Turismo Rural é incrementado nas comunidades do Crato

Visitantes se encantam ao perceberem as riquezas ambientais, culturais e arqueológicas

Escrito por Antonio Rodrigues - Colaborador ,
Legenda: Casa de Farinha, no Baixio do Muquém, conserva, ainda hoje, a mecanização antiga
Foto: Fotos: Antonio Rodrigues

Crato. Trilhas, bicas naturais, cachoeiras, casa de farinha, apresentações culturais, culinária, memória e arqueologia. São diversas as potencialidades que as comunidades deste Município no Cariri cearense têm desenvolvido por meio do turismo rural, prática cada vez mais comum no campo. As opções são muitas e agradam vários tipos de público. Alguns destes sítios já recebem visitantes há alguns anos, como é caso do Chico Gomes. Outros têm, aos poucos, articulado as lideranças para crescer ainda mais a visibilidade, como o Assentamento 10 de Abril e o Baixio das Palmeiras.

Tudo começa, a princípio, com visitas acadêmicas ou de fóruns, durante eventos ou aulas de campo. De maneira tímida, os moradores vão percebendo as riquezas ambientais, culturais e históricas de seu lugar. E isso começa gerar renda. No caso do Sítio Chico Gomes, no sopé da Chapada do Araripe, o turismo rural começou por acaso, como descreve o educador popular e poeta Manoel Leandro. Em 2009, o Fórum Cearense Pela Vida no Semiárido, que debatia a questão agrária, foi sediado lá.

Na época, os participantes ficaram hospedados nas casas dos moradores, que acolhiam de uma a duas pessoas. "A gente achou que foi uma experiência interessante. E tivemos outros encontros realizados com a mesma metodologia", explica Manoel. Isso proporcionou uma interação com a comunidade, que aprovou a experiência. "Depois, percebemos que tinham outras coisas que poderiam ser trabalhadas, como a trilha, que antigamente era usada para o extrativismo". Dessa trilha ociosa, foi pensada a possibilidade de proporcionar o turismo ecológico e de aventura.

Lá, são aproximadamente 4Km de trecho íngreme, que podem ser percorridos entre 40 minutos a uma hora. Pelo trajeto, os visitantes se refrescam nas bicas naturais e, no fim dela, há um mirante com uma bela vista para a comunidade. Há também uma pedra que serve como ponto de rapel para os mais aventureiros. Nela, é possível conhecer plantas nativas da fitoterapia, que servem para fazer chás e lambedores. No retorno, o almoço é na casa dos moradores.

Manoel acredita que isso tudo foi percebido por meio da organização comunitária, com importante participação dos jovens. Este grupo, articulado desde 2006, na quadrilha junina, sentiu a necessidade de resgatar manifestações culturais tradicionais, como as danças e canções de seus antepassados.

Músicas

"Conhecer um pouco mais sobre si mesmo", descreve Manoel Leandro. Aí foi um trabalho de memória que, além das danças, evidenciou as antigas canções entoadas nas apanhas de arroz, no plantio da mandioca, nas casas de farinha e nas pisas de barro para fazer as casas de taipa. Disso tudo, surge o grupo Urucongo de Artes. O nome do grupo nasce deste resgate pois, antigamente, "urucongo" era a palavra atribuída ao berimbau, não mais usada na atualidade. Hoje, o grupo trabalha as canções, muitas com raízes indígenas e afro-brasileiras, também no coco, na ciranda e no maneiro-pau.

O Urucongo, que já realizou apresentações em diversos lugares da região, é alvo de diversas visitas ao Chico Gomes, porque realiza a já tradicional "Balada Coco", com apresentações no terreiro sob a luz da lua cheia. Por isso, Manoel acredita que, além da cultura, o trabalho com as trilhas tem sido importante para combater a migração rural.

Complemento

As pessoas que acolhem, geralmente, recebem uma quantia acordada com o visitante para sua estadia, além disso, há o almoço e a janta que são definidos coletivamente com o grupo. As lideranças do Chico Gomes realizam um rodízio para cada visita e todos os moradores podem ter um complemento na sua renda. Por outro lado, também há os produtos criados pelas meizinheiras, como os sabonetes medicais, além do próprio artesanato. Os condutores das trilhas também são remunerados.

A poucos quilômetros do Chico Gomes fica a sede do distrito Baixio das Palmeiras, na comunidade homônima, e mais três próximas: Baixio do Muquém, Oitis e Chapada. A popularização desse local se deu, principalmente, a partir de 2011, após os moradores descobrirem que estão na rota das obras do Cinturão das Águas do Ceará (CAC) - a maior obra hídrica do Estado. Lá, será construído um canal de 30 metros de largura, que conduzirá as águas do "Velho Chico". Com isso, os próprios moradores iniciaram um movimento de resistência para ter mais informações sobre o projeto e minimizar os danos que, a princípio, desapropriariam cerca de 100 famílias.

A comunidade do Baixio das Palmeiras está localizada a pouco mais de 7Km da sede do Crato e fica próxima do limite com Barbalha. Em território de vale, vários riachos cortam o sítio, que criou uma importante área agrícola. Lá também foi território dos povos indígenas e é possível encontrar escrituras e pedras usadas na fabricação de algumas ferramentas. Pelo próprio estudo do CAC, foi identificado um sítio arqueológico batizado com o nome do distrito.

Oportunidade

Desde a chegada da obra, o Baixio das Palmeiras começou a receber muitos visitantes, principalmente, para estudos acadêmicos. Com isso, as lideranças comunitárias notaram a oportunidade de se articular e criar sua rota turística, já que as comunidades estão passando por profundas transformações, pela rápida urbanização, caracterizada pela chegada de loteamentos. "Temos potencial nas tradições culturais que fazem menção à nossa ancestralidade indígena e negra, a exemplo do maneiro-pau, do artesanato, a própria casa de farinha, e nossa natureza", descreve o professor e morador Liro Nobre.

No Baixio das Palmeiras, há trilhas como a do Riacho do Pinga, muito utilizada pelas pessoas da comunidade. No período chuvoso, uma bela cachoeira se forma. Também, há uma casa de taipa, do Século XIX, que pertenceu à dona Quitéria e foi importante rota dos cangaceiros no último século, principalmente, os "Marcelinos", que rondavam a região do Cariri. Já no Baixio do Muquém, uma casa de farinha, de quase 80 anos, ainda com estrutura mecânica manual, é preservada e recebe um bom número de visitantes, quase 500 por ano. Próximo a ela está o "Olho d'água do Muquém". Ele forma um riacho que serviu por muitos anos para abastecer os moradores e sua produção de farinha.

Outra comunidade que também realiza o turismo rural é o Assentamento 10 de Abril, 25Km distante da sede do Município. Em 2017, ele recebeu 14 viajantes franceses, por cinco dias. O roteiro incluía visitas ao Centro Cultura, à rádio comunitária, à capela, ao campo de futebol, às hortas, à Casa Digital e ao grupo de artesanato. Vizinho do Assentamento 10 de Abril, o grupo também conheceu o Caldeirão da Santa Cruz. À noite, um luau com fogueira, músicas tradicionais e apresentação de teatro.