Número de detentos mortos sobe 95%, em comparação com 2017

Os presos já foram separados por unidades prisionais, para que não houvesse confronto, no entanto o número de homicídios atingiu um pico neste ano

Escrito por Messias Borges , messias.borges@diariodonordeste.com.br

Enquanto o Estado vê uma leve queda nos índices de homicídios ocorridos nas ruas, neste ano, o Sistema Penitenciário registra um aumento exponencial de assassinatos. O alerta das autoridades está ligado, com a problemática. Já são 39 detentos mortos, entre janeiro e setembro de 2018. O número representa um acréscimo de 95% nas ocorrência, se comparado a igual período de 2017, quando 20 detentos foram executados.

A Secretaria da Justiça e Cidadania (Sejus) atribui o crescimento, principalmente, à chacina ocorrida dentro da Cadeia Pública de Itapajé, no dia 29 de janeiro deste ano, quando 10 internos foram assassinados a tiros, por conta da guerra entre facções criminosas. Em nota, a Pasta afirma que esse foi "um caso incomum no Sistema Prisional".

Entretanto, as mortes múltiplas, inclusive por uso de arma de fogo, voltaram a ser registradas nas unidades prisionais. Um tiroteio deixou dois mortos e nove feridos, na Cadeia Pública de Pentecoste, no último dia 7 de março. E um novo confronto entre grupos rivais terminou com a morte de três presos, a pauladas e pedradas, na Cadeia Pública de Cascavel, no último dia 15 de setembro.

Boletim

Os boletins mensais da Secretaria da Segurança Pública e Defesa Social (SSPDS) detalham os homicídios ocorridos em unidades privativas de liberdade do Estado, mas apresentam incongruências. Para a Pasta, apenas dois detentos foram mortos por arma de fogo; outros dois, por arma branca; e o restante, por "outros (meios)". Porém, a própria Polícia Civil divulgou, no local da Chacina de Itapajé, que os internos foram executados a tiros, por exemplo.

A SSPDS justifica, em nota, que o campo "tipo de arma" é "uma variável preenchida manualmente" e o relatório diário de crimes de mortes é, em geral, "produzido com base em dados não consolidados". "A arma utilizada no caso recebe a nomenclatura 'outros', quando o meio empregado é espancamento, paulada, pedrada, asfixia, envenenamento e qualquer outro tipo de meio que não seja arma de fogo ou arma branca".

Conforme informações dos boletins, o perfil da maioria das vítimas de homicídio que estavam sob custódia do Estado, em 2018, coincide com o perfil das pessoas envolvidas com o crime organizado: sexo masculino, com idade entre 18 e 37 anos. A Cadeia Pública de Tianguá é um dos exemplos mais frequentes de episódios de violência, com três mortes registradas no ano atual - sendo duas no mês de maio e uma em setembro. Outros 14 municípios cearenses registraram mortes em unidades prisionais, neste ano.

Facções

Os assassinatos ocorridos no Sistema Penitenciário têm explícita autoria das facções criminosas. A divisão entre as organizações acontece dentro das muralhas, da mesma forma que acontece nas ruas. Comando Vermelho (CV), Guardiões do Estado (GDE) e Primeiro Comando da Capital (PCC) querem mostrar que dominam aquele território, e já foram até divididos por unidades prisionais, para não entrarem em confronto e as mortes serem evitadas.

O presidente do Conselho Penitenciário do Ceará (Copen), advogado Cláudio Justa, acredita que a divisão de presídios ou alas por facções, promovida pela Sejus, não foi eficaz. "Se olharmos para números, não deu certo. O Estado não conseguiu recuperar minimamente a disciplina e não conseguiu entregar o que objetivava, a redução de homicídios", avalia.

Justa conta que a estratégia da Secretaria da Justiça se iniciou nos primeiros meses de 2017, após uma crise no Sistema Prisional nacional, que podia chegar ao Ceará. "A Sejus fez uma opção arriscada de separar as facções, por causa da infraestrutura do sistema, para impedir confrontos. No primeiro momento deu certo. Hoje, não dá mais. Nós vemos um fenômeno diferenciado no que seria a causa da morte. Temos um aumento da população carcerária muito grande, e eles estão com muita liberdade, podendo realizar justiçamento entre eles", explica o advogado.

Superlotação

Os problemas de infraestrutura e o baixo efetivo de agentes penitenciários, somados à superlotação carcerária, colaboram para o poder conquistado pelas facções dentro dos presídios, segundo o presidente do Copen. Como soluções, ele aponta a construção de presídios regionalizados, em substituição às Cadeias Públicas (medida já anunciada pelo Governo, mas ainda sem previsão para as obras); e o isolamento de lideranças de facções presas.

Um agente penitenciário, que preferiu não ser identificado, afirma que o poder das facções vai muito além do que é divulgado. "Eles vendem até um espaço para dormir dentro das celas. Que não paga dorme junto da privada. Negociam drogas, celulares, bebidas. Muito do que acontece aqui fora é planejado lá dentro. Quem nunca entrou em uma penitenciária não faz ideia do que acontece nelas".

A Sejus alegou, em nota, que está atenta aos conflitos entre internos e, quando necessário, realiza movimentações entre unidades. "Mesmo com essas ações, há casos de conflitos entre possíveis lideranças e de disputas ocorridas fora das unidades que acabam por ter reflexo dentro no sistema. A Sejus tem investido na construção de novas vagas e em programas de alternativa ao encarceramento, como o monitoramento eletrônico e o apoio às audiências de custódia", completa.A maioria das execuções acontecem em razão das brigas das facções.

Homicídio em outubro

Neste mês já foi registrado um assassinato dentro de unidade prisional do Estado. Agentes penitenciários encontraram Nicolas Chaves Sales, de 25 anos, morto, com lesões corporais, em uma vivência da Casa de Privação Provisória de Liberdade Professor José Jucá Neto (CPPL III), em Itaitinga, na Região Metropolitana de Fortaleza (RMF), no último dia 3.

Execuções na rua

O Estado registrou 3.501 homicídios fora do Sistema Penitenciário, entre janeiro e setembro deste ano. Apesar do alto número de mortes violentas, o índice apresenta uma redução de 5,2% em comparação a igual período do ano passado, quando 3.693 pessoas foram assassinadas, segundo dados da SSPDS.

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