Cadeia pública insegura provoca rotina de fugas

Escrito por Redação ,
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Casarão de 119 anos abriga também a Câmara Municipal. População vive amedrontada com os bandidos à solta

´Aqui só não foge quem não quer.” A declaração é de um detento que está preso, cumprindo pena, na cadeia pública da cidade de Santa Quitéria (a 222Km de Fortaleza). O depoimento do presidiário é real e mostra a insegurança das cidades do Interior cearense visitadas pela reportagem do Diário do Nordeste há duas semanas. As fugas ali tornaram-se tão comuns que acontecem até mesmo durante o banho-de-sol, diante dos poucos policiais militares responsáveis pela segurança do Município.

Santa Quitéria, que possui cerca de 44 mil habitantes, é mais uma cidade do Interior cearense que sofre com o abandono da segurança pública. A delegacia da Polícia Civil tem a missão de atender ainda outras duas cidades próximas: Catunda e Hidrolândia, que contam apenas com unidades policiais. Porém, o quadro funcional da delegacia resume-se a três servidores: um delegado, um escrivão e um inspetor.

Serrinha

Comportando, atualmente, cerca de 28 presidiários, a cadeia de Santa Quitéria não está superlotada, ao contrário do que ocorre na maioria das unidades prisionais do Ceará, mas as condições de recolhimento dos internos e, principalmente, a segurança, são precárias. A alimentação dos detentos é feita fora dali. Parte da comida vem direto da casa do próprio prefeito.

Abrigada num casarão construído em 1889, portanto, há 119 anos, a cadeia é tão frágil em termos de segurança que, da calçada, qualquer pessoa pode conversar com os presos e, se quiser, entregar-lhe armas ou drogas. Um único agente prisional trabalha ali, mas também sofre com o desconforto e a insegurança. Para completar, no pavimento superior funciona a Câmara Municipal de Santa Quitéria. O movimento de público é intenso nas sessões, deixando as pessoas próximas dos presidiários.

Um alojamento improvisado, ao lado da cadeia, é o lugar onde o agente prisional passa todo o plantão. Ele dorme em um colchonete colocado no chão. As fugas geralmente, acontecem sem qualquer dificuldade, pois o banho-de-sol também é feito de forma improvisada. Os detentos são levados para o meio da rua e os PMs ficam à distância. Num rápido descuido dos militares, os presos escapam. Quando o policiamento está empregado neste serviço, o restante do Município fica sem qualquer aparato de segurança, entregue à própria sorte.

DIFICULDADE
Apenas um delegado e dois policiais civis

“Aqui, trabalhamos no limite. Não tem sequer um policial para levar uma intimação. É uma situação vexatória. Estamos o tempo inteiro sendo cobrados pelo juiz e pelo promotor, mas não temos condições de atendê-los.”

A declaração é do delegado Josias Miranda, que, há dois anos e meio, está à frente da delegacia municipal de Polícia Civil de Santa Quitéria.

Ele explica que na delegacia só há três servidores: ele próprio, um escrivão e um inspetor. “A gente só funciona graças a ajuda da população. Peço ajuda às pessoas do povo até para levar uma intimação a alguém que precisa ser ouvido num inquérito, por exemplo.”

Comunicou

Josias diz ainda que a delegacia não dispõe das condições necessárias para atender a população como deveria. “Não temos aparelho de fax nem material de expediente. Todas as cidades têm promotores e juizes de Direito e eles nos cobram a conclusão dos inquéritos.”

O delegado explica que já comunicou a situação em que se encontra a unidade a diversas autoridades. “Já comuniquei o fato ao DPI (Departamento de Polícia do Interior), à Secretaria da Segurança Pública e Defesa Social e ao próprio governo do Estado, mas, até agora não recebi nenhuma resposta”, disse Josias Miranda.

Em Santa Quitéria e cidades mais próximas, segundo o delegado, a maior incidência criminal é de assaltos. São roubos que acontecem dentro da cidade e também na zona rural. Em caso de assassinatos comuns e latrocínios (roubo seguido de morte), os corpos são enviados ao IML de Sobral.

Josias diz que, apesar de esperar pelos laudos durante semanas, agora enfrenta mais uma dificuldade. Segundo ele, a direção do IML de Sobral decidiu proibir a entrega dos laudos a policiais ou delegados municipais. Como Santa Quitéria é uma unidade subordinada à Regional de Canindé, cabe ao titular desta última apanhar os laudos em Sobral e entregá-los aos delegados municipais daquela região.

O delegado explica ainda que vem sendo cobrado pela Justiça sobre a conclusão dos inquéritos. “Não há como cumprir os prazos. Estamos colocados em maus lençóis, com risco de sermos denunciados à Corregedoria (dos Órgãos da Segurança Pública), mas estamos cumprindo nossa tarefa mesmo com todas as dificuldades.”

Em seguida, Josias confessa que mora no próprio prédio da delegacia, para não abandoná-lo. Quando a reportagem esteve em Santa Quitéria, a delegacia estava funcionando apenas com o próprio delegado e um inspetor na permanência.
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