CE tem o maior número de presos estrangeiros do Nordeste

Conforme a Secretaria da Justiça e Cidadania (Sejus), há 28 estrangeiros detidos nos presídios do Estado. Quinze deles têm nacionalidade de países da América do Sul e 42% respondem pelo crime de tráfico de drogas

Escrito por Emanoela Campelo de Melo , emanoela.campelo@diariodonordeste.com.br

Prisioneiros e "reféns" de condições jamais vistas. Habitantes de solo estrangeiro vetados do direito de se comunicar com o que há e com quem está lá fora. Entre grades e com a obrigação de aprender a conviver com diferentes culturas, se submetendo a ordens que, muitas vezes, se tornam incompreensíveis devido à língua falada. No Ceará, há cerca de 30 pessoas vivenciando estas rotinas.

O Cadastro Nacional de Presos do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) apontou que o Ceará é o Estado do Nordeste com maior número de presos estrangeiros. De acordo com dados do Conselho, de agosto deste ano, são 31 encarcerados em presídios cearenses de outras nacionalidades. Nesta semana, a Secretaria da Justiça e Cidadania (Sejus) somou 28 estrangeiros detidos no Sistema do Ceará.

Mas, qual o motivo para o Estado ter o dobro de estrangeiros presos do que a Bahia, em segunda colocação no ranking por região, do CNJ, e 300% a mais do que localidades como Sergipe, Maranhão e Alagoas? Segundo o defensor público federal Alex Feitosa de Oliveira, a posição geográfica de Fortaleza atrai muitos criminosos envolvidos com tráfico internacional de entorpecentes.

"Há duas semanas, foram presos um tailandês e um espanhol, no Aeroporto de Fortaleza, em posse de drogas. O maior número destes detidos realmente responde por tráfico. Creio que, por Fortaleza ser uma cidade polo de conexões de voo, por essa rota do tráfico e pela proximidade com a África, tem esse maior número", ponderou o defensor público.

De acordo com a Sejus, dos 28 que estão no Ceará, 42% respondem por tráfico de drogas. Do total, 15 internos são oriundos de países da América do Sul. Dezessete presos são provisórios, ou seja, estão mantidos em cárcere sem nunca terem sido julgados.

Um dos presos vindo de outro país da América do Sul é colombiano. Encarcerado no Centro de Execução Penal e Integração Social Vasco Damasceno Weyne (Cepis), em Itaitinga, Região Metropolitana de Fortaleza, sob a condição de não ser identificado, o homem, de 64 anos de idade, contou sua trajetória até a prisão.

"Cheguei há um ano. Fui pego no Aeroporto de Fortaleza pela Polícia Federal. Não estava vindo para o Brasil, saí da Colômbia e ia para a Europa, Portugal. Eu estava com dois quilos de cocaína. Nunca trabalhei com drogas, vendia roupas. Também temos facção na Colômbia. Eu fui obrigado e ameaçado para levar a droga. Lá isso é muito normal", disse o colombiano.

O preso explica que na Colômbia é comum ameaças de morte para transportar drogas até outro País. O comerciante destacou que, antes do episódio, nunca tinha imaginado como seria uma prisão. Hoje, sente falta da família e se beneficia de familiares de outros detentos para enviar e receber notícias dos parentes.

"Foi a primeira vez que pisei no Ceará. Nunca tinha imaginado como era uma prisão. Mas, prisão é prisão. Esta aqui eu vejo ser tranquila, tem paz aqui, não tem violência, tem boa disciplina. Minha família está na Colômbia. Eles são muito leigos e é muito longe. Penso muito na minha família, mas não converso com eles. Às vezes, quando tem visita dos outros, eles mandam notícias para minha família. Fazem esse favor e me ajudam", afirmou.

Condenado a cinco anos de prisão por tráfico internacional de drogas e em busca de remissão de pena por meio da participação em projetos da Sejus, o estrangeiro fala em retornar ao país de origem assim que puder. Sobre possível arrependimento pelo crime, o colombiano afirmou que já não pensa assim. "O que foi, foi. Para que amargar uma vida pensando em coisas que já passaram? Eu penso assim".

Tratamento

O defensor público Alex Feitosa informou desconhecer qualquer tipo de tratamento diferenciado dado aos presos estrangeiros. Para ele, essa indiferença é um problema, já que muitos não têm vínculo familiar no Brasil e, certas vezes, não possuem documentação.

"A maioria é jovem e apenas transportadores, conhecidos como mulas do tráfico internacional. Resolução do CNJ prevê que essas prisões sejam comunicadas ao Consulado. Também fazemos essa ponte. Muitas vezes, o Consulado ajuda a buscar métodos de defesa. Outro problema é a alimentação, que eles não têm quem ajude".

Uma das garantias fornecidas com auxílio da Defensoria Pública da União é presença de intérprete em todas as audiências. "No processo judicial já pedimos a nomeação desse intérprete. Quando não vai, nem audiência tem. Já na prisão, desconheço totalmente que tenha. Percebo que se um preso nacional em si já tem restrição de liberdade, a do estrangeiro é ainda maior devido ao choque e falta de contato familiar", acrescentou Alex Feitosa.

A titular da Sejus, Socorro França, destacou que, para resguardar a integridade destes presos, é dada a mesma atenção do que a ofertada aos outros 29 mil detentos no Estado. De acordo com a Secretaria, só existe separação em cela se o pedido for feito pela Justiça.

"Colocamos esses presos da mesma forma que os demais. Não existe separação, exceto quando a Justiça nos pede, mas até hoje nunca recebemos nada de regime diferenciado. Esses presos não vão para a penitenciária de segurança máxima estadual. Se o juiz disser que esse preso precisa ficar separado, temos como fazê-lo. Aqui existe um argentino que trabalha conosco na Sejus", finalizou a titular da Sejuz Socorro França.

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