Ferramentas criadas por jovens podem fortalecer fiscalização de municípios do Ceará

Após realizar uma 'maratona hacker', o Tribunal de Contas do Estado (TCE) tem, à disposição, plataformas digitais que podem otimizar coleta e divulgação de dados úteis no combate à corrupção na gestão pública

Escrito por Alessandra Castro , alessandra.castro@svm.com.br
Legenda: O 1º Hackathon do TCE foi realizado na última semana, com participação de membros da sociedade civil que tinham como missão encontrar soluções de combate à corrupção por meio da inteligência colaborativa
Foto: Foto: TCE

Com o constante aumento do interesse da população sobre assuntos relacionados à gestão pública, impulsionado pelas novas tecnologias, órgãos do Ceará têm trabalhado para incentivar a participação popular na resolução de problemas que contribuam para melhorar a eficiência no poder público. No Tribunal de Contas do Estado (TCE), por exemplo, propostas desenvolvidas por jovens podem agregar ao trabalho de fiscalização de governos.

A Corte de Contas realizou, na última semana, uma competição, intitulada Hackathon, entre membros da sociedade civil para encontrar soluções de combate à corrupção por meio da inteligência colaborativa. Três equipes de jovens especialistas em tecnologia da informação (de um total de oito com 33 competidores), formadas em sua maioria por universitários e pesquisadores, foram premiadas. Elas desenvolveram plataformas online que otimizam a divulgação dos dados dos municípios cearenses, úteis para análise das prestações de contas das prefeituras.

Além de prêmio em dinheiro, de R$ 15 mil (1º lugar), R$10 mil (2º lugar) e R$ 5 mil (3º lugar), os desenvolvedores poderão colaborar com a implementação dos sistemas desenvolvidos no Tribunal. Com reduções de investimentos públicos para a Educação, a medida estimula jovens a se engajarem em pesquise e na gestão pública, pondera o presidente do TCE, conselheiro Valdomiro Távora.

"Nós pretendemos continuar desenvolvendo esse concurso, inclusive nesse ano. Talvez, a gente possa até aproveitar alguns desses jovens para trabalhar no Tribunal. Eles trouxeram demandas da sociedade, soluções para o Tribunal, ajudando no Controle Social, que é tão importante quanto o Controle Externo", afirma o conselheiro.

Ainda conforme o presidente, os sistemas desenvolvidos irão complementar os já em uso pelo órgão para melhorar a fiscalização, controle externo, governança e transparência - principalmente na análise de contas, essenciais para o combate à corrupção.

De acordo com o secretário de Controle Externo do TCE, Carlos Nascimento, as soluções poderão ajudar o Tribunal a diminuir a morosidade da análise das prestações de contas dos municípios cearenses. O Diário do Nordeste foi até os desenvolvedores para mostrar mais destas ideias.

'Baião de Dados' com vigilância online

Legenda: Cinco integrantes da 'Baião de Dados' desenvolveram a plataforma 'MacaShare'
Foto: Foto: TCE

Primeiro lugar na primeira edição do Hackathon, a equipe Baião de Dados, formada por pesquisadores e desenvolvedores do Laboratório Insight Data Science da Universidade Federal do Ceará (UFC), se destacou com a plataforma 'MacaShare' (junção da macaxeira tipicamente nordestina com a palavra "compartilhar", em inglês). A ferramenta web unifica todos os dados dos portais da transparência dos municípios do Ceará, com receitas e despesas discriminadas, em um único formato. Os dados são coletados diariamente, em tempo real e online.

Além disso, o sistema cria um ranking dos municípios com os melhores índices de transparência, baseado em critérios de disponibilização das informações - se elas são enviadas no prazo, se estão completas e com nota fiscal. Com base nesses critérios, as prefeituras recebem notas que variam de zero a dez, medidas por um espécie de termômetro.

Membro da equipe Baião de Dados, o mestre em Sistemas de Computação Valmiro Ribeiro, 27 anos, conta que um outro integrante da equipe tomou conhecimento da competição por meio das redes sociais. Por pesquisarem soluções em sistemas e computação, ele e outros colegas de pesquisa resolveram se inscrever.

Com o auxílio de programas de raspagem de dados, eles coletaram informações em portais da transparência e reuniram todas elas na 'MacaShare'. "Tinha município que informava uma despesa com um arquivo de foto, outro em texto. Isso dificulta o trabalho para encontrar informações, porque você tem que buscar tudo manualmente. O nosso programa identifica tudo isso e coloca no mesmo formato", detalha Valmiro.

'Graúna' emite alerta sobre contratos

Legenda: Equipe 'Graúna' criou ferramenta útil para identificar fraudes em contratos
Foto: Foto: TCE

Segunda colocada no Hackathon, a equipe Graúna, formada por pesquisadores de computação da Universidade Federal do Ceará (UFC), desenvolveu um programa chamado 'AuditaCE', responsável por identificar indícios de fraudes e irregularidades em contratos firmados pelas prefeituras para a contratação de serviço ou compra de produtos. Na ferramenta, é possível pesquisar qualquer tipo de contrato, por meio de palavras-chaves, município e data. Os resultados são mostrados em formato de lista, com a descrição do tipo de negócio, e emitem alerta, caso haja algum indício de irregularidade. O objetivo é facilitar o trabalho do agente público na identificação de fraudes, além de expor para a população.

Os sinais de alerta podem se intensificar de acordo com alguns critérios de avaliação, como: se o fornecedor é frequente contratado, localização da empresa, data de abertura da empresa, denúncias e reclamações, se o proprietário é financiador de campanha de um político.

O mestrando em Engenharia da Computação e integrante da equipe Graúna, Artur Rodrigues, 28 anos, explica que todas essas informações estariam disponíveis em um sistema web, que poderia ser incorporado ao site do TCE, por exemplo.

"É um sistema web, onde você pode filtrar a pesquisa com um intervalo de tempo, valores e o nome do município, palavras-chave. Ele lista todos os contratados firmados naquele período no município escolhido. Em um contrato, por exemplo, aparecem três empresas concorrendo. Com o nosso sistema, a gente percebeu que elas aparecem com frequência e uma sempre ganha. É algo que pode indicar conluio, por exemplo", esclarece.

'Digimon' de olho nas licitações

Legenda: Membros da equipe 'Digimon' desenvolveram um robô para monitorar licitações
Foto: Foto: TCE

O terceiro lugar ficou com a equipe Digimon, formada por universitários e pesquisadores em Computação de diferentes instituições de ensino. Eles se conheceram, inclusive, poucos dias antes do Hackathon do TCE, por meio de um amigo em comum, e resolveram se unir para a disputa. A equipe criou um robô virtual capaz de identificar indícios de fraudes em licitações por meio da comparação de preços. O 'ViniBot' faz uma análise dos valores do produto licitado, com variação de menor e maior preço dentro de um período pré-determinado, e envia os dados a técnicos do TCE por meio do aplicativo Telegram. As informações também podem ser enviadas para populares que desejarem receber o conteúdo.

O estudante de Engenharia da Computação Cezario Luiz, 19 anos, explica que a ideia de criar o robô veio após a equipe fazer uma pesquisa sobre o interesse popular em gastos com licitação.

O grupo percebeu que muitos dos que responderam tinham interesses nos gastos, mas reclamavam da dificuldade em acessá-los. O 'ViniBot', então, foi criado para solucionar o problema e enviar informações automaticamente. O objetivo era mostrar, por meio dos dados abertos, como o dinheiro público é gasto, e se o uso pelos gestores se dá de forma consciente.

"Tinha um contrato de compra de ar-condicionado (de uma prefeitura analisada) em que cada aparelho estava saindo a aproximadamente R$ 12 mil. O robô fez um pesquisa na internet e enviou no Telegram o preço daquele ar-condicionado em outros sites, e custava R$ 2 mil. Quando a licitação vem com um produto com preço muito caro, ele identifica que tem algo errado", ilustra.

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