Com disputas internas, oposição busca unidade contra reforma

Os partidos montaram um grupo que se reúne, semanalmente, para traçar estratégias que adiem a votação da PEC que modifica o sistema de aposentadorias do País, mas, para além desta batalha política, legendas como PT e PDT agem com independência e escancaram divergências entre si

Escrito por Letícia Lima ,
Legenda: Líderes do PT, PDT, PCdoB, PSB, Psol e Rede divulgaram nota contra a reforma na última terça
Foto: Foto: Lula Marques/PT na Câmara

Se de um lado o Governo Bolsonaro tem dificuldade de organizar uma base aliada na Câmara dos Deputados, de outro, a oposição tenta estar unida com o propósito de barrar a tramitação da reforma da Previdência. Até então, partidos como PDT, PT, PCdoB, PSB, Psol e Rede atuavam isolados no Congresso. Nos bastidores da mobilização, porém, algumas siglas disputam o protagonismo e expõem divergências internas. Isso, para cientistas políticos entrevistados pelo Diário do Nordeste, mina as chances de opositores apresentarem um projeto alternativo.

As siglas da bancada de oposição reúnem mais de 130 deputados federais na Câmara. Eles são minoria em meio aos 513 parlamentares, mas, juntos, prometem dar dor de cabeça ao Governo Bolsonaro, que não tem uma base consolidada e precisa arregimentar, no mínimo, 308 votos para aprovar a Proposta de Emenda Constitucional (PEC) da Previdência. Contrárias a vários pontos do projeto, lideranças formaram um grupo para articular estratégias que adiem a votação.

Nas últimas semanas, presidentes, líderes e vice-líderes de PDT, PT, PCdoB, PSB, Psol e Rede intensificaram as tratativas dentro e fora do Congresso Nacional. Segundo o deputado Orlando Silva (PCdoB-SP), a tendência é que cada partido feche questão contra a proposta de mudança nas regras previdenciárias. Até agora, PT e PDT foram os únicos que orientaram as bancadas a votarem contra.

Críticas

"Estamos buscando uma ação parlamentar da oposição, alinhando a estratégia com relação à reforma", afirma ele, ao completar: "neste momento, a reforma é a nossa principal batalha política. O Governo é tão desorganizado que, inclusive, ocupa espaço com a participação da oposição de tanta trapalhada".

Na última terça-feira (26), o ministro da Economia, Paulo Guedes, era esperado na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara, mas não compareceu. A oposição protestou, e o ministro deve ir ao colegiado, amanhã (3), para discutir a reforma. Na última quarta (27), após mal-estar gerado pela ausência, Guedes esteve na CCJ do Senado, para também tratar da proposta.

A aposentadoria rural e o Benefício de Prestação Continuada (BPC) são os pontos mais criticados da reforma pelos partidos. Pela proposta, trabalhadores rurais, homens ou mulheres, se aposentarão com 60 anos, e o tempo de contribuição mínima passa de 15 para 20 anos. Quanto ao benefício pago a idosos pobres e a pessoas com deficiência, o Governo propõe o pagamento de um valor menor - R$ 400 -, a partir dos 60 anos.

Após ato na semana passada, partidos políticos de oposição divulgaram uma nota criticando políticas do Governo Bolsonaro. Um dos eixos acordados pelos partidos trata "da defesa dos direitos sociais contra o desmonte que se pretende fazer, sobretudo com a reforma". O documento, assinado por PT, PDT, PCdoB, PSB, PSOL e Rede, diz que as siglas atuarão "pela rejeição da PEC nº 6/2019 desde o primeiro estágio de sua tramitação", na CCJ da Câmara.

Divergências

Apesar da "tropa de choque" formada pela oposição contra a Previdência, alguns partidos, porém, escancaram divergências internas e disputam, nos bastidores, protagonismo no cenário político. Basta ver os ataques públicos entre lideranças do PT e do PDT. A relação entre os dois partidos, até então aliados históricos no campo de centro-esquerda, ficou abalada durante a eleição presidencial de 2018, em que estiveram em lados opostos da disputa.

No início deste mês, em visita a Fortaleza, o deputado federal Paulo Pimenta, líder da sigla petista na Câmara, alfinetou o ex-ministro Ciro Gomes, que foi candidato à Presidência da República pelo PDT, ao comentar a ausência do cearense na campanha de Fernando Haddad, candidato derrotado pelo presidente Jair Bolsonaro, no segundo turno do pleito. "O PT não é daqueles que, na hora da dificuldade, no momento em que o País mais precisa, fogem da luta e vão passear em Paris. A gente conhece os parentes na hora de dividir a herança".

Na semana seguinte, durante evento na Assembleia Legislativa, Ciro Gomes rebateu e disse que não faz campanha para "marginais". "Esse lado bandido do PT tem que entender que saí do País no segundo turno para não ter que explicar por que eu não faço mais campanha para os marginais do PT. Os marginais do PT não são o PT, o PT é um partido importante, a maioria é gente boa", ponderou.

Independentes

O ex-ministro negou que o PDT queira liderar as forças do campo de centro-esquerda, notadamente, as de oposição ao Governo Bolsonaro, mas avisou: "Ou o PT muda essa direção ou vamos enfrentá-lo". O deputado federal cearense André Figueiredo, líder da sigla pedetista na Câmara, faz questão de dizer que o partido tem uma estratégia de atuação na Câmara diferente do PT. "Estamos trabalhando na perspectiva de que, para toda proposta que venha do Poder Executivo, o PDT lance uma contraproposta".

O deputado Orlando Silva, do PCdoB, explica que os partidos de oposição estão alinhados em marcar posição contrária à reforma, mas ressalta que as legendas atuam de forma independente. "O que temos é uma articulação política entre as oposições e as minorias para a gente se alinhar contra a reforma".

Para o cientista político Marco Antônio Carvalho, professor da Faculdade Getúlio Vargas (FGV), a oposição ao Governo Federal ainda não está coesa e precisa apresentar uma agenda. "O Governo tem mais problema pelo Governo do que pela própria oposição. A oposição precisa ter uma plataforma, não basta ser contra a reforma, tem que ser mais propositiva, mostrar o que faria de diferente do Governo", argumenta. "A oposição retórica está sem espaço", completa o analista.

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