Bolsonaro reverte decisão do Congresso e põe demarcação de indígena na Agricultura

A medida provisória editada pelo presidente estabelece que a pasta fica responsável por ações como a reforma agrária e a regularização de terras indígenas e quilombolas

Escrito por FolhaPress ,
Legenda: No ínicio do ano, Bolsonaro já havia retirado a demarcação de terras indígenas da alçada da Funai e enviado para a Agricultura, mas a mudança havia sido revertida pelo Congresso
Foto: Foto: Isac Nóbrega/PR

O presidente Jair Bolsonaro (PSL) editou nesta quarta-feira (19) uma nova medida provisória que reverte decisão de maio do Congresso e devolve a tarefa de demarcação de terras indígenas no país ao Ministério da Agricultura.

Publicada no Diário Oficial, a nova MP, de número 886, assinada por Bolsonaro e pelos ministros Paulo Guedes (Economia) e Onyx Lorenzoni (Casa Civil), estabelece que constituem áreas de competência do Ministério da Agricultura a reforma agrária, a regularização fundiária de áreas rurais, a Amazônia Legal, as terras indígenas e as terras quilombolas.

Na sequência, o texto afirma que tais competências incluem "a identificação, o reconhecimento, a delimitação, a demarcação e a titulação das terras ocupadas pelos remanescentes das comunidades dos quilombos e das terras tradicionalmente ocupadas por indígenas".

Até o final do ano passado, 112 terras indígenas aguardavam estudos na Funai (Fundação Nacional do Índio) com o objetivo de demarcação e outras 42 já haviam sido identificadas e delimitadas, aguardando apenas a decisão do governo para sua demarcação, ou do Ministério da Justiça ou do Planalto.

Indígenas reivindicam outras cerca de 500 terras como de ocupação tradicional.

Na primeira medida provisória que editou no seu governo e que reestruturou a administração pública federal, em janeiro, a de número 870, Bolsonaro havia retirado a demarcação de terras indígenas da alçada da Funai e enviado para a Agricultura.

Foi a primeira vez na história moderna da política indigenista, desde a criação do antigo SPI (Serviço de Proteção ao Índio) em 1910, antecessor da Funai, que o serviço de demarcação foi retirado do órgão indigenista.

Com a nova MP desta quarta-feira, que também terá de ser avaliada por Câmara e Senado, Bolsonaro driblou a decisão do Congresso de maio, que fora comemorada como uma vitória por indígenas e pela Frente Parlamentar Indígena, coordenado pela deputada Joênia Wapichana (Rede-AP).

Pela votação de maio, a Funai, com todas as suas atribuições originais, havia voltado para a pasta da Justiça, hoje sob o comando do ministro Sergio Moro (Justiça). Ele já disse que não gostaria de ficar com a Funai sob seu comando, mas foi a decisão do Congresso.

Na época, a bancada ruralista no Parlamento chegou a emitir uma carta pública para dizer que iria reverter a decisão no plenário, mas acabou derrotada pelos parlamentares.

A devolução da demarcação para a Justiça não foi aceita pelos líderes ruralistas e pela bancada ruralista, que passaram a trabalhar pela volta do controle da atividade. Os ruralistas também atacaram o então presidente da Funai, o general Franklimberg Freitas, que, na semana passada, foi retirado do cargo após pressão de Nabhan Garcia, Secretário de Assuntos Fundiários do Ministério da Agricultura, segundo o próprio general relatou publicamente.

A nova MP repercutiu imediatamente mal entre indígenas e indigenistas na manhã desta quarta-feira.

"Persiste o conflito de interesses em subordinar direitos territoriais indígenas a ruralistas, mas, com a reedição da MP, a questão assume proporções de conflito entre os poderes da República, já que o Executivo ignora a decisão do Legislativo que devolveu a Funai ao Ministério da Justiça", afirmou Márcio Santilli, sócio-fundado do ISA (Instituto Socioambiental) e ex-presidente da Funai.

Durante e depois da campanha eleitoral do ano passado, Bolsonaro tem dito que, no que depender dele, não haverá mais demarcação "de nenhum centímetro" de terras indígenas no país.

Os processos de demarcação já estão praticamente paralisados desde o governo de Michel Temer.

Pela lei, Bolsonaro não pode editar duas MPs sobre o mesmo assunto na mesma legislatura do Congresso. Ocorre, porém, que a primeira MP rejeitada pelo Congresso foi editada em janeiro, quando a legislatura era outra. A posse dos novos parlamentares só ocorreu em fevereiro.

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