Advogados relatam dificuldade de contato com o Poder Judiciário

Justiça Estadual funciona por teleatendimento, para evitar o contágio do novo coronavírus. Defensores veem andamento processual prejudicado. TJCE garante que os problemas encontrados serão solucionados

Escrito por Messias Borges , messias.borges@svm.com.br
Legenda: A decisão foi dada pela 1ª Vara do Júri da Comarca de Fortaleza, na qual os sete jurados consideraram procedentes as acusações apresentadas
Foto: José Leomar

Magistrados, servidores e outros funcionários do Poder Judiciário estão em regime de Plantão Extraordinário, por determinação do Tribunal de Justiça do Ceará (TJCE), para evitar o contágio do novo coronavírus (Covid-19). Apesar de reconhecerem a importância da medida, diversos advogados reclamam que o teletrabalho não está sendo eficiente, pois encontram dificuldades para entrar em contato com as unidades da Justiça, o que tem emperrado o andamento dos processos.

A portaria que regulamentou o Plantão Extraordinário, datada do último sábado (21), entre outras medidas, suspendeu os prazos processuais, até o dia 30 de abril deste ano; e o atendimento presencial de partes, advogados e outros interessados. Entretanto, garantiu que a distribuição processual eletrônica ocorrerá regularmente; e que o teletrabalho será realizado de segunda a sexta-feira, em expediente regular, e nos finais de semana, em escala de rodízio.

O advogado Márcio Araújo conta que foi expedido, pela Comarca de Caucaia, um alvará de soltura para um cliente preso por suspeita de roubo e remetido ao Fórum Clóvis Beviláqua, em Fortaleza, no dia 13 deste mês. Passados mais de dez dias, o defensor não consegue respostas do Judiciário para saber por que a ordem ainda não foi cumprida. "Eu não sei onde está o entrave, mas até agora o alvará não chegou no presídio. A gente não tem atendimento nenhum", reclama.

Araújo também está preocupado com um caso que se arrasta há mais de um mês e que, agora, ficou ainda mais difícil a comunicação com os representantes da Justiça. Segundo ele, um desembargador do TJCE reconheceu uma apelação de que um cliente não cometeu um crime de tráfico de drogas, e sim uso de entorpecentes, e mandou que a Primeira Instância expedisse o alvará de soltura para o mesmo, que está detido em um presídio de Itaitinga.

"Só que esse processo não desce para o juiz. Mais de um mês com esse problema. Quando estava aberto o Tribunal, eu fui lá e me disseram que estava no expediente. Agora fechou o Fórum, o Tribunal, eu não tenho mais acesso", lamenta. Questionado por quais meios procurou o contato, ele afirma que "ligações ninguém consegue, Telejustiça não atende, ocupado direto, nas Varas também não atendem, e-mail não obtemos respostas. Está complicado".

Já o advogado Oséas Rodrigues conta que entrou, na 2ª Vara de Fortaleza, na última segunda-feira (23), com um pedido de urgência de progressão para prisão domiciliar com monitoramento eletrônico para uma mulher que está no Instituto Penal Feminino (IPF) com o filho de menos de um ano, baseado no risco deles adquirirem a Covid-19 dentro do cárcere. Devido a urgência, ele tenta contato com a Unidade desde que ingressou com o pedido e diz estar preocupado se a situação perdurar. "Fica difícil o exercício da advocacia dessa maneira", pontua.

Requerimento

O advogado Leandro Vasques não conseguiu contato com a Comarca de Caridade entre a segunda-feira (23) e o dia de ontem, para tratar sobre uma decisão do Superior Tribunal de Justiça (STJ) para soltar um homem preso por homicídio. O defensor destaca que a portaria do TJCE determina que "cada unidade judiciária deverá manter canal de atendimento remoto, a ser amplamente divulgado pelo tribunal", o que, segundo ele, não está acontecendo com todas as unidades.

"Tenho plena convicção de que a ampla maioria dos magistrados está comprometida e certamente se dedicando, de maneira abnegada, a prestar a melhor ação judicial nesse momento. No entanto, nós esperamos a completude da magistratura, que todos estejam na mesma sintonia. Caso contrário, a prestação jurisdicional fica comprometida", compara Vasques.

Ao ver a situação se repetir com vários dvogados, Vasques ingressou com um Pedido de Providências na Ordem dos Advogados do Brasil - Secção Ceará (OAB-CE) para requerer a adoção de novas medidas, junto ao TJCE, e solucionar o problema. Questionada, a Ordem afirmou, em nota, que "segue, desde o dia 18 de março, nas tratativas para que a Justiça Estadual não fique paralisada e, consequentemente, que a advocacia e a sociedade não sejam prejudicadas".

A Ordem salientou ainda que "pensando em assistir a advocacia nesse momento, a OAB Ceará criou um canal exclusivo com o Tribunal de Justiça para o recebimento de solicitações urgentes de liberação de alvarás e/ou demandas com risco de perecimento do direito: o Via OAB. Os advogados e advogadas interessados nesse novo canal deverão entrar em contato através do Whatsapp (85) 98161.4466, das 10h às 15h, ou através do e-mail judiciario@oabce.org.br, informando no assunto qual a demanda a ser realizada", citou.

Esclarecimentos

Após a publicação da matéria, o juiz titular de Caridade, Caio Lima Barroso, procurou a reportagem para esclarecer o ocorrido. "Em relação ao preso beneficiado pela decisão de Habeas Corpus, o STJ encaminhou a comunicação à Comarca de Caridade dia 23 às 10h30min. Foi juntado aos autos às 15h. Às 17h o juiz que está respondendo determinou a expedição do Alvará. E às 10h do dia 24 foi expedida a precatória com urgência a comarca de Aquiraz, onde o réu se encontrava preso. Quando a matéria saiu a questão tinha sido resolvida no dia anterior".

O magistrado destacou ainda que "quanto a suposta impossibilidade de contato do advogado, o número de atendimento da comarca permanece o mesmo, 8533241217, sendo o atendimento via Whatsapp, diante do trabalho ser feito remotamente, no período de restrição imposta pelo combate ao Covid e devidamente regulamentado pelo TJCE".

Esforços

O Tribunal de Justiça do Ceará (TJCE) informou, em nota, que "está empreendendo esforços para garantir o acesso do cidadão e dos advogados à Justiça e prevenir o contágio do novo Coronavírus (Covid – 19) nas dependências das unidades judiciárias de todo o Estado".

Segundo o TJCE, os servidores estão com acesso remoto aos sistemas do Judiciário, com auxílio técnico disponível 24 horas, e os interessados podem entrar em contato com as unidades judiciárias da Capital e do Interior através de número de telefone e e-mails divulgados no site do órgão e em outros canais de comunicação.

"As dificuldades nesses primeiros dias no contato da população e dos advogados com alguma comarca do Estado serão solucionadas. O Tribunal de Justiça pede a compreensão de todos e garante que está buscando, diariamente, atualizar com frequência mais dinâmica a lista para normalizar o acesso à Justiça. O Ceará passa por uma situação inédita que modificou, também, no âmbito da Justiça, a forma de trabalho de todos", salienta o Tribunal de Justiça
.

Os destaques das últimas 24h resumidos em até 8 minutos de leitura.
Assuntos Relacionados