Assistência psicológica para policiais sofre com precarização

A pressão em ser policial em um dos estados mais violentos do País faz com que muitos necessitem de atendimento psicológico individualizado. Conforme a SSPDS, há cinco psicólogos disponíveis para toda a corporação

Escrito por Emanoela Campelo de Melo , emanoela.campelo@diariodonordeste.com.br

Risco de morte devido à função, informações e fotos de locais de crimes 24h nas redes sociais, andar armado mesmo de folga e ser o ponto final de uma cadeia de pressão para prender suspeitos e solucionar crimes. A rotina dos policiais civis e militares inclui tensões que podem influenciar diretamente o desenvolvimento de transtornos mentais. Na contramão do aumento das Corporações, os atendimentos psicológicos são precários. 

“O número de homicídios na minha cidade subiu. Como investigador, subiram diretamente minhas obrigações. Não conseguia solucionar todos os casos e passei a ter a sensação de que eu era um inútil. Comecei a sofrer pressão do delegado e não conseguia mais nem dormir. De repente, estava pesando 144Kg”, disse um escrivão de Polícia Civil. 

Quando se fala na assistência psicológica oferecida pelo Governo aos policiais, a posição das Corporações é de que há uma insuficiência nos atendimentos. De acordo com a Secretaria da Segurança Pública e Defesa Social (SSPDS), a Assessoria Biopsicossocial, inaugurada em junho de 2017, tem cinco psicólogos e duas assistentes sociais.

A equipe, complementada por estagiários, é responsável por atender milhares de pessoas. São cerca de 19 mil servidores que compõem a Polícia Militar do Ceará (PMCE) e 3.700 da Polícia Civil do Estado do Ceará. Se todos eles precisassem do acompanhamento, seria uma média de 4.600 policiais para cada psicólogo disponibilizado.

Reivindicação 

A Associação das Praças Militares do Estado do Ceará reivindica aumento no número de psicólogos. Na Polícia Civil, de acordo com o escrivão entrevistado, a situação também não é satisfatória. O profissional detalhou, sob a condição de não ser identificado, que não recebeu nenhum tipo de ajuda vinda oficialmente do Estado, durante as crises.

“A polícia me virou as costas. Ninguém te apoia lá dentro. São pessoas indiferentes. Eu faço tratamento uma vez por semana. Pedi que me lotassem onde eram minhas consultas, mas isso não aconteceu. Não tive nenhum tipo de apoio da SSPDS. Pedi de joelhos que me transferissem de departamento, quando comecei a ser perseguido pelo delegado, mas eles viraram as costas”, disse o policial.

Segundo o entrevistado, a dificuldade em encontrar o auxílio adequado influenciou para que ele cogitasse até mesmo o suicídio. 

“Pensei na morte algumas vezes. Consegui ser acompanhado em um Centro de Atenção Psicossocial (Caps). Com ajuda dos profissionais de lá e da minha família, consegui começar a lutar. Estou afastado há mais de 200 dias. Nesse meio tempo tentei voltar, recomeçar, porque gosto muito do meu trabalho, mas sei que a recuperação é lenta”.

Assédio 

A Secretaria da Segurança informou que os principais casos atendidos pelo setor são transtornos depressivos, de ansiedade e de adaptação; abuso de substâncias psicoativas; comportamentos suicidas; e casos que envolvem detenção, deserção e procedimentos administrativos. Há ainda os atendimentos aos agentes vítimas de assédios moral e sexual.

O presidente do Sindicato dos Policiais Civis de Carreira do Ceará (Sinpol), Francisco Lucas de Oliveira, afirma que o assédio moral é responsável por uma parte significativa dos afastamentos. “Conversei com uma policial que está grávida e sofre assédio moral. O número de policiais que precisam de atendimento tem aumentado. Alguns sofrem até perseguição política”, disse. 

Lucas Oliveira destacou que uma das exigências feitas por parte das entidades é que os policiais com transtornos diagnosticados tenham suspensão do porte de arma, como forma de cautela e proteção para o servidor e para terceiros. Conforme o representante do Sindicato, atualmente, o recolhimento está sendo eficaz. “Quando o profissional retorna ao serviço, ele recebe sua mesma arma”.

Demandas

De acordo com a SSPDS, os atendimentos por parte da Polícia Civil são complementados pelas atividades desenvolvidas pelo Departamento de Assistência Médica e Psicossocial (Damps), que atua com a participação de uma equipe multidisciplinar. Os atendimentos incluem demandas recorrentes de acidentes, incidentes, doenças crônicas e doenças adquiridas.

Sobre a Polícia Militar, a Pasta informou que as buscas pelos atendimentos acontecem vindas de diversos Batalhões, sem haver um público que se destaque. Para 2019, está prevista a contratação de outros profissionais da saúde, ainda no primeiro semestre, com objetivo de permitir a ampliação de outras demandas especializadas, conforme a Pasta. 

A reportagem também pediu o número de policiais afastados para tratamentos psicológicos e entrevista com uma fonte oficial da SSPDS, mas não obteve retorno.

"O número de policiais que precisam de atendimento tem aumentado"

Lucas Oliveira

Presidente do Sinpol/CE

200
dias afastados das suas funções. O policial civil entrevistado contou que está afastado há mais de 200 dias, após desenvolver um transtorno psicológico

24 mil
policiais civis e militares atuam no Estado. Cerca de 19 mil PMs e 4.600 policiais civis atuam no Estado do Ceará. O atendimento disponibilizado pela Secretaria da Segurança Pública e Defesa Social contempla o contingente completo

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