Braço do PCC no CE tramou retaliação à transferência de 'Marcola'

Interceptações autorizadas pela Justiça, em uma investigação do Ministério Público, mostraram as intenções criminosas de membros da facção, revoltados com a transferência do número 1 para um presídio federal

Escrito por Messias Borges , messias.borges@diariodonordeste.com.br
Legenda: O MPCE deflagrou a Operação Jericó, em 15 de agosto deste ano, para combater o PCC no Estado
Foto: FOTO: DIVULGAÇÃO

Marcos Willians Herbas Camacho, o 'Marcola', apontado como o líder máximo da organização criminosa Primeiro Comando da Capital (PCC), suscita admiração e respeito de milhares de criminosos no Brasil. A transferência do número 1 da facção para um presídio federal, em fevereiro deste ano, fez com que faccionados de vários estados do País, inclusive do Ceará, planejassem ações criminosas em retaliação à medida.

O Sistema Verdes Mares obteve acesso a informações da Operação Jericó, deflagrada pelo Ministério Público do Ceará (MPCE), no dia 15 de agosto último, para combater a atuação do PCC no Estado. Interceptações telefônicas autorizadas pela Justiça mostraram que os investigados conversaram sobre a transferência de 'Marcola' e a possibilidade de um "salve" da facção para que fossem realizadas ações para "parar o Brasil".

Um suspeito conta que a facção pediu a "sintonia" de todos os membros no plano criminoso, que é necessário realizar um cadastro, e acrescenta que a organização visa a integridade dos "irmãos" (faccionados). A partir dessas informações e de outras tratativas criminosas, o Grupo de Atuação Especial de Combate às Organizações Criminosas (Gaeco) do MPCE solicitou a prisão preventiva de 18 acusados e a Vara de Delitos de Organizações Criminosas do Ceará concedeu os mandados.

Entre os alvos da Operação estavam lideranças da facção no Ceará: Fábio Eugênio Lima Rodrigues, conhecido como 'Planalto' (o Geral do Estado da Externa da estrutura hierárquica, responsável pelas ações nas ruas); Francisco Zilvan Nunes da Silva, o 'Sem Coração' (Geral das Rifas no Setor das Lojinhas, responsável por arrecadar dinheiro para atender quem está preso e suas famílias); Francisco Yaggus Annemberg de Oliveira, o 'Cavaleiro' (Geral da Rua, encarregado das ações da facção fora dos presídios); David Gomes da Costa, o 'Aquires' (também Geral do Estado da Externa); Luan Trajano Rodrigues, o '357' (Geral do Interior, liderança do Interior); Rodrigo Lima de Sousa, o 'Borracha' ou 'Menor Bolado' (Geral das Comarcas); Guilherme Erick Sales dos Santos, o 'Ceguinho' (Disciplina); e Antônio Carlito Rodrigues Paulino, o 'Senhor das Armas' (também Geral do Interior).

Os outros mandados de prisão se destinaram a membros do PCC que atuam na "linha de frente" das ações criminosas, segundo a investigação: Geane Cleia Pereira Rodrigues, conhecida como 'Senhora Aquires'; João Paulo Pereira Costa, o 'Jp' ; Antônio Magela Melo dos Santos, o 'Foguinho'; Francisco das Chagas Ribeiro dos Santos, o 'Veticano'; Antônio Zaquiel Luso, o 'Letra K'; Valney Morais de Souza, o 'Gaspar'; Maria Elisângela Gonçalves de Souza, a 'Branca'; Taiz Alves de Lima; João Silva Rodrigues; e Sebastião Camelo Leitão, o 'Cabatão'. Os documentos obtidos pela reportagem não explicam o que significa cada função.

A quadrilha estaria envolvida com os crimes de tráfico de drogas, associação para o tráfico, comércio de armas de fogo, homicídios e ataques a agentes e prédios públicos, na Capital, na Região Metropolitana de Fortaleza (RMF) e no Interior do Estado.

Em outro áudio interceptado pelos investigadores, um homem garante que "a cada 3 CV's mortos (em referência aos rivais do Comando Vermelho), o Comando dá um 38 (revólver calibre 38)". As duas facções, além dos Guardiões do Estado (GDE), disputam territórios em todo o Estado pelo domínio do tráfico de drogas.

Atuação

A maioria dos investigados na Operação Jericó já tinha passagens pela Polícia. 'Planalto', junto de um amigo, já tinha sido capturado pela Polícia Federal (PF) e pela Força Nacional, por tráfico de drogas, em 26 de janeiro deste ano. A abordagem aconteceu no Aeroporto Internacional de Fortaleza, quando a dupla desembarcou de São Paulo - berço do PCC - com 40 kg de maconha divididos em duas malas.

Conforme o inquérito da PF, no interrogatório, 'Planalto' confirmou que era integrante do PCC e que estava na posição de Geral do Estado, após ser Soldado, Geral do Interior e Geral da Rua. O preso ainda revelou que teve que sair de sua residência, no bairro Pici, porque o CV começou a dominar o tráfico de drogas na região.

'Ceguinho' também já tinha sido detido pelo mesmo crime, no Bom Jardim, em uma investigação do 12º DP (Conjunto Ceará), da Polícia Civil, em fevereiro deste ano. Com o suspeito e um comparsa, os policiais apreenderam crack, cocaína e maconha. A dupla seria responsável por vender entorpecentes para outros membros do PCC, na região.

Já 'Veticano' foi preso pela Delegacia de Roubos e Furtos (DRF), no Município de Independência, em outubro de 2017, na posse de um rifle. O aprofundamento das investigações apontou que ele era um membro do PCC especializado em furtos a banco e teria participado de ataques a instituições financeiras em Pedra Branca e Hidrolândia, naquele mesmo ano, conforme a denúncia do MPCE.

'Cavaleiro' foi o último integrante da quadrilha capturado. Foragido desde a deflagração da operação do Ministério Público, ele foi localizado pela PF e pela Força Nacional no Município de Pindoretama, no último dia 23 de agosto. Além do cumprimento do mandado de prisão preventiva, o suposto líder da facção criminosa paulista foi preso em flagrante por posse ilegal de arma de fogo.

Transferência

'Marcola' estava na Penitenciária 2 de Presidente Venceslau, próximo de outros integrantes da cúpula do PCC, quando foi transferido para a Penitenciária Federal de Porto Velho, em Rondônia, em 13 de fevereiro deste ano, para cumprir a pena em Regime Disciplinar Diferenciado (RDD), isolado de outros internos. Dois meses depois, foi transferido para a Penitenciária Federal de Brasília, no Distrito Federal.

O número 1 da facção criminosa paulista - que tem braços em todo o País e até no exterior - cumpre pena de 330 anos de prisão. A transferência dele e de mais 21 membros da facção para presídios federais foi motivada pela descoberta de planos de fuga para os chefes do PCC e de matar o promotor de Justiça Lincoln Gakiya, que atua no combate à organização criminosa em São Paulo.

No Ceará, 'Marcola' responde a um processo por um roubo - ocorrido em 2000 - que ainda não foi julgado. Cerca de R$ 1,4 milhão foi levado da Nordeste Segurança de Valores (NSV), em Caucaia. Próximo do crime prescrever, a ação penal foi transferida da 3ª Vara Criminal de Caucaia para a Vara de Delitos de Organizações Criminosas do Estado do Ceará - a mesma que determinou a prisão dos outros membros do PCC, suspeitos de tramarem ações criminosas em represália à transferência de 'Marcola'.

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