Jumentos são bem tratados em fazenda estadual

Escrito por Redação ,
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Por meio do Detran, o Estado realiza trabalho de assistência a jumentos abandonados nas estradas

Santa Quitéria. A Fazenda Paula Pessoa, administrada pelo Detran para receber jumentos abandonados nas estradas do Estado, não merece mais o título de "campo de concentração", conforme foi noticiado por este jornal em fevereiro de 2008. Na época, o local era administrado pelo Departamento de Edificações e Rodovias (DER) e os animais estavam abandonados, deixados praticamente sem água e sem comida. Atualmente, a realidade está bem melhor.

Após apreensão nas estradas, os jumentos são examinados por um médico veterinário e recebem total assistência, incluindo boa nutrição. A diferença é visível entre quando eles chegam e após algumas semanas morando na fazenda.

Localizada na rodovia CE-176, em Santa Quitéria, a fazenda recebe diariamente uma média de até 30 jumentos abandonados nas estradas. Muitos deles chegam magros, bastante maltratados pela situação do abandono.

"Com a urbanização, hoje se veem muitos destes animais soltos, abandonados, substituídos por motocicletas e automóveis. Aqui eles recebem o tratamento que deveriam ter tido do proprietário, que tem obrigação de cuidar e não o fez. É um animal vivo e dócil, mas também tímido e teimoso", diz o veterinário Pedro Paulo Noronha, responsável pela sanidade dos quase 6 mil animais recolhidos na fazenda. Segundo explica, os primeiros cuidados são a fixação de um selo numerado na orelha, a vacinação e a vermifugação.

No primeiro momento são avaliados um a um, levando-se em conta peso, estatura, idade e as condições de saúde. Depois, eles são separados em piquetes, para controle dos possíveis acasalamentos. A fim de proporcionar as condições de alojamento essenciais à garantia da qualidade de vida destes animais, eles são mantidos em grupos, e encontram com facilidade abrigos sob árvores que fazem parte da vegetação da fazenda. A partir daí, os jumentos recebem alimentação adequada, à base de capim, espalhado em pontos estratégicos da fazenda.

No campo, observa-se que o jumento é um animal que come pouco e contenta-se com forragem e grãos de inferior qualidade que outros animais rejeitariam. A água é disponibilizada em abundância nos quatro açudes que foram construídos dentro da fazenda.

"A longevidade média do jumento é de 15 a 18 anos, por causa do excesso de carga, que esgotam suas energias vitais. Porém pode atingir de 30 a 35 anos ou mais", explica Pedro Paulo. A fase adulta acontece entre três e quatro anos. Os dentes, que evoluem de uma forma idêntica a dos cavalos, são, como nestes animais, um bom meio para o reconhecimento da idade. Nas fêmeas a gestação dura, aproximadamente, um ano, tendo em cada parto uma cria. Muito raramente, podem gerar duas. Durante muitos séculos, este animal foi meio de transporte, de estimação e, até mesmo, um bem de herança.

"Como são animais que podem transmitir a raiva e o tétano, os funcionários, antes de lidar com a espécie, são vacinados contra esses males", disse o veterinário. Na fazenda, pelo menos 12 homens trabalham diariamente dando comida e água para os bichos.

Cuidados essenciais

Os jumentos são animais que precisam de cuidados pontuais. Mas a demora no atendimento aos primeiros sinais de doença pode levar a sequelas como as dermatites, normalmente sazonais, e que ocorrem com maior frequência nas mudanças de estação (inverno/ verão); as pneumonias, mais frequentes nas chuvas; e as cólicas, que podem acontecer durante todo o ano.

Apesar de este animal ser originário de regiões semi-desérticas e de se adaptar a viver sob as mais diversas condições, climas, tipos de relevo e habitats, não dispensa alguns cuidados básicos. Também não se deve esquecer que trata-se de um animal gregário, não gosta de viver sozinho. É recomendado manter pelo menos dois jumentos juntos. Caso não seja possível, poderá ser mantido com um animal de outra espécie (cavalo, cabra, ovelha, entre outros).

No Ceará, há 10 centros de apreensão de animais nas estradas, localizados em Maranguape, Aracoiaba, Quixeramobim, Iguatu, Crato, Russas, Itapipoca, Sobral, Santa Quitéria e Crateús. A Fazenda Paula Pessoa tem 900 hectares, sendo 500 sob gestão do Detran.

"NOSSO IRMÃO"

COMENTE Animal tem registro bíblico

Santa Quitéria.
O jumento é um dos animais de carga e tração mais antigos da humanidade. É personagem de passagens bíblicas, servindo de montaria ao "Filho de Deus" durante entrada triunfal em Jerusalém. É um mamífero de médio porte, que está ligado ao homem desde os tempos mais remotos do período Neolítico. Os registros mais antigos da sua domesticação provêm do antigo Egito. Admite-se que, na Europa, tenha surgido no quinto milênio antes de Cristo e se expandiu por todo o continente.

Um dos maiores protetores da espécie foi o Padre Antônio Batista Vieira, ou simplesmente Padre Veira. Ele é autor de uma das obras literárias mais comentadas, "O Jumento nosso irmão", que lhe deu o título internacional de "Protetor do Jegue". Nascido no ano de 1919, na Lagoa dos Órfãos, Município de Várzea Alegre, faleceu em 2003, em Fortaleza, aos 84 anos. Teve o livro lançado em 1964 e traduzido para o Inglês. Sua obra-prima publicada pela Livraria Freitas, é um tratado sobre o jumento, focalizando-o na História, Religião, Economia, Folclore e Literatura. Nesse tratado, fica-se sabendo que os primeiros jumentos aqui chegados parece terem sido trazidos por dona Ana Pimentel, esposa e procuradora de Martim Afonso de Sousa, donatário das capitanias hereditárias de São Vicente e do Rio de Janeiro.

Durante 50 anos, Padre Vieira militou em defesa dos jumentos transformando-se em seu defensor máximo, contra sua extinção. Por mais de seis décadas dedicou-se ao sacerdócio.

Ele foi um dos fortes integrantes do movimento surgido na cidade do Crato, chamado "Trilogia do Ciclo do Jumento", ao lado de Luiz Gonzaga, José Clementino, Patativa do Assaré e outros, cujo objetivo principal é a defesa do jegue.

No Ceará, destaca-se também na defesa dessa espécie a presidenta da União Internacional Protetora dos Animais (Uipa), advogada Geuza Leitão. Em diversos momentos, cobra das autoridades ações de combate aos maus-tratos.

Quem tem um desses jumentos recolhidos por um pequeno descuido e tem interesse em reaver o animal, basta se dirigir à unidade do Detran mais próxima da região onde mora e tentar resgatá-lo. Caso contrário, terá que vir até a fazenda, assinar um termo de compromisso, pagar uma taxa que fica em torno de R$ 112,00, além das diárias, cobradas ao preço de R$ 22,00. "Depois disso, o dono fica responsável por qualquer dano causado a qualquer pessoa que trafegue pelas nossas rodovias", disse Pedro Paulo.

Wilson Gomes
Colaborador