Sem reeleição, disputa em Fortaleza pode mudar balança de forças

Cientistas políticos consultados pelo Diário do Nordeste problematizam os desafios da disputa eleitoral em outubro considerando as particularidades da Capital cearense no cenário político. Padrinhos podem não ser decisivos

Escrito por Wagner Mendes ,
Legenda: A disputa pelo comando do Paço Municipal já reúne cerca de dez pré-candidatos
Foto: Foto: José Leomar

Em 2004, quando a então deputada estadual Luizianne Lins (PT) surpreendeu o próprio partido se elegendo prefeita de Fortaleza, havia um cenário político completamente diferente do que temos hoje na Capital.

Embolados nas pesquisas de intenção de voto, Inácio Arruda (PCdoB), Moroni Torgan (DEM) e Antônio Cambraia, na época filiado ao PSDB, protagonizaram a disputa até a última semana. Dezesseis anos depois, essas lideranças passaram à condição de coadjuvantes, praticamente fora do jogo. Cambraia, oficialmente, declarou que não mais se aventura pelas urnas.

Os ciclos surgem e morrem na medida em que as forças políticas perdem discurso e acumulam desgastes. Na reta final do oitavo ano de mandato do prefeito Roberto Cláudio (PDT), a expectativa é de saber se o ciclo se encerrará ou se terá fôlego suficiente para eleger um sucessor, ligado também ao governador Camilo Santana (PT).

Prever quem será eleito ou eleita para comandar Fortaleza pelos próximos quatro anos é tarefa que nenhum pesquisador em eleição, nem o mais experiente cacique partidário, consegue cravar. No entanto, há caminhos que podem ser considerados numa avaliação, de acordo com o cientista político e pesquisador do Laboratório de Estudos sobre Política, Eleições e Mídia da Universidade Federal do Ceará, Cleyton Monte.

Ele acredita que a figura dos padrinhos, tradicionalmente utilizada para alavancar os nomes desconhecidos do grande público, não será determinante para a campanha. "Desde 2016, a figura do padrinho político está em decadência, é alvo de muitas críticas. Você vai ter, já em 2016, vários prefeitos eleitos com a bandeira de que não são 'candidatos de ninguém', que não são apadrinhados por ninguém. Em 2018, tivemos a 'onda Bolsonaro' e uma das marcas era não ser apoiado por nenhuma liderança", reforça Monte.

O peso de lideranças nacionais hoje é bem menor do que nas eleições municipais passadas, segundo o pesquisador. "Em 2012, a gente fez uma pesquisa sobre os influenciadores, e o nome do Lula (ex-presidente do PT) foi colocado como um dos mais importantes. Nessa época, ainda foi muito forte, mas em 2016 essa figura não foi mais tão presente. Em 2016, Roberto Cláudio teve uma campanha focada nos feitos dele do primeiro mandato, nas obras dele de prefeito, para afastar a ideia de que era 'poste'", explica. Para o professor, poderá ter mais força o "candidato que conseguir passar uma mensagem de autonomia e ao mesmo tempo de inovação de gestão".

Estratégias

Com histórico de reviravoltas, a Capital cearense tem ainda, como ingredientes na eleição local, o tempo mais curto de campanha e a proibição de recursos privados para financiamento das candidaturas, mudanças que passaram a vigorar nas últimas eleições municipais, há quatro anos.

Dirigentes partidários ainda ajustam suas estratégias às novas regras. Qualquer erro de cálculo pode custar o resultado final. Um dos pontos colocados pelo cientista político Francisco Moreira Ribeiro, da Universidade de Fortaleza, é que a cidade também tem histórico de padrinhos influenciando.

"A gente não pode perder de vista essa tradição", ressalta. Segundo ele, a maioria dos nomes estão apenas ventilados e apenas o deputado federal Capitão Wagner (Pros) é quem aparece como nome certo para o páreo. "Os principais personagens que podem ter uma influência significativa na eleição ainda não apareceram". Ele lembra ainda que "a eleição começa a se definir nos últimos 15 dias, e é aí que você vai ver o rumo que o eleitorado vai desenhando".

A inexistência de padrinhos políticos também é uma estratégia de candidatos na disputa em uma das capitais mais importantes do País.

Ressaltar certa "tradição de independência" de Fortaleza, em relação a forças políticas que ocuparam o Palácio da Abolição nas últimas décadas é comum no discurso de quem tem pouca estrutura partidária. Ainda paira no imaginário político o histórico de prefeitos da Capital opositores do Governo do Estado.

Reforçando os argumentos de Monte, a professora de Teoria Política da Universidade Estadual do Ceará, Monalisa Torres, acredita que a eleição municipal "será pautada pelas questões próprias do município", e que "isso acaba resultando no que vai ser debatido, e em quem seria capaz de orientar essas discussões".

Torres aposta que esse enfrentamento de outubro próximo "não vai ser uma eleição de renovação, e sim de avaliação de gestão".

"Nesse cenário de disputas locais, o que vai pesar é a avaliação da gestão. Vai exigir pessoas que tenham o mínimo de conhecimento de problemas locais. Não creio que seja a vez dos outsiders", projeta.

 

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