Drogas arrastam mulheres para o comando do tráfico

Escrito por Redação ,
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Cada vez mais, jovens e mulheres adultas são presas em flagrante quando comandavam a venda de entorpecentes

O envolvimento de mulheres no tráfico doméstico de drogas vem aumentando na Capital cearense. Somente neste ano, pelo menos 40 delas foram detidas em flagrante delito em diversos bairros da Grande Fortaleza, acusadas da venda e guarda de substâncias entorpecentes.

A Reportagem acompanhou o registro das prisões de traficantes entre os dias 14 e 24 de abril último e comprovou que das 40 pessoas detidas pelas polícias Civil e Militar na Grande Fortaleza, pelos menos nove delas são do sexo feminino.

Papel

Na maioria dos casos, são mulheres jovens, com idade que varia de 18 a 30 anos, arrastadas para o mundo do tráfico de drogas pelos maridos, companheiros ou simples namorados.

Mas há também aquelas acusadas que têm mais idade. Elas também assumem o papel de traficantes, muitas vezes, para ´livrar´ os maridos, filhos e até netos, da cadeia. Conforme o levantamento feito pela Reportagem, a partir do Registro de Ocorrências da Coordenadoria Integrada de Operações de Segurança (Ciops), publicada no site da Secretaria da Segurança Pública e Defesa Social (SSPDS), entre os dias 14 e 24 de abril último, foram presas na Grande Fortaleza as seguintes mulheres: Patrícia Kelly Ayres Martins (no bairro Moura Brasil), Neusa de Sousa Evangelista (em Caucaia), Francisca Felipe dos Santos (na Varjota), Maria Diva Amaro Rodrigues (na Vila Velha), Elizabeth Batista Barbosa (no Centro), Maria Jurandy dos Santos (Maraponga), Rafaela Duarte Alves (no Passaré); além de Ana Virgínia Ferreira Rebouças e Janaína Sousa Barbosa (em Caucaia).

Diferentemente do que acontece nos tráficos transnacionais ou interestaduais, onde, geralmente, as mulheres envolvidas exercem apenas o papel de ´mulas´ ou ´aviões´; no tráfico doméstico ou ´formiguinha´, elas assumem a chefia da venda de entorpecentes, seja em pequena, média ou grande escala. Para isto, dispõem de seus ´aviões´, que se responsabilizam pela distribuição (venda) das drogas entre os usuários.

Lei do tráfico

Assim como os traficantes masculinos, as mulheres também têm ao seu lado o ´braço armado´, isto é, pessoas que se encarregam de fazer as cobranças aos devedores do tráfico.

E neste cenário, a ´lei do tráfico´ se aplica tanto para homens como para mulheres. Quem não quitar sua dívida com os traficantes, acaba ´pagando´ com a própria vida, nas chamadas execuções sumárias, motivadas por acertos de contas, crimes que, invariavelmente, produzem outros assassinatos, em sequência rápida, por vingança.

Foi o que, segundo as autoridades policiais, aconteceu, há duas semanas, na cidade de Juazeiro do Norte, na Região Sul do Estado (Cariri), onde uma mulher, identificada como Maria Suely da Silva, 24, foi executada com cerca de 30 tiros de vários calibres.

Nas investigações feitas pelo Serviço de Inteligência do 2º BPM (Juazeiro do Norte), ficou comprovado que o crime foi motivado por uma vingança.

Suely seria uma das principais traficantes com atuação em Juazeiro do Norte e cidades próximas, como o Crato e Barbalha. Contra ela pesava também a suspeita de ter mandado executar traficantes concorrentes.

Rivais

Também na semana passada, a Polícia registrou, em Fortaleza, a prisão de duas jovens que seriam traficantes concorrentes, com atuação nas favelas do Oitão Preto e Baixa Pau, localizadas nos bairros Centro e Praia de Iracema, respectivamente. Patrícia Kelly Martins e Elizabeth Batista Barbosa foram presas em flagrante após denúncias endereçadas a policiais do Comando Tático Motorizado (Cotam), do Batalhão de Polícia de Choque (BpChoque). Ambas foram detidas com drogas, dinheiro e apetrechos do tráfico de entorpecentes, como material utilizado na embalagem da droga.

Em outra ocorrência, duas mulheres, identificadas como Ana Virgínia Ferreira Rebouças e Janaína Sousa Braga foram apanhadas em flagrante com mais de uma centena de pedras de crack. Elas comandavam o tráfico de drogas no Conjunto São Miguel II, no Município de Caucaia. A Polícia acredita que, com a detenção delas, o tráfico terá uma baixa naquela faixa territorial da Região Metropolitana de Fortaleza.

Contudo, sempre que algum traficante de ´peso´ é apanhado pela Polícia, tem início uma disputa sobre quem vai sucedê-lo no comando da venda de entorpecentes na comunidade. Esta ´guerra´, quase sempre, produz um resultado sangrento.

Narcotráfico

No cenário do tráfico internacional, Fortaleza tem se destacado como um dos pontos da rota de escoamento para a Europa e África da droga produzida em países sul-americanos e que fazem fronteira com o Brasil, como a Bolívia e Colômbia.

Em 2010, a Superintendência da Polícia Federal, através de sua Delegacia de Repressão aos Entorpecentes (DRE), e da vigilância diuturna no Aeroporto Internacional Pinto Martins, conseguiu desarticular várias quadrilhas internacionais.

Nada menos, que 56 pessoas foram presas pela PF, e destas 27 são mulheres que acabaram sendo condenadas pela Justiça Federal ou ainda aguardam nos presídios o julgamento.

Há duas semanas, um fato, porém, chamou a atenção das autoridades. Duas bolivianas, que haviam sido presas pela PF, em fevereiro de 2008, quando tentavam embarcar para a Europa com um carregamento de cocaína, apareceram mortas no Município de Pacatuba.

Misterioso

O duplo assassinato que vitimou as irmãs bolivianas Maria Liliane e Lilian Fabiano Delgadillo Hurtado, ainda é um mistério para as autoridades cearenses, mas as primeiras pistas indicam que o crime teve relação direta com o tráfico.

PRESA EM CAUCAIA
Técnica em Enfermagem vendia crack

Ser técnica em Enfermagem e mãe de uma criança com apenas um ano e meio não foram razões suficientes para livrar Maria Cleoneide Medeiros dos Santos, 30, de entrar para a vida do crime. O marido, Ronnie Von da Silva Cruz, que era considerado um dos maiores traficantes de drogas - especialmente crack e cocaína - no Conjunto São Miguel, em Caucaia (Região Metropolitana de Fortaleza), foi assassinado no dia 4 de fevereiro deste ano.

A partir da morte do marido, Cleoneide assumiu o comando do tráfico. "Foi assim mesmo, eu fiquei no lugar dele", confessa, em entrevista exclusiva à Reportagem na semana passada. A técnica em Enfermagem foi presa em flagrante, na última segunda-feira (25), no momento em que fazia a venda de drogas a um viciado.

Morando sozinha com o filho pequeno, Cleoneide era apontada por moradores do bairro como uma das maiores traficantes da região. Com ela, policiais do Batalhão de Policiamento Comunitário (Ronda do Quarteirão) apreenderam 123 pedras de crack pequenas e outra maior pesando 50 gramas; 35 ´trouxinhas´ de cocaína, uma balança de precisão e R$1.394,90 em dinheiro trocado, inclusive, muitas moedas, além de material para embalagem de drogas.

No 18º DP (Jurema), onde foi autuada em flagrante, a mulher demonstrou arrependimento apenas quando falou no filho. "Não sou daqui, minha família é toda de São José de Freitas, no Piauí. Viemos para Fortaleza há sete anos e quando meu marido foi assassinado ficamos somente eu e meu filho. Agora, fui presa e nem sei com quem está o menino (o filho)".

Quando questionada sobre o motivo de não exercer a sua profissão na área de Enfermagem, Cleoneide desconversou. "Já disse que estava mesmo fazendo isso (vendendo drogas) e pronto. Vocês já estão perguntando demais. A pergunta, agora, vai ficar sem resposta".

Cleoneide foi autuada em flagrante pelo delegado Wilton Freitas por tráfico de drogas.

PREOCUPAÇÃO
"Elas agora estão na linha de frente"

Das 199 pessoas presas sob a acusação de tráfico de drogas, no ano passado, pela Delegacia de Narcóticos (Denarc) da Polícia Civil do Ceará, 41 eram mulheres. Neste ano, 41 prisões já aconteceram. Nove dos presos foram mulheres.

A alta representatividade feminina no submundo do tráfico tem preocupado a Polícia do Ceará. "Temos observado uma participação muito maior das mulheres na ´linha de frente´ do tráfico, inclusive como distribuidoras, traficantes de médio porte", destaca o delegado Francisco Jairo Façanha Pequeno, diretor do Departamento de Polícia Especializada (DPE).

Para um combate mais efetivo ao tráfico chamado ´doméstico´ - de menor proporção, dentro dos bairros -, a Denarc está sendo reestruturada. "Formamos uma nova equipe de policiais, estamos adquirindo mais viaturas. Queremos redimensionar a delegacia", afirma Jairo.

Segundo ele, a criação da Divisão de Combate ao Tráfico, prevista para breve, também ajudará no combate ao comércio de drogas no Estado. "Além disso, estamos trabalhando sempre em conjunto com a Inteligência, trocando informações, investigando denúncias. Os resultados têm aparecido em forma de prisões e grandes apreensões", afirma.

Para Jairo, o ataque da Polícia ao tráfico de drogas ajuda diretamente na redução do número de homicídios. "Atualmente, temos uma realidade em que grande parte dos assassinatos ocorridos na Capital estão ligados ao tráfico de entorpecentes", ressalta.

FERNANDO RIBEIRO/NATHÁLIA LOBO
EDITOR DE POLÍCIA/SUBEDITORA



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