Cáritas desenvolve trabalho social com catadores de lixo

Escrito por Redação ,
Além da organização econômica, a iniciativa ressalta a cidadania e a garantia dos direitos da comunidade envolvida

Limoeiro do Norte. É das mãos habilidosas, do trabalho árduo em meio a montanhas de lixo, que os catadores de material reciclável do Vale do Jaguaribe vão levando a vida. Invisíveis aos olhos da sociedade, eles buscam dignidade e melhores condições para exercer a atividade. É uma luta difícil, que vem sendo travada desde 2010, com o apoio da Cáritas Diocesana. Em três anos, a perseverança de pequenos grupos tem alcançado algumas conquistas.

A partir do trabalho no lixão, os catadores buscam organizar cooperativas, tanto com a meta de obter renda quanto na busca de dignidade e melhores condições para o exercício da atividade Fotos: Ellen Freitas

"Lembro como se fosse hoje. Em 2010, eles chegaram no lixão perguntando se a gente gostaria de melhorar a vida. Muita gente achou besteira, disseram que não ia dar em nada", conta a catadora Maria Rubens Saldanha Bezerra, mais conhecida como Pedinha. Esse foi o primeiro contato dos agentes da Cáritas com o grupo de catadores de Limoeiro do Norte, que também seguiram para as cidades de Russas e Quixeré, para realizar o mesmo trabalho.

Realidade

Pedinha é catadora há 25 anos e conhece como ninguém a realidade de um lixão. É um trabalho duro, perigoso, que começa antes do sol nascer e vai até o início da tarde. Mesmo não sabendo quantas vezes já adoeceu na pele, as marcas vão ficando pelo corpo. "A gente tenta se proteger, mas é o tempo todo aparecendo micose, só falta não sarar", relata.

Com toda a dificuldade, ela e o seu marido Deusimar, que também é catador, educaram seus dois filhos, que hoje trabalham no Porto do Pecém, em São Gonçalo do Amarante. Construíram sua casinha e hoje só esperam que o trabalho possa melhorar.

O trabalho da Cáritas compete apoiar e auxiliar os grupos na organização social, formação de associações, mobilização e articulação para coleta seletiva, fortalecendo a autonomia da organização de grupos e, em especial, na defesa e garantia de direitos. O intuito é conquistar coletivamente o direito dos catadores e sua valorização enquanto categoria produtiva e assim mudar as duras rotinas nos lixões.

Desde 2010, esse trabalho vem se desenvolvendo em comunidade de Limoeiro do Norte, Russas e Quixeré. Ao todo, 200 catadores são beneficiados com o trabalho, além de 30 crianças, jovens e adolescentes, que também participam de atividades socioeducativas e culturais na própria comunidade.

Ao longo desses três anos de luta, foram constituídas associações de catadores nos três municípios, com a participação recente da Associação de Catadores de Tabuleiro do Norte, onde a Cáritas vem acompanhando desde o ano passado.

Os catadores realizam marchas, levam para a sociedade e publicam na imprensa suas demandas, reivindicando seus direitos como trabalhadores. Há uma constante pressão junto às Prefeituras para que haja negociações a fim de atender às necessidades da categoria.

O grande problema tem sido a lentidão com que as gestões municipais tratam a questão dos resíduos sólidos, onde entra a atuação de catadores no processo de coleta seletiva dos resíduos sólidos.

De acordo com coordenadora da equipe técnica da Cáritas, Anjerliana Souza, o trabalho realizado na região passou a ganhar maior visibilidade quando começou a atuar no campo urbano.

"A nossa missão contribuiu para que a realidade conhecida e vivenciada pela comunidade entrassem no campo da visibilidade. Para isso a Cáritas tem contado com parcerias de movimentos sociais e universidades", afirma Anjerliana.

Um dos grandes desafios do processo tem sido organizar os catadores, devido aos inúmeros conflitos que são comuns dentro do grupo, e abrir discussões com o poder público.

Porém, mesmo diante das dificuldades, o trabalho já tem rendido bons frutos. A Associação dos Catadores (as) de materiais recicláveis de Russas (Ascamarru) se prepara para iniciar o programa piloto de coleta seletiva, que tem prazo para início em julho deste ano. Após um longo processo de negociação com a Prefeitura, eles conquistaram um galpão e um carro para o transporte dos materiais que serão coletados em alguns bairros da cidade.

Organização

Em Quixeré, o processo de organização culminou com a constituição da Associação de Catadores Paz e Amor, em assembleia realizada no início deste mês. Agora vão procurar debater com o poder público a implantação da coleta seletiva.

A Associação de Catadores Bom Jesus do Sul, neste município, foi contemplada com a cessão de uso de um galpão, cedido pela Prefeitura. Agora está sendo pautado como o trabalho de coleta será realizado.

Entidade estende ação em todo o Ceará

Limoeiro do Norte. A Cáritas estende seu trabalho a todo Ceará através de oito regionais. Os trabalhos, em grande parte voltados ao homem do campo, promovem uma nova perspectiva de desenvolvimento social sustentável e justo, por meio da organização popular. Junto às comunidades, são desenvolvidos projetos e ações que buscam dar uma melhor qualidade de vida ao homem do campo. Recentemente, as atividades estão se voltando para as periferias das cidades, junto a comunidades de catadores.

A Cáritas, que é mantida pela Igreja Católica, atua de acordo as especificidades de cada região. No Ceará, além dos catadores do Vale do Jaguaribe, uma atuação importante vem sendo empreendida com os agricultores familiares no semiárido

Desde a década de 80, a Cáritas realiza no Ceará, um trabalho voltado para o apoio às famílias e as comunidades em situação de risco, ou que venham sofrendo impactos de projetos governamentais. A entidade fomenta projetos nas áreas de agricultura familiar, economia solidária, desenvolvimento sustentável, além da formação política e cidadã das comunidades.

As ações junto ao homem do campo vão desde projetos para agricultura familiar, como agroecologia, criação de pequenos animais, hortas orgânicas, quintais produtivos, até projetos de infraestrutura para captação de água da chuva. Como ações de destaques está o trabalho com agricultores e agricultoras em torno da Rede de Intercâmbio de Sementes (RIS) nas regiões de Sobral e Itapipoca e também a ação junto a organização de grupos de Juventude que acontecem em todo o Estado.

De acordo com a secretária regional da Cáritas Ceará, Maria Glória Carvalho, a articulação da entidade junto às comunidades, tem contribuído para o desenvolvimento de regiões mais carentes. "A Cáritas atua de acordo com a realidade local, olhando para a especificidade de cada região, mas com as diretrizes gerais que são o desenvolvimento solidário, sustentável e territorial, a mobilidade de políticas públicas e fortalecimento da Rede Cáritas. Elas orientam o tipo de projetos e público com que é trabalhado", explica.

Para o enfrentamento de grandes problemáticas, como a forte estiagem que já vem entrando em seu terceiro ano, uma das estratégias de ação junto aos agricultores foi ampliar os programas de captação de água e produção adaptada ao semiárido. A coordenadora observa que as comunidades que já vinham realizando os projetos não tiveram tanto impacto com a seca como outras regiões desassistidas. "Mesmo com a seca, observamos que algumas famílias conseguiam plantar", ressalta.

Outra estratégia, na área de das políticas públicas, foi monitorar os recursos que ainda estão sendo passados para tratar o problema da estiagem junto à população. Assim, reivindicar a concreta aplicação dos recursos, sendo em programas de carro-pipa ou em projetos para o enfrentamento da seca.

O trabalho junto aos catadores teve início em 2000, sendo a Cáritas Arquidiocesana de Fortaleza pioneira na ação.

Hoje, mais de 400 catadores estão organizados na rede de catadores e no Fórum Estadual Lixo e Cidade. Discussões sobre coleta seletiva, política de resíduos sólidos e melhorias nas condições de trabalho dos catadores são levados à discussão nos grupos e reivindicados junto ao governo, com a aplicação de políticas públicas.

ENQUETE

Como espera trabalhar após as conquistas?

"Aos poucos a gente vê as coisas dando certo no nosso meio. No momento, tudo é uma questão, também, de paciência. Enquanto eu puder lutar para melhorar nosso trabalho, eu não vou parar"
Maria Rubens Saldanha Bezerra
Presidente da Associação de Catadores

"Fiquei muito feliz com a conquista do galpão, pois significará um trabalho mais rentável e prático para nós todos, por meio das atividades de reciclagem. Espero que o trabalho melhore daqui pra frente"
Deusimar de Arruda Bezerra
Catador

ELLEN FREITAS
COLABORADORA

Mais informações:

Cáritas Diocesana
Município de Limoeiro do Norte
Telefone: (88) 3423.3222
Vale do Jaguaribe
caritaslimoeiro.blogspot.com.br