Cearenses duelam com projetos sobre anistia a PMs no Congresso

Após o fim da paralisação de militares no Estado, o deputado federal Capitão Wagner (Pros) e o senador Prisco Bezerra (PDT) apresentaram propostas divrgentes quanto ao tema na Câmara e no Senado, respectivamente

Escrito por Letícia Lima , leticia.lima@svm.com.br
Legenda: Emenda à Constituição do Estado que veta anistia foi aprovada nesta semana na AL
Foto: Foto: José Leomar

Mesmo após o fim da paralisação de policiais, a crise da Segurança Pública no Ceará ainda repercute no meio político local e nacional. Parlamentares cearenses duelam no Congresso Nacional em torno de projetos de lei sobre a concessão de anistia a militares envolvidos em paralisações. O debate em âmbito nacional veio à tona após a Assembleia Legislativa aprovar, no início desta semana, uma Proposta de Emenda à Constituição (PEC) do Estado, proibindo o perdão das infrações em caso de motim. 

A mudança na Constituição estadual representa um marco, uma vez que os futuros governadores cearenses estarão proibidos de conceder anistia a policiais militares que fizerem paralisação, revolta ou motim. A PEC foi enviada pelo governador Camilo Santana (PT) ao Legislativo na última semana, em reação à reivindicação de anistia geral de policiais para encerrar o motim no Estado. 

A proposta foi aprovada por ampla maioria dos votos: 34 a favor e dois contra, além de uma abstenção. Em entrevista à Globonews na noite da última quarta-feira (4), o governador Camilo Santana (PT) defendeu que o Congresso Nacional puxe esse debate e vote uma lei de repercussão geral para todos os estados do País relacionada à anistia. 

Emendas

Sobre a PEC aprovada no Ceará, Camilo destacou ainda uma das duas emendas de parlamentares incorporadas à proposta, que veda a Assembleia de discutir benefícios salariais para os militares durante período de até seis meses em caso de paralisação. Tal alteração no texto foi apresentada pelo deputado Guilherme Landim (PDT). 

Para o governador, a paralisação no Ceará foi mais política do que salarial. Ele criticou o que chamou de “partidarização da Polícia”. “Desde que foi permitido que policiais pudessem se filiar a partidos políticos, se candidatar estando em cargo, como civil, começou a se criar um problema dentro das polícias, tanto que as lideranças desse movimento (no Ceará) todos são parlamentares”, disse. 

Sem indicar nomes, Camilo Santana citou o envolvimento de um deputado federal, um deputado estadual, um vereador de Fortaleza e outro de Sobral no movimento. O chefe do Executivo Estadual disse ainda que havia um mandado de prisão em aberto contra o ex-deputado federal Cabo Sabino (Avante), uma das lideranças do motim, e afirmou que ele estaria “foragido”. 

Reações

“Havia uma disputa dos próprios líderes políticos dentro do movimento por espaço. Um dos grandes líderes foi um ex-deputado federal que perdeu as últimas eleições, foi quem mais insuflou esse movimento, inclusive hoje está com mandado de prisão decretado e está fugitivo. Estamos atrás dele e não conseguimos encontrar”, sustentou. 

Na tarde de ontem, após a declaração de Camilo, Cabo Sabino se apresentou ao juízo da Vara de Auditoria Militar, em Fortaleza. Ele tinha um mandado de prisão em aberto e resolveu ir espontaneamente ao Poder Judiciário. Sabino passou por uma audiência de custódia, na presença do Ministério Público do Estado do Ceará, e o juiz Roberto Soares Bulcão Coutinho revogou o mandado de prisão contra o ex-parlamentar. A justificativa foi que, após o fim do motim dos policiais, não havia mais perigo à ordem pública.

Nas redes sociais, o governador disse estar “indignado” com a decisão judicial. “Inaceitável que alguém promova todo tipo de desordem, cometa crimes, desafie a própria Justiça, Ministério Público, Governo e sociedade, e seja mandado para casa, como se nada tivesse ocorrido. Esse acusado terá que responder pelos seus gravíssimos atos, pelo bem do Estado de Direito”, disse.

Anistia 

Enquanto isso, em oposição à PEC do Governo do Estado aprovada na Assembleia, o deputado federal cearense Capitão Wagner (Pros) apresentou na Câmara dos Deputados um projeto de lei (nº 477/2020), para conceder anistia a policiais e bombeiros militares do Ceará que participaram de manifestações a partir de outubro de 2019 até março de 2020. 

Ao justificar a proposta, o parlamentar diz que o governo cearense teve “claro propósito político” de impedir manifestações de militares. Wagner sustenta que houve “injustiça” com a categoria que participou de um movimento reivindicatório de reajuste salarial e melhores condições de trabalho. 

O projeto de Capitão Wagner aguarda despacho do presidente da Câmara, o deputado Rodrigo Maia (DEM-RJ), para começar a ser analisado. Para se contrapor a esta proposta, o senador cearense Prisco Bezerra (PDT) apresentou também nesta semana um projeto de lei (nº 524/2020) proibindo anistia a policiais, bombeiros e militares das Forças Armadas militares que participarem de motim. Bezerra é suplente em exercício do senador licenciado Cid Gomes (PDT), baleado em Sobral nos dias de paralisação.

O parlamentar do PDT expõe que o objetivo do projeto é impedir que a anistia seja utilizada como forma de assegurar a impunidade de agentes do Estado que “atuam não apenas à margem da lei, como muitas vezes buscam transformar o Governo e os cidadãos em reféns”. 

Segundo Prisco Bezerra, a possibilidade de greve de militares não é vedada “gratuitamente”, mas sim porque ela é totalmente incompatível com a hierarquia e a disciplina que caracterizam a atividade. Para o senador, impõe-se, então, pôr um fim aos atos de anistia editados nos últimos anos. “E que, na prática, incentivam que homens e mulheres armados, que deveriam estar na defesa da sociedade, a ameacem gravemente”, finalizou. 

No Ceará, embora o governador não tenha concedido a anistia, o acordo entre a comissão de membros dos três poderes do Estado e representantes dos militares assegura que os profissionais alvos de processos administrativos e criminais terão amplo direito à defesa. Além disso, uma comissão permanente será criada com instituições do Estado para acompanhar os processos. 

Assembleia

Na esteira da discussões sobre Segurança Pública, o Governo do Estado também encaminhou para votação na Assembleia Legislativa outra PEC, que cria a Polícia Penal. A partir dessa proposta, os agentes penitenciários do Ceará ganharão status de policiais e terão as mesmas competências da Polícia Militar e da Polícia Civil, por exemplo. 

A PEC foi protocolada na Casa no último dia 19 de fevereiro, antes do início da paralisação dos militares no Ceará, e ainda não começou a tramitar. Ainda não há prazo previsto, no entanto, para o texto ser lido em plenário. 

Proposta semelhante já foi aprovada pelo Congresso Nacional no ano passado. Ela transformou os agentes penitenciários vinculados à União em policiais penais federais e foram incluídos no artigo 144 da Constituição Federal ao lado de policiais militares, federais, civis, rodoviários e também ferroviários. A PEC aprovada no Congresso prevê que os novos policiais penais façam a segurança dos estabelecimentos penais e realizem também a escolta e custódia dos presos. 

Ministério Público

O procurador geral de Justiça, Manuel Pinheiro, diz que todos os que participaram do motim de policiais militares no Ceará cometeram “crime militar”. Em entrevista ao portal Uol, ele afirma que não se refere a tratar policiais como bandidos, “mas todas as pessoas que participaram desse motim cometeram crimes. Crimes militares”

Assembleia 

O deputado estadual Queiroz Filho (PDT) esteve em Brasília para apoiar o projeto do senador Prisco Bezerra (PDT). “Enquanto alguns se aproveitam politicamente da situação e passam pano para fora da lei, outros estão preocupados em 
valorizar o trabalho sério da Polícia Militar, em apoiar aqueles cidadãos de bem que atuam em prol da sociedade”, declarou

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