Jovem desaparece após abordagem de PMs; Mãe afirma que filho foi morto pelos policiais

Denunciantes contaram em depoimento que presenciaram Anderson Henrique da Silva Rodrigues ter sido vítima de espancamento por parte das autoridades. O desaparecimento completa uma semana nesta terça-feira (18)

Escrito por Emanoela Campelo de Melo , emanoela.campelo@diariodonordeste.com.br
Legenda: Cristiane diz sentir que o filho está morto e pede para enterrar o corpo
Foto: FOTO: HELENE SANTOS

O desaparecimento de Anderson Henrique da Silva Rodrigues, de 20 anos, visto pela última vez no dia 11 deste mês, está prestes a completar uma semana. Para família e testemunhas que presenciaram uma ação de policiais militares responsáveis por abordar o jovem nesta mesma data, o fato de Anderson não ter sido mais visto vai além de um sumiço qualquer que aconteceu independente da vontade dele.

A versão defendida pelos parentes e vizinhos de Anderson é que ele foi morto pelos PMs participantes da abordagem feita em Horizonte, Município da Região Metropolitana de Fortaleza (RMF). “Me disseram que o Raio tinha pegado ele (sic). Fizeram uma abordagem em frente a um mercantil e começaram a bater nele ali. Depois ainda levaram meu filho até onde ele morava”.  Quando fala sobre o assunto,  Maria Cristiane da Silva Leitão, mãe de Anderson, se emociona e pede que, pelo menos, entreguem a ela o corpo do rapaz.

De acordo com testemunhas que prestaram Boletins de Ocorrência (B.Os) à Polícia Civil, no fim da manhã do dia 11 de junho de 2019, Anderson Henrique foi abordado por policiais militares. A vítima se aproximava de uma mercearia quando as autoridades chegaram. Sob a condição de não ser identificado, um homem que presenciou a ação contou ao Sistema Verdes Mares detalhes da abordagem.

“Eu vi que os policiais foram muito rudes com ele. Puxaram, bateram, deram dois tapas no rosto do rapaz, usaram spray de pimenta, chutaram, e tudo isso sem o rapaz reagir. Ele ficou parado. O Raio já chegou dizendo: encosta, vagabundo", relatou uma das testemunhas. Da mercearia, o jovem teria sido levado pelos PMs até a sua residência, no bairro Zumbi. Cristiane conta que vizinhos contaram para ela que Anderson já foi retirado da sua casa desacordado. Segundo a mãe do jovem, os vizinhos ouviram gritos de socorro.

Antecedentes

Há dois meses, Anderson Henrique da Silva Rodrigues foi solto e estava em liberdade condicional respondendo pelo crime de receptação. De acordo com a advogada Conceição Moreira, desde a soltura, ele optou por ir morar em Horizonte e não teria cometido mais nenhum crime. Na ficha criminal de Anderson também há passagens por desobediência e porte ilegal de arma de fogo.

Segundo a Polícia Militar do Ceará, Anderson Henrique foi abordado por uma composição do Comando de Policiamento de Rondas e Ações Intensivas e Ostensivas (CPRaio), em Horizonte, no dia 11, por volta das 12h. No entanto, a nota da PMCE traz um desenrolar diferente. A nota informa que durante a abordagem e consulta aos antecedentes do jovem, ali na posição de suspeito, os policiais decidiram que dada “a expressividade de procedimentos que o abordado respondia, bem como pelo fato de ele próprio ter afirmado ser integrante de organização criminosa, os policiais militares realizaram uma busca mais minuciosa no entorno onde aconteceu a abordagem e também nos locais por onde o suspeito tinha acabado de passar”.

A PMCE ressalta que nada de ilícito foi encontrado com Anderson naquele momento e, assim, ele foi liberado pela composição na Rua J, nº 304, do bairro Zumbi. O endereço citado pela Corporação é onde, segundo a advogada Anderson, fica a casa onde ele morava e foi invadida pelas autoridades. Questionada sobre que teria motivado a abordagem contra Anderson, a Polícia Militar informou que “é um procedimento parte do serviço policial e, neste caso em específico, (a abordagem) se deu em razão da suspeição sobre o abordado”. A PMCE também negou que houve invasão à residência e destacou que irá instaurar procedimento administrativo para apurar o fato.

Para Maria Cristiane da Silva, a versão da Polícia Militar é mentirosa. Pedindo por respostas e por Justiça, já com a certeza que o filho não está mais vivo, a mãe de Anderson expõe seus questionamentos: “Como é que meu filho não apareceu? Como é que a vizinhança não viu mais ele? Ninguém viu? Tem que ter alguma resposta. Todo mundo viu o que fizeram. Eu só quero enterrar meu filho. Não tem outra história, não tem outra conversa. Mataram. Entrego na mão de Deus o que fizeram com meu filho”.

Aline Sinara de Sousa França, namorada de Anderson, também não acredita que ele foi liberado com vida pelos policiais. Sinara conta que estava ao telefone com o companheiro enquanto ele ia até a mercearia. Aquele foi o último contato entre o casal. “Os vizinhos me ligaram dizendo para eu correr lá. Cheguei na casa e estava tudo quebrado, a cama quebrada e o botão do short dele lá no chão, arrancado. O celular sumiu e eu ainda soube que esses policiais voltaram lá para saber se alguém tinha prestado depoimento. Tudo isso tentando intimidar. Eu quero Justiça. Quero o corpo dele e vou até o fim”, garantiu a namorada.

Também por nota, a Controladoria Geral de Disciplina dos Órgãos de Segurança Pública e Sistema Penitenciário (CGD) informou à reportagem que foi instaurada investigação preliminar para apuração dos fatos e, caso comprovados, "podem resultar em processo administrativo disciplinar". Sobre os PMs já terem sido identificados, a CGD acrescentou que as investigações em andamento possuem caráter reservado.
 

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