Comissão aponta avanço nas negociações e volta a se reunir nesta sexta-feira

Interlocutor da categoria apresentou ao colegiado formado pelos três poderes, na manhã dessa quinta, uma lista de reivindicações. Uma contraproposta foi discutida em outro encontro e repassada aos policiais ainda na noite de quinta

Escrito por Alessandra Castro/Flávio Rovere e Luana Barros , alessandra.castro@svm.com.br
Legenda: Ontem, Ciopaer sobrevoou áreas em que o Exército atua na Capital. Ainda não há resposta sobre pedido de prorrogação da GLO
Foto: Foto: Kid Júnior

Após os policiais militares (PMs) apresentarem uma lista de reivindicações com 18 itens à comissão formada pelos três poderes (Executivo, Legislativo e Judiciário) para reabrir diálogo entre amotinados e o Governo do Estado, novas propostas para a categoria foram colocadas à mesa de negociação, nessa quinta-feira (27), durante reunião do colegiado com representantes dos PMs na sede do Ministério Público do Estado do Ceará (MPCE). Nesta sexta-feira (28), às 10h, integrantes da comissão e o interlocutor da categoria voltam a se encontrar para tentar avançar sobre um consenso entre as duas partes.

Na avaliação de integrantes do colegiado, as negociações, na quinta, “avançaram bastante”. Mediador do diálogo com a categoria, o presidente da Ordem dos Advogados do Brasil – Secção Ceará (OAB-CE), Erinaldo Dantas, disse estar otimista com as últimas tratativas. De acordo com ele, houve abertura para recebimento de propostas de ambos os lados. Dantas não descarta, inclusive, a possibilidade de o impasse com os policiais chegar ao fim ainda nesta sexta. 

“Tudo é possível. O que a gente conversou vai ser levado pelos representantes dos policiais, para que eles possam discutir e chegar a um acordo”, ressaltou. No entanto, o presidente da OAB-CE preferiu não divulgar o conteúdo das propostas apresentadas para não comprometer as negociações. “Se a gente fala antes deles apresentarem à tropa, pode colocar em risco a negociação”, ponderou. Apesar de reconhecer avanços, o advogado e coronel da reserva do Exército Walmir Medeiros, interlocutor da categoria, foi mais comedido. “Há a possibilidade e a esperança. Não vamos criar expectativas, mas tudo aponta nessa direção”.

Após reunião no MPCE, coronel Medeiros foi ao 18º Batalhão da Polícia Militar, no bairro Antônio Bezerra, na Capital, para apresentar os repasses do que foi discutido pela comissão aos policiais amotinados no local. Interlocutores da categoria informaram que a comissão se comprometeu a rever procedimentos administrativos instaurados contra policiais que aderiram à paralisação, assegurando que a intenção é não fazer uma “caça às bruxas”.

A viabilidade de implementar alas hospitalares para PMs e criação de um plano de habitação para os agentes também poderão ser avaliadas. Quanto à proposta salarial reivindicada pelos policiais, membros da classe disseram que, pela comissão, não há como aumentar a verba prevista para reajuste, apenas remanejar percentuais entre patentes. As reações da categoria à proposição serão informadas no encontro desta sexta.

Tanto coronel Medeiros como Erinaldo Dantas preferiram não informar se as propostas já tinham o aval do Estado. Todavia, elas foram apresentadas na noite dessa quinta, em uma segunda reunião do colegiado com os representantes, após os policiais amotinados divulgarem uma lista com suas reivindicações.

Segundo informações de bastidores, representantes dos PMs teriam sido chamados às pressas para a segunda reunião. Além de Erinaldo e coronel Medeiros, participaram o procurador-geral de Justiça (PGJ) do Ceará, Manuel Pinheiro; o procurador-geral do Estado, Juvêncio Viana; o deputado estadual Evandro Leitão (PDT); o desembargador Teodoro Silva Santos, do Tribunal de Justiça do Ceará (TJCE); os coronéis do Exército, Menezes Neto e Marcos Cesário, e os da Força Nacional, Aginaldo de Oliveira e Wilson Melo de Souza; o deputado Soldado Noélio (Pros); o vereador Sargento Reginauro (sem partido); e o cabo Paulo Monteiro.

Reivindicações

A lista com as reivindicações dos policiais foi apresentada pelo coronel Walmir Medeiros, na quinta, na primeira reunião com a comissão. Entre os itens, estão: anistia administrativa e criminal; reajuste salarial com garantia da aplicação da inflação de 2021 e 2022; equiparação do auxílio-alimentação dos militares aos dos demais servidores do Estado; regulamentação de escala de serviço; auxílio saúde; reajuste de diárias de pousadas e alimentação; plano habitacional, destinando casas construídas para programas habitacionais aos militares; isenção de ICMS para aquisição de armas; auxílio uniforme, entre outros.

O valor da correção salarial solicitada pelos policiais eleva em R$ 1,4 mil a remuneração atual (considerando salário-base mais gratificação fixa) de um soldado até 2022, por exemplo, passando de R$ 3,4 mil para R$ 4,9 mil.

A proposição do Governo do Estado enviada à Assembleia Legislativa, após acordo com associações, passa a remuneração inicial de um soldado de R$ 3,4 mil para R$ 4,5 mil até 2022. Apesar de estar na Casa Legislativa, deputados já afirmam que não vão votar a matéria enquanto não encerrarem os motins no Ceará. A expectativa é que a proximidade de um acordo com os policiais amotinados destrave a proposta.

Assembleia

Com o principal entrave ainda residindo em uma solução para a crise que esteja no meio do caminho entre a anistia, até então descartada pelo Governo, e sanções severas aos envolvidos, alguns parlamentares têm defendido uma estratégia menos punitivista por parte do Executivo. 

“Não adianta em nada você terminar esse movimento se você não tiver uma boa vontade da tropa nos dias seguintes, então é importante que esse movimento acabe e que a tropa se sinta motivada. Esse processo de se colocar muito em cima a coisa da punição talvez não seja o melhor caminho”, ponderou o deputado Carlos Felipe (PCdoB), que defende medidas para “transgressões graves” cometidas pelos PMs. 

Na sessão, Delegado Cavalcante (PSL) cobrou uma solução para o impasse por meio de discussões não só sobre reestruturação salarial, mas também sobre a própria atividade policial, chegando a sugerir a federalização das polícias militares. Chamou mais atenção, porém, o abrandamento do discurso duro que costuma ter contra transgressores da lei, quando o assunto são os policiais punidos pelo Estado. “Estão marginalizando um bocado de criança, de 18, 19 anos, a 25 anos. Prendendo arbitrariamente, sem dar direito a defesa. Estão crucificando alguns para intimidar o resto da tropa”. 

Para o líder do Governo, Júlio César Filho (Cidadania), quem não pode ficar sem punição diante do cenário que se instaurou são personagens que, segundo ele, têm tentado se aproveitar politicamente da crise. Referiu-se, sem citar nome, ao ex-deputado federal Cabo Sabino. 

“Isso é um crime muito perigoso. Primeiro, dizer que o Ministério Público não vale nada, que se fechar uma associação, abrem dez, em um áudio que circulou desse cidadão, ex-deputado. Depois, querer intimidar, através dessas declarações veiculadas na imprensa nacional, que os arrastões, os assaltos, vão ser de forma incalculável agora depois do Carnaval”, criticou. 

Câmara

Sem grandes projetos a serem analisados na Câmara Municipal de Fortaleza, a crise de Segurança também mobilizou, novamente, vereadores a usarem a tribuna. Nas falas de alguns, foi recorrente o relato sobre o medo das populações em diversos bairros. 

“A população está sendo penalizada, está apavorada”, ressaltou o vereador Carlos Dutra (PDT). “Fortaleza está um clima de pavor, com medo. No Conjunto Ceará, as pessoas não podiam sair de casa, porque a cada esquina era um assalto”, completou Emanuel Acrízio (PRP). 

Com movimentos de diálogo se consolidando, parlamentares consideram que começa a ser possível ter esperança de que a crise chegue ao fim. Porém, enquanto as paralisações prosseguem, o vereador Adail Júnior (PDT) aponta que o Legislativo Municipal está “de mãos atadas”. 

“Queríamos poder fazer algo, mas ficamos um pouco sem ter o que fazer, porque não cabe ao Legislativo nem mesmo Estadual”, afirmou o parlamentar. “Cabe muito ao Executivo Estadual e ao comando (da categoria) resolver isso”, acrescentou.
Para Márcio Martins (Pros), os vereadores devem se posicionar para influenciar os grupos políticos dos quais fazem parte a chegarem a um consenso. “Essa decisão é política. Os vereadores que são aliados do grupo político do governador podem somar nessa hora, assim como nós que somos de oposição podemos contribuir”, afirmou. 

Sem definição

O presidente Jair Bolsonaro (sem partido) afirmou, na quinta, durante live em rede social, esperar que o Governo do Ceará arranje uma solução para os motins dos policiais militares. “A gente espera que o Governo resolva o problema e bote um ponto final nessa questão”, ressaltou, ao pedir que o governador Camilo Santana negocie com os PMs, o que já está ocorrendo.

Operação GLO

Até o momento, o presidente ainda não deu uma resposta sobre o pedido de prorrogação do decreto de Garantia da Lei e da Ordem (GLO) no Estado, feito por Camilo Santana na última quarta-feira (26). A validade da medida, que autoriza a atuação das Forças Armadas na Segurança Pública do Ceará, está prevista para seencerrar nesta sexta (28).

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