Mulheres assumem cabelos brancos como sinônimo de autocuidado e autenticidade

Tendência tem aumentado o número de buscas por inspirações em redes sociais como o Pinterest

Escrito por Mylena Gadelha , mylena.gadelha@svm.com.br
Legenda: Gislene conta que, mesmo com o estranhamento, recebeu apoio dos mais próximos
Foto: Foto: José Leomar

Em todo corpo humano, as fases da vida se manifestam por meio de sinais. Da energia dos primeiros anos até o amadurecimento, tudo muda. Para as mulheres, no entanto, esse processo não é tão simples. No meio da pressão para manter o corpo ou comportamento impostos, a verdade é que, cada vez mais, tem-se buscado viver distante dos padrões sociais.

Os cabelos brancos, por exemplo, são marcas do tempo que passa para todos e que costumam ser vistos, nas mulheres, como descuido. Hoje, os fios são ressignificados e podem transparecer a liberdade de quem encontrou uma nova face para si mesma.

Uma indicação pode ser evidenciada nas buscas em redes como o Pinterest, plataforma especializada em imagens e inspiração de estilo. Por lá, de acordo com informações da própria plataforma web, divulgadas ainda no fim do ano passado, as pesquisas baseadas no termo "ficar grisalho" subiram 879%.

Legenda: Cláudia fez pesquisas com o intuito de entender o comportamento dos fios brancos
Foto: Foto: José Leomar

Mas, afinal de contas, qual seria a intenção por trás disso tudo? Segundo o site, este dado é capaz de mostrar o quão as mulheres estariam empenhadas em deixar de lado a preocupação com o envelhecimento para aderir ao "charme dos fios brancos".

Na rotina

Personagens desse tema, Gislene Macêdo e Cláudia Marques são mulheres de perfis diferentes, mas possuem algo em comum: abriram mão das colorações capilares para assumir os fios grisalhos surgidos poucos antes dos 50. Nas motivações, a vontade de abdicar do tempo em salões de beleza, cuidar melhor de si mesma e da saúde dos cabelos, além de aceitar as mudanças de um corpo único e cheio de vontades próprias.

Psicóloga, Gislene tomou a decisão ainda aos 46, quando se viu buscando uma noção estética que não condizia com os ideais do cotidiano levado por ela. "Deixei o cabelo crescer por um tempo sem reparar a tintura. Ele ficou em uma parte com mechas e a outra, em cima, com os fios grisalhos. Teve realmente um período no qual o aspecto não era bonito, mas não pensei em desistir", relata.

Em meio aos questionamentos, para ela, o medo da mudança não foi algo paralisador. Ela também acredita na mudança como uma forma de buscar a própria personalidade. "Como vou ter receio de quem sou? Creio nessa decisão para entender a forma pela qual nos aceitamos. No caso da mulher, existe uma cobrança gigantesca, partindo da sociedade, de estarmos o tempo todo dentro de uma noção estética", opina ela.

Cláudia, coordenadora de marketing, chegou aos 45 com pensamentos semelhantes, no entanto, o trabalho tornou a reflexão mais intensa. "Pensei em começar o processo de parar de pintar aos 50, mas comecei a conversar com minha chefe, pessoas próximas, e resolvi fazer antes".

Prestes a chegar à marca de cinco décadas, conta ter percebido a necessidade em coisas simples. "Estava cansando de pintar meu cabelo. Eu fazia esse procedimento quase de 15 em 15 dias. Demandava tempo, o que acabava me deixando irritada".

Apoio

Nas últimas semanas, a divulgação do namoro entre o ator Keanu Reeves, 55, e a artista plástica Alexandra Grant, 46, tomou as redes sociais e diversos sites na internet. Além do fato de Reeves não oficializar um relacionamento há cerca de 20 anos, outro detalhe virou assunto: as críticas ao cabelos grisalhos de Alexandra.

Entre os comentários, questionamentos relacionados à idade de Grant e a motivação pela qual ela não estaria mantendo "a cor".

Sob a mesma ótica, ainda no início de 2015, a duquesa de Cambridge Kate Middleton se tornou alvo de tabloides britânicos após aparecer em eventos reais com fios brancos à mostra.

Na época, grávida do segundo filho, George, a integrante da realeza também recebeu o título de descuidada pela imprensa e personalidades da mídia, um caso prático de como a imagem feminina incomoda quando foge ao comum.

O assunto, inclusive, já foi citado por escritoras como Naomi Wolf, em 'O Mito da Beleza, publicado em 1990. Em texto, ela expõe como as imagens de beleza são usadas contra as mulheres. Nesse meio, o cabelo constitui peça no jogo de controle da construção do ideal feminino.

Enquanto isso, fora do universo de famosos ou influentes, são nos dias do cotidiano onde diversas mulheres comentam o tema e trazem a discussão para contornos também difíceis.

Para Gislene, no caso, escolher abrir mão dos processos de mudança de cor nos fios foi sinônimo de ouvir opiniões dos mais próximos. "O cabeleireiro que cuidava dos meus fios estranhou. Na minha família, tive reações de pessoas definindo como desleixo. Aí, a outra reação foi depois que cortei curtinho, falaram do meu rosto em evidência. Mas, depois acabei virando alvo de admiração".

Na mesma linha, apesar dos olhares receosos no começo, Cláudia se viu encontrando apoio em amigos e familiares. "Meu marido e meus enteados me davam muita força. Minha mãe, que brigou muito comigo, gostou do resultado e agora começou a optar pelos cabelos brancos. Já criei aí uma aliada", comenta, aos risos.

Verdade própria

Acreditando no poder da autenticidade da decisão delas, nem Gislene nem Cláudia enxergam essa opção como padrão a ser seguido por todas.

"O cabelo é uma das maneiras de também sinalizar para o mundo o lugar onde estou e como me vejo. Isso tudo só aumentou a apreciação que tenho por mim, pelas mulheres que também optaram por isso e até mesmo as que não o fizeram, respeitando cada uma das particularidades", reitera a psicóloga.

No pensamento das duas, a linha é bem simples e consiste sempre em viver de acordo com o que é permitido pelo corpo e, ao mesmo tempo, se une às vontades do íntimo.