Concessão de títulos de cidadão cearense causa polêmicas na AL

A Assembleia Legislativa só pode conceder, por ano, oito homenagens do tipo. Enquanto isso, parlamentares "enchem" a Casa de propostas desse gênero, muitas delas sem apontar relação significativa dos indicados com o Ceará

Escrito por Letícia Lima ,
Legenda: Na Assembleia, a proposta de concessão de título de cidadania deve ser feita através de projetos de lei subscritos, no mínimo, por dois terços dos membros do Legislativo
Foto: Foto: Isanelle Nascimento

O título de cidadão cearense é uma honraria nobre, tanto é que, de acordo com a Lei Estadual nº 12.510, de 1995, deve ser concedido a brasileiros ou estrangeiros com "relevantes" serviços prestados ao Estado. A homenagem, contudo, vem sendo banalizada e provocando polêmica na Assembleia Legislativa sobre os nomes escolhidos, que vão desde integrantes de movimentos sociais a ministros de Estado.

A comenda é uma prerrogativa dos deputados estaduais. Em 2019, pelo menos, 14 projetos de lei já foram protocolados pelos parlamentares na Assembleia propondo a concessão da comenda. Os parlamentares podem apresentar quantas propostas quiserem, mas o Legislativo só pode conceder oito homenagens desse tipo por ano.

Um projeto de lei, de autoria do deputado Heitor Férrer (SD), que começou a tramitar na semana passada, no entanto, quer limitar a prerrogativa. Ele determina que cada deputado tenha direito de apresentar apenas um projeto de concessão de título de cidadania na legislatura. Neste caso, de acordo com a proposta, a Assembleia poderá fazer até, no máximo, 12 homenagens anualmente.

O parlamentar expõe que, apesar da Lei, "em nenhuma das vezes", as propostas para concessão de título de cidadão cearense trazem uma justificativa significativa. Ele, portanto, propõe que o autor da proposta comprove, documentalmente, "os reais serviços" prestados ao Estado. Isso porque, na prática, em muitos casos, esse gesto é banalizado e alguns homenageados tem pouca relação com o Ceará.

Polêmicas

Recentemente, a deputada Silvana Oliveira (PL) apresentou projeto para conceder a cidadania cearense à ministra de Mulher, da Família e dos Direitos Humanos, Damares Alves. A proposta causa polêmica desde que a parlamentar começou a colher as assinaturas para a tramitação.

Silvana, que é uma das principais representantes da bancada evangélica da Assembleia, é próxima de Damares, pastora nascida no Paraná. Ao justificar a homenagem, a deputada argumenta que a ministra tem "contribuição decisiva a prestar nos pleitos que os cearenses encaminham ao Governo Bolsonaro". A autora da proposta ressalta, ainda, que a atuação política faz da ministra "uma cidadã do País e do Ceará".

Divergências

Parlamentares da base governista, porém, resistiram para assinar o projeto de lei de Silvana, principalmente a bancada do PDT, partido que faz oposição ao Governo Federal. Nos bastidores, pedetistas criticam declarações polêmicas de Damares, como as que envolveram questões de gênero, por exemplo.

Silvana só conseguiu recolher as 31 assinaturas necessárias para iniciar a tramitação da proposta depois que o deputado Elmano de Freitas (PT), da base aliada, decidiu apoiar a iniciativa. Aliás, é de Elmano outra proposta de cidadania cearense aprovada na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) que provocou conflitos até em outros partidos. O petista quer conceder o título de cidadão para o economista João Pedro Stédile, um dos fundadores do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST).

Na proposta, Elmano ressaltou o currículo de João Pedro, mas, em nenhum momento, citou serviços prestados por ele ao Ceará, que justifiquem a homenagem. Ao ser questionado, o deputado apontou que esse foi um erro da assessoria, mas defendeu os impactos do trabalho do integrante do MST para "a compreensão em torno da reforma agrária" no Estado.

"A renda do trabalhador era uma antes dele ser assentado ao MST e depois dele ter sido assentado", sustenta. O projeto de Elmano provocou brigas no PSL, após o deputado André Fernandes dar parecer favorável à concessão do título de cidadão cearense a Stédile na CCJ. Apoiadores mais radicais de movimentos de direita no Estado atacaram Fernandes por ter dado aval à homenagem.

Outros projetos de cidadania cearense em tramitação na Assembleia também chamam atenção. O deputado Bruno Pedrosa (PP), por exemplo, propõe conceder cidadania cearense a Manuel Augusto Meirinho Martins. Ele é português e professor do Instituto Superior de Ciências Sociais e Políticas da Universidade de Lisboa. Na justificativa, o autor cita apenas que Manuel contribuiu "diariamente para a formação de cidadãos cearenses".

Institucional

"Há uma parceria entre a Universidade de Lisboa e a Universidade do Parlamento. Ele é uma pessoa que tem contribuído bastante com cursos em Ciências Políticas, Políticas Públicas, muitos deputados cursam. Ao contrário de outras pessoas (homenageadas), ele tem serviços relevantes ao povo cearense", defendeu.

Já a deputada Patrícia Aguiar quer tornar cearense o secretário de Administração Penitenciária, Luís Mauro Albuquerque. Segundo ela, a atuação de Luís Mauro "mostra que seu trabalho à frente do sistema penitenciário cearense colhe bons frutos para toda a população".

Para conceder o título de cidadão cearense, as propostas devem ser aprovadas pela CCJ da Assembleia, que analisa o aspecto constitucional e o mérito da proposta. Se aprovadas, elas seguem para votação no Plenário 13 de Maio. Depois disso, cabe ao presidente do Legislativo Estadual decidir quais homenagens serão concedidas pela Casa.

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