Reassentados criticam abandono das Vilas Produtivas Rurais

Em três cidades da região do Cariri cearense, os equipamentos apresentam diversos problemas. As principais queixas das famílias reassentadas recaem sobre as escolas e postos de saúde que continuam sem funcionar

Escrito por Antonio Rodrigues , regiao@verdesmares.com.br

"Eu sinto falta da minha terra, do meu canto. Muitos amigos continuam lá", lamenta o agricultor Cícero Ananias Gonçalves. Sua família é só mais uma de centenas que moravam na faixa de implantação da obra do Projeto de Integração do Rio São Francisco (Pisf) e teve que morar em uma das diversas Vilas Produtivas Rurais (VPRs) construídas pelo Governo Federal nos estados de Pernambuco, Ceará e Paraíba. A proposta era fornecer apoio aos agricultores, além de disponibilizar diversos serviços como educação, saúde e lazer. Na prática, no entanto, a realidade foi outra, conforme contam os habitantes de três vilas em Mauriti, Brejo Santo e Penaforte, no Cariri cearense.

A Vila Produtiva Rural Descanso, em Mauriti, recebeu quase 100 famílias desapropriadas pelo Projeto de Integração do Rio São Francisco. Na localidade, foram construídas casas de alvenaria numa área de 99m² de edificações, além de campo de futebol, praça, centro comunitário, uma escola e um posto de saúde. O problema é que estes dois últimos equipamentos não funcionam.

Abandono

No prédio da unidade de educação já se vê o mato tomando conta, e parte do telhado corre o risco de cair. As crianças têm que estudar na cidade ou no sítio a 8 km de distância, e um ônibus faz o transporte delas. Cada família tem direito a um lote de cerca de quatro hectares, com o terreno da casa medindo 50x100 metros, suficientes para a produção de um quintal produtivo. Os moradores reassentados recebem um salário-mínimo enquanto aguardam a infraestrutura de irrigação. Depois disso, será pago meio salário mínimo por mais seis meses.

A realidade não é diferente na Vila Produtiva Rural Retiro, em Penaforte, que possui 40 casas com o mesmo padrão e tamanho. A água que abastece a localidade vem através de um poço profundo, e todos os moradores têm acesso. A escola de lá também nunca funcionou e o posto de saúde recebe apenas uma médica uma vez por mês. Aliás, um vídeo do Ministério da Integração Nacional divulgando a unidade de ensino em pleno funcionamento revoltou os moradores. "A Prefeitura argumenta que não tem condições de abrir", detalha uma moradora que não quis se identificar.

Inoperante

O prédio possui toda estrutura: banheiros grandes, cantina, refeitório. Mas, assim como a de Descanso, assiste ao mato tomar conta.

"Vai acabar a comunidade tendo que arcar com a manutenção", acredita a moradora. Já a produção nos quintais produtivos não está acontecendo em todas as casas, porque nem todos os moradores podem cavar poços, explicam.

Na Vila Produtiva Rural de Vassouras, em Brejo Santo, 145 casas foram construídas. Mesmo tendo um número alto de famílias, a escola também permanece fechada desde que foi construída. Um ônibus da Prefeitura faz o transporte das crianças para estudar nas comunidades vizinhas. Seus habitantes são de pessoas atingidas pelo Pisf no próprio Município. "Era o jeito vir ou perdia (a casa)", conta o agricultor Cícero Ananias Gonçalves, que há dois anos saiu do Sítio Coité onde foi "nascido e criado", afirma. "Deus é quem sabe (se a água vem)", resume Cícero, que está plantando de sequeiro, aguardando um bom "inverno", enquanto sua área irrigada de um hectare, prometida pelo Ministério da Integração, não sai do papel.

No entanto, sua grande preocupação é com a estrutura da barragem Cipó, que, segundo o agricultor, apresenta pequenos vazamentos. "Está saindo água por baixo. É um perigo. O que se viu em Minas Gerais, com a barragem de Brumadinho, pode acontecer aqui", teme.

Contudo, o Ministério de Desenvolvimento Regional contestou, já que lá não conta com reserva de água do Rio São Francisco.

Além disso, garantiu que a fiscalização e o monitoramento de todas as estruturas fazem parte da rotina das equipes técnicas.

Justificativas

O Ministério do Desenvolvimento Regional esclareceu que, na época, o antigo Ministério da Integração, em comum acordo com os gestores municipais, construiu as estruturas destinadas à Educação e Saúde. Portanto, a responsabilidade constitucional de gestão, manutenção e gerenciamento é do Município.

Em março de 2017, o Governo Federal repassou as estruturas da VPR de Vassouras, em Brejo Santo. Um mês antes, os equipamentos sociais similares da VPR Descanso, em Mauriti, também haviam sido entregues.

Por outro lado, a secretária de Educação de Brejo Santo, Jaqueline Braga, disse que a escola não está concluída. Para ela, ainda há obras a serem finalizadas nos banheiros e uma caixa d'água apresenta risco de desabamento.

"Todo Município quer uma escola. O Município está disposto a abrir a escola com muita festa", garante. Já na VPR de Descanso, em Mauriti, a situação é diferente. De acordo com a secretária de Educação do Município, Alice Tavares, não há demanda suficiente para abrir a escola.

"Se tivesse, seria multisseriado e a gente já está tirando das demais escolas do Município", afirma.

Os alunos estudam em duas escolas na sede do distrito de Palestina, a pouco mais de 8km. Um ônibus vai deixá-los diariamente. Sobre o prédio, a gestora disse que visitará na próxima semana para avaliar um novo uso no local.

A equipe do Diário do Nordeste procurou a Secretaria de Educação de Penaforte, mas os telefones fornecidos não funcionam.

Sobre a estrutura dos outros prédios, o Ministério do Desenvolvimento Regional ressaltou que a manutenção e gestão são de responsabilidade dos próprios moradores, que devem primar pela sua conservação.

Por fim, o órgão garantiu que todos os reassentados terão acesso à água para produção nos lotes irrigados.