novamente por sediar o lançamento da nova empreitada de Mailson no Liceu Waldir Leopércio, às 19h, após o mesmo acontecer em Fortaleza na semana passada, durante a programação da Festa Literária da Associação Cearense de Escritores (FliAce).

Com mediação de Phelipe Gomes, o evento deve abrir a bagagem das travessias empreendidas e dar relevo às minúcias do quinto projeto do autor - considerado pelo próprio como o mais experimental dos livros que assinou. A ideia em gestá-lo com ênfase nas Artes Visuais (revelando um maciço investimento em fotografias, micropoemas, poemas-crônicas e páginas que funcionam como itinerário, por exemplo) vem da inquietação de mergulhar nesse universo até então desconhecido do caminhante em anos anteriores.

"Em 2016, me veio uma inquietação grande por não conhecer mais a fundo as Artes Visuais. Foi nesse período, então, que comecei a estudar técnicas, até mesmo para trazer para a poesia, o conhecimento pessoal e levar para as salas de teatro, já que é algo também necessário para a direção de espetáculos", conta ele, evocando a Cia Criando Arte, da qual é idealizador e um dos integrantes.

"Passeio", além de reunir esses vieses - que, não sem motivo, foram gatilho para ideias e motes de poemas e é chamado por Mailson de "livro-galeria" - também funciona como resultado de uma ligação entre as suas criações adormecidas desde 2013, o que explica o tom diverso que impera na publicação, atravessando questionamentos existenciais e envolvendo os varjotenses em seu cotidiano poético.

Paralelo

Em entrevista ao Verso, Mailson Furtado traça um paralelo do novo livro com a premiada obra "à cidade". Segundo ele, apesar de ser totalmente distinto do que já escreveu, o mais recente projeto bebe de influências que tem sintonia com o sair, elemento presente na maior parte de seu repertório literário. "Ele é diferente. Assim como 'à cidade', por ser um livro de um poema só, é diferente dos demais. No entanto, ele vai montando um quebra-cabeça do meu trabalho ao longo do tempo e faz uma ligação com a obra anterior porque o trilhar é muito forte", revela, afirmando que os trabalhos são reflexo também de sua adesão à poesia marginal e a escolas de teatro político, o que justifica a mescla de influências tão presente no exemplar.

Vale destacar, inclusive, que o trabalho é publicado pela Lua Azul Edições, casa cearense cujo tratamento consiste no zelo pelo que está sendo produzido por autores locais. Nesse sentido, Mailson, cuja pátria parece ser a imensidão dos logradouros, se consolida cada vez mais por aqui como um artesão de rastros, não de pistas inteiras. Ao registrar que "a tarde cai ao passar da procissão/no dia da padroeira" ou que "triste vida/a dos postes/assistir a um sem-número/de vidas sem graça", o poeta lança mão de um olhar macro sobre as coisas e assume a tarefa de resgatar o pequeno.

Talvez essa seja a principal contribuição de obras feito a que assina neste momento: joga luz sobre o menor para refletir a respeito de ideias maiores. "Não sei se de forma inconsciente, mas acho que pela questão da continuidade do viver, da pequena ação, eu, enquanto observador, valorizo demais os atravessamentos. Esse pesquisar o cotidiano, o viver, o caminhar, me traz essa cartografia citadina, esse observar constante e a busca pelo encontro".

Recepção

Se antes Varjota já desenhava um caminho de potência cultural para o escritor, agora, após a vitória no Jabuti, a cidade parece se abrir ainda mais para receber manifestações poéticas. Não à toa, ele espera que o lançamento de hoje seja um momento de cortejar o novo livro e a literatura no geral. "Estou confiante que o momento será bem bacana e espero muito que o prêmio, que é de todo mundo, possa reverberar não só nesse evento, mas no de todos os trabalhos de amigos e artistas que apareçam por cá", torce.

Para além deste projeto, Mailson ainda está participando da antologia "Cinco Inscrições da Mortalidade", igualmente lançado na FliAce, em que divide versos com outros nomes de vantajosa amplitude no cenário literário cearense, caso de Renato Pessoa, Alan Mendonça, Bruno Paulino e Dércio Braúna.

Quanto ao que já está desenvolvendo para adiante, ele afirma que está concentrando atenções em empreitadas no teatro e, mais uma vez, na poesia. Até lá, o que prevalece no espírito do poeta é mesmo o aproveitar este momento. "Agora, meu plano é simplesmente namorar o 'à cidade' e o 'Passeio'", resume.

Serviço

Lançamento do livro "Passeio pelas ruas de mim [e de outros]". Nesta quinta-feira (6), às 19h, no Liceu Leopércio (Rua Tenente Pedro Cruz, 500, Varjota). Preço do livro: R$ 25

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