Produtores apostam no associativismo para driblar crise no Sertão do Ceará

A seca que se instalou no Ceará nos últimos anos afetou sobremaneira quem depende da agricultura para o sustento. Como alternativa, um grupo de expositores de Cedro se organizou para vender produtos em feirinhas

Escrito por Honório Barbosa , regiao@verdesmares.com.br
Legenda: O lucro de cada expositor depende do produto comercializado. No entanto, a média para cada um deles é de um salário mínimo por mês
Foto: Foto: Honório Barbosa

A artesã Gislânia Paz produz peças em barro. O agricultor Francisco Ferreira colhe hortaliças e frutas. O aposentado Osmar Aranha fabrica peças de ferro e de madeira. Os três têm em comum o fato de serem pequenos produtores afetados pela estiagem, e de terem a oportunidade de vender seus produtos em feiras da agricultura familiar em Cedro, no Centro-Sul cearense.

O espaço de comercialização com feiras periódicas, realizadas na zona rural e na sede urbana às sextas-feiras, começou de forma tímida no início deste ano, mas ganhou força no último mês e se transformou em uma chance de ampliar a renda familiar e movimentar a economia informal a partir da comercialização de frutas, verduras, bolos, artesanato e outros produtos da culinária sertaneja.

Esse arranjo, conforme o presidente da Organização das Cooperativas no Brasil (OCB/Sescoop), no Ceará, João Nicédio Nogueira, caracteriza-se como "uma espécie de sistema associativista informal". Ele pondera que embora não haja formação de uma cooperativa propriamente dita, "é um modelo simples e consegue agregar produtores na promoção da venda de bens, favorecendo o coletivo e o individual".

A mesma análise é compartilhada pela presidente da Associação dos Usuários do Açude Ubaldinho, Josefa Ferreira. Ela pondera que, no momento em que a agricultura - principal fonte de renda para a maioria das famílias das zonas rurais - enfrenta uma crise com o advento da estiagem, "as feiras oportunizam uma significativa melhoria na renda dessas pessoas". Cada feira movimenta em média R$ 20 mil e reúne cerca de 70 expositores. "Sou aposentado, mas consigo fazer mais um salário com a venda de hortaliças e algumas frutas", disse o produtor rural Francisco Ferreira. Ele comercializa de 70% a 80% de sua produção orgânica. "Tudo que é produzido nas comunidades é comercializado. O caminho é esse e nosso esforço é dar continuidade e ampliar esse projeto", pontuou Nilson Diniz, presidente da Aprece e prefeito de Cedro.

Ampliação

Diante da boa movimentação financeira alcançada, a gestão local tem adotado mecanismos para inserir mais produtores neste mercado do tipo associativista informal. Uma das medidas é disponibilizar cursos de produção de hortaliças, manejo cultural orgânico, vendas e organização dos pequenos negócios, além de associativismo e gastronomia, com o intuito de capacitar jovens e adultos. Os cursos são ofertados por técnicos da Ematerce, Sebrae, Senac, Senar e Sindicato dos Trabalhadores Rurais em parceria com a Prefeitura de Cedro.

O economista Antônio Pereira de Souza defende a expansão da realização das feiras "tanto nos distritos quanto nas cidades" como forma de suprir lacunas financeiras causadas pela seca prolongada dos últimos anos. "É um modelo de negócio que movimenta a economia local", frisou.

Preservação 

As feiras não fomentam apenas a economia local, mas atuam na preservação de costumes e hábitos antigos. Cada agricultor e artesão traz uma história de vida. A raiz está nos antepassados. Eles conservaram a tradição que aprenderam com avós ou pais, como é o caso de Gislânia que desde criança via a avó e a mãe moldando o barro em peças de uso culinário para a sobrevivência da família. "Estou feliz em continuar essa arte", pontua. A felicidade, conforme acrescenta, é ainda maior "por conseguir levantar um bom dinheiro" diante da queda na renda causada pela estiagem no campo. Ela expôs cerca de 200 peças, com preços variando entre R$ 5 e R$ 50".