Postagem da Secom critica Petra Costa por fala em entrevista nos Estados Unidos
As postagens desobedecem a artigo da Constituição Federal que trata sobre impessoalidade de órgãos do governo
A Secretaria de Comunicação da Presidência da República (Secom) fez uma publicação no Twitter, nesta segunda-feira (3), criticando a cineasta Petra Costa por "difamar a imagem" do Brasil com o seu documentário, "Democracia em Vertigem". O longa trata dos fatos que resultaram na chegada de Jair Bolsonaro à Presidência.
Em um vídeo postado em sua conta oficial, a Secom sustenta que a cineasta "assumiu o papel de ativista anti-Brasil" e questiona algumas declarações dela durante entrevista concedida no fim de semana a um canal estadunidense.
A peça, de quase três minutos, mostra a diretora afirmando que desde a chegada de Bolsonaro ao poder, em janeiro de 2019, aumentou o número de mortes em ações policiais no estado do Rio de Janeiro e que o presidente incentiva fazendeiros a invadir terras indígenas e queimar a floresta amazônica.
A Secom inseriu legendas para questionar vários destes argumentos.
Nos Estados Unidos, a cineasta Petra Costa assumiu o papel de militante anti-Brasil e está difamando a imagem do País no exterior. Mas estamos aqui para mostrar a realidade. Não acredite em ficção, acredite nos fatos. pic.twitter.com/NLnf8gA87c
— SecomVc (@secomvc) February 3, 2020
Em uma série de tuítes em português e inglês, a secretaria repetiu as críticas e acrescentou: "é incrível que uma cineasta possa criar uma narrativa cheia de mentiras e prognósticos absurdos a fim de denegrir uma nação só porque não aceita o resultado das eleições".
Na rede, foi apontada incoerência das postagens da pasta com artigo 37º do capítulo 7 da Constituição Federal, que fala sobre princípios de impessoalidade de órgãos do governo. Entre outros fatores, a regra dita normas de publicidade e propaganda realizadas com dinheiro público.
Inadmissível um canal oficial do governo federal atacar uma cineasta, cidadã brasileira, por ela divergir das posições políticas do Presidente da República. O uso do aparato do Estado para constranger e intimidar cidadãos é típico de ditaduras. Um completo absurdo! https://t.co/zfZ5yqQNgP
— Antonia Pellegrino (@apellegrino) February 4, 2020
Em seu artigo 37, a Constituição diz que todos os Poderes da União devem obedecer ao princípio da impessoalidade. Isso quer dizer que o aparato público não pode ser usado para atacar qualquer cidadão, como o feito agora com a cineasta Petra Costa com a conta de Twitter da Secom https://t.co/fPDD8ofzuM
— Caio Quero (@caioquero) February 4, 2020
Documentário
Pietra Costa, de 36 anos, disputa o Oscar de melhor documentário com "Democracia em Vertigem", uma produção da Netflix, na qual faz uma retrospectiva de um ponto de vista pessoal dos eventos recentes que marcaram a política brasileira.
A fita, de duas horas, narra a chegada da esquerda ao poder com Luiz Inácio Lula da Silva ao poder, em 2003, o impeachment de sua sucessora, Dilma Rousseff, em 2016, a prisão de Lula em 2018 por corrupção e a ascensão de Bolsonaro.
Pietra Costa tem uma longa carreira como documentarista. Seu filme de estreia, "Olhos de Resssaca" (2009), foi exibido no Moma de Nova York e ganhou, entre outros, o prêmio de melhor curta-metragem no London International Documentary Festival. Seguiram-no "Elena" (2012) e "O Olmo e a Gaivota" (2015), ambos igualmente premiados.
Na cerimônia do Oscar no próximo domingo (9), "Democracia em Vertigem" competirá com outros quatro indicados ("American Factory", "The Cave", "For Sama" e "Honeyland").