Palmácia pode ter 89 mil hectares protegidos com ampliação da APA

A expansão da abrangência da Área de Proteção Ambiental da Serra de Baturité deve beneficiar, além de Palmácia, outros nove municípios. A medida, sugerida por ambientalistas, visa garantir maior preservação ao ecossistema

Escrito por André Costa , andre.costa@diariodonordeste.com.br
Legenda: Ambientalistas creditam o aumento no desmatamento da Serra de Baturité à falta de fiscalização
Foto: FOTO: CID BARBOSA

Primeira a ser criada no Ceará, a Área de Proteção Ambiental (APA) da Serra de Baturité, desempenha fundamental papel na preservação do ecossistema da região. A APA abriga dez municípios, embora, a maioria seja contemplada com apenas uma pequena porção de seu território. É o caso de Palmácia, cidade com pouco mais de 12 mil habitantes. De seus quase 120 Km², apenas 0,76% é abrangido pela APA. A baixa cobertura, representa, na prática, uma ameaça ao meio ambiente. O desmatamento da floresta de Mata Atlântica, presente no Município, corrobora com essa tese levantada por ambientalistas. Nos últimos cinco anos, a cobertura vegetal nativa de Palmácia caiu de 965 hectares para apenas 268.

Com o objetivo de frear a degradação, estudiosos buscam ampliar a cobertura da APA de Baturité através da diminuição da cota de altitude. Atualmente, este índice está fixado em 600 metros, o que representa abrangência de uma área de 32.690 hectares da Serra. Caso a cota seja reduzida pela metade - 300 metros em relação ao nível do mar - mais áreas passariam a ser contempladas. Segundo a gestora da APA, Patrícia Jacaúna, a porção protegida receberia um "acréscimo de 178% de área e os atuais hectares protegidos por lei passariam para mais de 89 mil".

Para concretizar a alteração, no entanto, o Conselho Gestor da APA precisa formular um Plano de Referência do Termo de Manejo da Reserva. O processo está sendo aplicado em Guaramiranga, Mulungu e Pacoti. Contudo, para o processo caminhar, outros municípios afetados pela ampliação precisam criar um Plano de Gestão Municipal.

O professor de microbiologia Cássio Marinho Campelo é um dos que defendem a urgente ampliação da área. Ele ressalta que nas últimas décadas Palmácia tem sofrido severa degradação e adverte que, somente através de uma fiscalização mais rígida, que viria junto com a ampliação de cobertura do território, seria possível proteger o ecossistema rico em variedade.

"Temos partes planas, de vale, montanhosa e sertão, onde há inclusive vestígios indígenas. Isso precisa de um estudo, um acompanhamento da área", defende Cássio. O ambientalista Mateus Andrade é outro que denuncia casos de desmatamento e queimadas em áreas de Mata Atlântica existentes em Palmácia. Segundo ele, "a situação ocorre principalmente nos morros do Santo Cruzeiro e Torre da Lua e no Açude da Comissão", ambos localizados próximos à sede da cidade. Em 2018, Mateus enviou a denúncia à Secretaria do Meio Ambiente do Ceará (Semace), que entregou um relatório técnico da avaliação no Pico do Santo do Cruzeiro e do Açude da Comissão.

Segundo o documento, o açude passa por um "processo avançado de eutrofização (através do qual a água adquire níveis altos de nutrientes, especialmente fosfatos e nitratos) devido ao acúmulo de grande contingente de matéria orgânica despejada de esgotos clandestinos oriundos de ocupações irregulares que margeiam o açude".

Dificuldades

Como as áreas cobertas pela APA têm uma legislação mais rígida em relação às questões de preservação da natureza, os conflitos de interesse, evidenciados tão logo surgiu o debate de ampliação, colocaram um tom de cautela nas tratativas do projeto.

Patrícia Jacaúna, que esteve presente junto à equipe da Semace que fez a última visita técnica na cidade, aponta que "a atual situação das áreas apontadas como passíveis de degradação necessita da realização de estudos técnicos, realizados por especialistas, visto que os apresentados são de natureza acadêmica".

A gestora acrescenta que a proteção das áreas ambientais "pode ser feita também através de políticas sustentáveis, mas cada um precisa fazer a sua parte". Ela justifica que além "da Semace, instituições parceiras como a SOS Mata Atlântica e o grupo de Negociação em Acesso a Mercados de Produtos Não-Agrícolas (Nama), têm colaborado na sensibilização da população serrana".

O prefeito de Palmácia, David Campos (Pros) se mostrou "favorável" à ampliação da área de preservação ambiental. Contudo, fez ressalvas quanto ao modelo a ser adotado. "Concordo com o objetivo do projeto. Ele possibilitará maior fiscalização e controle do meio ambiente, mas temos que lembrar dos pequenos agricultores que atuam na localidade. Muitos dependem dessa cultura de subsistência e eles seriam afetados com a ampliação", detalha.

Mudanças

Caso a ampliação territorial da APA seja efetivada, diversas mudanças devem, por lei, ocorrer. Dentre elas, fica proibida a implantação ou ampliação de quaisquer tipos de construção civil sem o devido licenciamento ambiental; a supressão de vegetação e uso do fogo; proibidas também atividades que possam poluir ou degradar os recursos hídricos, como também o despejo de efluentes, resíduos ou detritos capazes de provocar danos ao meio ambiente. Será vedada ainda a intervenção em áreas de preservação permanente, como margens de rios, matas virgens ou em avançado processo de regeneração que sejam danosas ao meio ambiente. Diante dessas normativas, David Campos recorda que muitos palmacianos sobrevivem da agricultura e "não podem ser afetados".

"Ampliando a Área de Proteção Ambiental (APA), eles não poderão mais desmatar pequenas terras para plantar milho, feijão ou cana-de-açúcar. Então esse projeto também teria que trazer uma solução para a sobrevivência desses agricultores", defende o gestor.

Uma das alternativas sugeridas por Campos seria a criação de uma Reserva Particular do Patrimônio Natural (RPPN). "Desta forma, o Município teria capital para investir na fiscalização e, ao mesmo tempo, garantiria a proteção ambiental, viabilizando a agricultura", reitera.

O Município agora aguarda a finalização do relatório técnico produzido pela Semace que deve ocorrer, segundo David Campos, no início de setembro. A depender do parecer, a ampliação da reserva entra no mérito final.