Pesquisa utiliza planta do semiárido na alimentação humana

Estudos comprovam que a planta Palma ajuda a combater doenças como cegueira noturna em recém-nascidos, além da fome e desnutrição. O vegetal é rico em vitamina A, vitamina C, complexo B e tem vários tipos de aminoácidos

Escrito por Antonio Rodrigues , regiao@verdesmares.com.br

É questão de convivência e não sobrevivência. Não vai acabar a seca. É preciso aprender a conviver com ela. É possível ter uma renda boa, uma boa qualidade de vida no semiárido", garante a tecnóloga em alimentos Elizângela Carlos da Silva. Com este pensamento de "conviver com a seca", a cratense desenvolveu um projeto que investiga o uso da palma na fabricação de farinha para produzir bolos, pães e biscoitos. Vegetal muito comum no Nordeste, o uso na alimentação humana ainda é visto como um tabu, apesar de ter sido mais difundido nos últimos anos. De origem mexicana, a palma foi introduzida no semiárido brasileiro no fim do século XIX, com o intuito de produzir corante carmim. No entanto, após a seca de 1932, o vegetal foi descoberto como uma excelente alternativa para a alimentação animal. Foi nessa época que o Governo Federal implantou um programa que disseminou a espécie principalmente no Nordeste.

A partir da década de 1980, houve estudos mais aprofundados sobre o aproveitamento da palma, inclusive, no consumo humano, que já é bastante comum no México, na Índia e nos Estados Unidos. Segundo Elizângela, estudos comprovam que a planta ajuda a combater doenças como cegueira noturna em recém-nascidos, além da fome e desnutrição. O vegetal é rico em vitamina A, vitamina C, complexo B e tem vários tipos de aminoácidos essenciais para o desenvolvimento humano.

Mas por que ele não é consumido com tanta frequência? Elizângela acredita que o preconceito, já que a planta é produzida em grande escala para a alimentação animal, faz com que as pessoas rejeitem seu consumo. "Para quebrar essa barreira, tem que conquistar a pessoa e passar a informação. Eu provei, achei interessante", conta a pesquisadora. A primeira receita que ela experimentou foi o suco - e logo foi aprovado. Como a palma é composta por 80% a 90% de água, seu sabor não é predominante, por isso, a bebida é preparada com limão, abacaxi, laranja ou melancia.

Depois de provar o suco e ver que funcionava (com um bom sabor), Elizângela fez novas experiências com receitas que já são difundidas no País como o doce, a geleia e a trufa. Os pratos foram produzidos e provados pelos alunos do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Ceará (IFCE), onde a tecnóloga em alimentos trabalha há 12 anos.

A trajetória de Elizangêla foi importante para o desenvolvimento de sua pesquisa, já que cresceu na zona rural de Crato e estudou em escola pública. "Caminhava bastante para chegar no Centro da cidade, o contato com a palma era comum". Depois de concluir o Ensino Médio, ela decidiu cursar Tecnologia em Alimentos no Instituto Centro de Ensino Tecnológico (Centec). Lá, já desenvolvia pesquisa com o uso do pequi - fruto nativo do Cariri. "É uma questão de sustentabilidade", lembra.

Ao entrar no IFCE campus Crato, começou a participar de um grupo de pesquisa que trabalhava com a palma. Foi nesse momento que resolveu elaborar o projeto de mestrado em algo que contribuísse para o desenvolvimento da região. "Comecei a ler sobre a palma assim como a farinha de banana. Ao conhecer seus benefícios, percebi que era um vegetal muito rico, mas com aproveitamento muito pequeno", explica.

Para ela, a planta tem outra característica muito importante além de sua nutrição: o fácil acesso nos períodos de escassez de chuvas. Depois de iniciar as experiências com suco, doce, geleia e trufas, a pesquisadora partiu para o seu principal desafio: a farinha de palma. Como um produto desidratado, o processo de elaboração é mais demorado e cuidadoso que de outras receitas. O resultado, no entanto, agradou e o item se tornou parte dos ingredientes de bolos, biscoitos e pães. "Com a panificação, se consegue colocar mais no mercado", disse.

Diversidade

Em algumas regiões, como na Chapada Diamantina, no Estado da Bahia, é possível encontrar a palma em feiras livres. Na Paraíba, a planta já é experimentada na merenda escolar de estudantes, refogada com o arroz. Em outras regiões do Ceará, já são feitos testes e receitas. "O pessoal tá começando, discretamente, a incluir na alimentação", admite Elizângela.