Pauta de ‘costumes’ divide deputados da base governista na Assembleia Legislativa

Estão na pauta de votação desta quinta projetos que têm causado polêmica na Casa. Um deles inclui a Parada pela Diversidade Sexual no calendário de eventos do Estado; outro concede o título de cidadã cearense à ministra Damares Alves 

Escrito por Letícia Lima , leticia.lima@diariodonordeste.com.br
Legenda: Proposições motivam embates entre deputados conservadores e outros mais ligados à esquerda
Foto: Foto: José Leomar

Assembleia Legislativa deve votar, nesta quinta-feira (18), projetos polêmicos da chamada “pauta de costumes”, que mexem com questões religiosas, ideológicas e morais. Entre eles, está o que inclui a Parada pela Diversidade Sexual no calendário de eventos do Estado e outro que concede o título de cidadã cearense à ministra da Mulher, Família e Direitos Humanos Damares Alves. As propostas prometem embates entre aliados da base do governador Camilo Santana (PT), que vão de conservadores a militantes de esquerda. 

Não é à toa que alguns desses projetos foram pautados ainda sem um acordo na base. Ao contrário, nas últimas semanas, os deputados Elmano de Freitas (PT) e Dra. Silvana (PL) travaram uma queda de braço, nos bastidores, em torno da aprovação das propostas. Silvana quer dar a Damares, ministra do Governo Bolsonaro e ligada à igreja evangélica, assim como ela, o título de cidadã cearense. 

Resistências

No texto, a parlamentar, da bancada religiosa do Legislativo, justifica que a ministra tem um “dedicado trabalho a colaborar também com o desenvolvimento e o crescimento das comunidades locais, em razão, sobretudo, do seu exemplo de dignidade e de firmeza de princípios fundados na ética cristã”. O projeto de Silvana, no entanto, sofre resistências na base governista, desde que foi apresentado, no último mês de junho, principalmente entre deputados do PDT e do PT. 

Isso porque, além das críticas que muitos fazem às declarações da ministra, esses partidos fazem oposição ao Governo Bolsonaro (PSL). Inclusive, lideranças do PDT chegaram a orientar deputados a retirar assinaturas do projeto. De lá para cá, Silvana procurou o presidente da Assembleia, deputado José Sarto (PDT), e até o governador Camilo Santana (PT), em busca da intervenção deles junto à base, para buscar mais apoio à aprovação do título. 

Ela não garante um acordo, mas ameaça “incendiar” a tribuna, se a honraria não for aprovada. </CW><CW-36>“Eu quero valorizar o público que me elegeu, ou eles não querem uma deputada com esse perfil na base? Se não for aprovado, existiu um trabalho do Governo contra essa deputada. A Damares mudou o perfil dos Direitos Humanos no Estado e no País. Hoje, a ministra é ícone dos crentes”, afirma. Silvana diz ter mobilizado até pastores de igrejas evangélicas para acompanhar a votação em plenário nesta quinta. 

Embates 

Em meio a polêmicas, o projeto demorou a tramitar na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ), principalmente depois de o deputado Elmano, membro do colegiado, pedir vistas. O petista assinou o projeto de Damares para que ele tramitasse, em troca da assinatura de Silvana no projeto dele para conceder título de cidadão cearense a um dos fundadores do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), João Pedro Stédile. 

Só que o clima azedou quando Silvana e outros deputados da bancada religiosa criticaram em cheio outro projeto de lei de Elmano, que propõe a inclusão da Parada pela Diversidade Sexual no calendário de eventos do Estado. Na proposta, ele argumenta que o evento representa a história de um movimento social que “tem se transformado em uma das maiores manifestações culturais do Estado”, reunindo anualmente cerca de um milhão de pessoas para pedir o fim do preconceito e da intolerância. 

O projeto seria votado no último dia 29 de agosto, mas acabou não sendo por falta de deputados no Plenário 13 de Maio. Na semana seguinte, a matéria chegou a ser colocada na pauta, mas foi retirada pelo o presidente José Sarto. Na ocasião, Silvana trabalhou junto a aliados da base para votarem contra o projeto. Também membro da bancada religiosa, o deputado Apóstolo Luiz Henrique (PP) é contrário à aprovação do texto, porque, segundo ele, participantes do evento ridicularizam as religiões. 

“Não somos contra a escolha de uma pessoa dizer que quer ser homossexual ou lésbica, porque Deus deu o livre arbítrio. Mas o que acontece é a forma como essas pessoas se expressam, ridicularizando a nossa fé. Pedem respeito, mas não respeitam. Creio que Deus amanhã (nesta quinta) nos concederá a vitória”. 

Contraponto

Elmano explica, no entanto, que o projeto nada tem a ver com manifestações religiosas. “Nós temos um entendimento de que a Parada da Diversidade é, fundamentalmente, para afirmação da população LGBT e dos seus direitos. Ninguém na Assembleia defende que alguém deva fazer manifestação desrespeitando a fé do nosso povo”, frisa. 

O petista até tentou costurar um acordo, nas últimas semanas, para aprovar no mesmo dia que o seu projeto sobre a Parada pela Diversidade, um outro proibindo a ridicularização de crenças religiosas no Estado, na tentativa de conquistar apoio da bancada religiosa na Casa, mas não teve êxito. 

Outra proposta que causa polêmica, e está na pauta de votação desta quinta, na Assembleia, é o projeto de indicação da deputada Augusta Brito (PCdoB) para criação do Programa Estadual de Educação em Direitos Humanos nas escolas de ensino básico e médio do Estado, assim como nas universidades estaduais. 

Embora seja penas um projeto de indicação, ou seja, o governador pode acatá-lo ou não caso seja aprovado, a bancada religiosa critica um trecho da proposta que diz que o programa deve promover ações de incentivo a uma educação de qualidade com “valorização das diversidades”, incluindo os termos “de gênero e de orientação sexual”.

‘Restrições’

Relator do projeto na comissão de Educação, Apóstolo Luiz Henrique deu parecer favorável à matéria, com “restrições”, pedindo para que essas expressões sejam retiradas do texto. Ele alega que o novo Plano Nacional de Educação proíbe os termos. O deputado deve apresentar emendas de plenário para fazer essas mudanças. André Fernandes (PSL) também critica esses pontos e deve apresentar emendas. 

Para Augusta Brito, os deputados estão querendo colocar “coisas que não existem”. “Não tem nada a ver com educação sexual. A gente está colocando questões que devem ser discutidas em sala de aula, como o respeito, para que as pessoas consigam aceitar a diferença do outro, tanto na religião, como na sua orientação sexual. Nem sei que palavra posso atribuir a isso, acredito que vai de uma radicalidade”. 

O líder do Governo na Assembleia, deputado Júlio Cesar Filho (Cidadania), diz que não há nenhuma orientação do Governo Camilo Santana para a base aliada e que os deputados estarão liberados para votar os projetos como quiserem. “Isso não é assunto de Governo. Não vou encaminhar nem sim nem não. Vou votar conforme a minha ideologia, assim como a bancada deve fazer”, pontua. 

Patrimônio

Na Câmara Municipal, projeto de lei de autoria da vereadora Larissa Gaspar (PT) quer declarar o evento patrimônio imaterial de Fortaleza. A matéria tramita na Casa desde 2017, mas apenas agora deve ter parecer apreciado pela CCJ. Associações de direito da população LGBT estiveram na Câmara para conversar com  vereadores em busca de apoio.
‘Ideologia de gênero’
O vereador Jorge Pinheiro (DC), por sua vez, apresentou projeto de lei que pretende proibir o ensino do que chama de “ideologia de gênero” em escolas municipais da rede pública da Capital. O documento também pretende definir do que se trataria a chamada “ideologia de gênero”. A matéria será apreciada pela CCJ da Câmara.

Os destaques das últimas 24h resumidos em até 8 minutos de leitura.