Espaço Cultural Unifor realiza exposição em homenagem a Yolanda Vidal Queiroz

A trajetória da empresária é resgatada num afetuoso e definitivo panorama íntimo em exposição que reúne as principais minúcias da carismática personalidade cearense. A abertura da mostra acontece hoje (10)

Escrito por Redação ,
Legenda: Retrato de Yolanda Vidal Queiroz por Albery Seixas da Cunha
Foto: Ares Soares

Quando a memória fala, é pela boca da alegria. Sempre foi assim no cotidiano de Yolanda Vidal Queiroz (1928-2016). Em livro publicado no ano de 2015, a matriarca de uma das famílias mais tradicionais do Ceará descreve, ao correr de suave pena, as relações que se estabeleciam no microcosmo do lar da sua infância.

"Nossa casa era uma animação. Não havia lugar para tristeza. Era um ambiente alegre, rico em cultura. Dagmar era exímia pianista, sabia florear bonito. Um primo nosso, Raimundinho Pontes, dono de uma voz grave, juntava-se à minha irmã ao piano e cantava lindamente".

Legenda: A religiosidade é um dos pilares da mostra sobre a matriarca da família Vidal Queiroz, que também ressalta aspectos da vida e a sua coleção particular de obras de arte
Foto: Helene Santos

Esse desmedido afeto - regado por entre encontros, cômodos e acontecimentos - era uma das marcas mais vigorosas de Dona Yolanda, refletida por entre tudo o que realizou. Ao mesmo tempo que mulher firme, resoluta frente aos desafios da vida, conservava o semblante terno e conciliador, tornando-se pessoa querida por quem a conhecia.

Também possuía espírito sensível, apegado à arte, qualidade responsável por manter atento olhar sobre o cotidiano de trabalhos. Alguém "tão única", conforme sublinha Lenise Queiroz Rocha, filha e presidente da Fundação Edson Queiroz. "Delicada, mas sempre surpreendente; reservada, mas nunca despercebida: essa era Yolanda, minha mãe. É preciso adentrar esse mundo como se esta distinta dama convidasse você para conhecer um infinito particularmente interessante. Yolanda Vidal Queiroz pode até ter partido, mas, na verdade, ela nunca nos deixou nem nos deixará. Afinal, suas memórias estão bem vivas", arremata Lenise.

Enfim, uma "suave guerreira", como denominou a curadora Denise Mattar no texto de apresentação da mostra. "Ela faz parte do raro grupo de pessoas que mudam o mundo. Sua vida, indissociável da história recente do Ceará, tem múltiplas facetas, pois, como mulher, nascida no fim da década de 1920, teve que lutar para vencer preconceitos, mas o fez sem quebrá-los - dobrando-os com suavidade e firmeza".

Na exposição, a ser aberta hoje, às 19h, no Espaço Cultural Unifor, será possível conferir não apenas essas linhas, mas todo um afetuoso e definitivo panorama dos percursos da importante personalidade cearense. A proposta é que o público possa imergir até o dia 1º de março de 2020, num verdadeiro relicário de memórias, conquistas e curiosidades presentes na singular estrada que a matriarca trilhou.

Detalhes

Uma espécie de trilogia de exposições está sendo completada da com a "Yolanda Vidal Queiroz - Momentos". No rastro do conceito curatorial pensado para as mostras "Coleção Airton Queiroz" e "Da Terra Brasilis à Aldeia Global", nesta também haverá um caminho partindo da cronologia familiar de Dona Yolanda até chegar à coleção particular que a matriarca detinha, de objetos pessoais e peças artísticas.

Legenda: "Mulher" (1973), de Di Cavalcanti, compõe o acervo do Modernismo pertencente a Dona Yolanda Queiroz
Foto: Ares Soares

Cinco salas poderão ser percorridas levando em conta nuances de uma vida que nunca cansou de surpreender. "O primeiro ponto que levei em consideração para estruturar a mostra foi entender a individualidade dela. Era alguém extremamente cúmplice de seu marido, Edson Queiroz (1925-1982), e uma pessoa muito alegre e atuante", situa Denise Mattar. "De igual forma, era extremamente capaz, sempre se destacando pela inteligência. Na exposição, vamos mostrar os boletins escolares dela, por exemplo, além de uma parte significativa de honrarias que recebeu".

Reconhecimentos

O vigor na condução das empresas do Grupo Edson Queiroz após falecimento do esposo, em 1982, também ganha fôlego nos ambientes. A distinta atuação foi responsável por, entre outros reconhecimentos, ser a primeira mulher agraciada com o Prêmio Personalidade do Ano, da Câmara de Comércio Brasil-Estados Unidos, na cidade de Nova York, em 2008. Parte relevante da biografia dela, embora apenas uma parte.

As outras, muitas, revelam um ser humano imensamente ligado à religiosidade e de intelecto criativo, com sede de inovação. Sobre o primeiro aspecto, destaca-se a quantidade de peças do barroco erudito e popular sob posse de Dona Yolanda. Todas poderão ser conferidas na mostra, chamando a atenção pela intensa devoção e fé ecumênica, agregadora de diversas expressões de credo, tais como aquelas observadas em culturas tailandesas, indianas e vietnamitas.

Por sua vez, quanto ao intelecto criativo, torna-se perceptível a paixão pela arte sobretudo nas instalações que realizava no interior de casa e na quantidade de obras que possuía assinadas por grandes nomes das artes plásticas nacionais, majoritariamente do Modernismo brasileiro, na primeira metade do século XX. Portinari, Di Cavalcanti, Anita Malfatti, Ismael Nery e Volpi eram alguns dos artistas preferidos.

Junto a esses componentes, vasta iconografia, composta por fotografias, peças de mobiliário, vídeos, cartões-postais, músicas e roupas, além de reconstituição de determinados ambientes da casa onde a dama vivia, aproximarão os visitantes de uma sublime essência.

Conforme a curadora, "Dona Yolanda ainda colecionava frases, que copiava com sua letra delicada e distribuía pela família. Uma delas exprime inteiramente sua forma de pensar: 'A vida é uma festa, entramos nela sem sermos convidados, e saímos dela sem sabermos - mas a festa continua'. Algumas dessas expressões estarão na mostra", garante.

Não à toa, é da opinião de Denise que os trabalhos despertarão a atenção de vários estratos de público - desde os interessados em desbravar a história cearense por meio do itinerário de Dona Yolanda, até pessoas das áreas de arquitetura, moda, artes plásticas e literatura.

Atemporal

Lenise Queiroz Rocha considera que a mostra é bem mais que uma exibição de obras, cenários e objetos. Em suma, dialoga com a atemporalidade do legado deixado pela mãe.

"É um passeio pelo céu azul-turquesa que abre suas nuvens discretas para revelar vontades, olhares, delicadezas escondidas em cada escolha para compor o que a cercava. Tudo tem seu valor, pois ela via valor em tudo, e tudo revestia de significados que transcendiam o meramente material. Cada pedaço dessa mostra traz muitas histórias".

O fato de a matriarca não apenas contemplar, mas partir para a ação e fomentar movimentos, também ganha relevo na fala de Lenise. "Ela desenvolvia, ao lado do industrial Edson Queiroz, os negócios da família. Esse recorte explica muito sobre seu desejo de criar a Universidade de Fortaleza, hoje referência no ensino superior plural no Brasil e no mundo", ressalta.

Talvez por isso o retrato dela assinado pelo pintor e artista plástico paraense Albery Seixas da Cunha, outro item da exposição, fosse tão querido. Em traços delicados, transparece graciosidade e solidez no mesmo semblante de pessoa plural, detentora de rico universo íntimo que, não satisfeito numa dimensão só, transbordou. E continua a se expandir.

Serviço
Exposição "Yolanda Vidal Queiroz - Momentos"
Abertura nesta quinta-feira (10), às 19h, no Espaço Cultural Unifor (Av. Washington Soares, 1321 - Edson Queiroz). Período: de 11 de outubro a 1º de março de 2020. Horário de funcionamento: 9h às 19h (terça a sexta-feira) e de 10h às 18h (sábado e domingo). Aberto ao público. Contato: (85) 3477.3319

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