Tragédia de Brumadinho faz 1 ano e segue com 11 desaparecidos

Após um ano do desastre ambiental, investigação sobre a ruptura da barragem ainda está inconclusa, apesar de sanções contra a Vale. Bombeiros cearenses mobilizados em resgates na cidade mineira lembram os desafios das buscas

Escrito por Alessandra Castro , alessandra.castro@svm.com.br
Legenda: A ruptura da barragem da Vale em Brumadinho destruiu vidas, fauna, flora e poluiu mananciais
Foto: Foto: AFP

Seis membros do Corpo de Bombeiros Militar do Estado do Ceará, acompanhados de quatro cães farejadores, participaram das operações de buscas por desaparecidos na tragédia da ruptura de uma barragem da mineradora Vale em Brumadinho (MG), que completa hoje um ano, ainda sem a conclusão das investigações e com 11 pessoas ainda desaparecidas. Ouvidos pela reportagem, dois bombeiros lembraram os desafios da missão de resgate, em meio à tristeza e ao desalento da comunidade.

“O clima na cidade ainda é de muita tristeza. Eles estão tentando seguir a vida. Mas sempre que você vai a algum lugar, como um restaurante, você encontra um parente de uma vítima da tragédia. É uma sensação de impunidade”, conta o tenente Eliomar, da equipe de resgate com cães do Corpo de Bombeiros cearense, que participou da missão.

Ele foi ao Município mineiro com dois companheiros e dois cachorros ajudar nos resgate dos corpos, em agosto de 2019. Outras equipes foram novamente em setembro e outubro, com mais dois cães.

Legenda: Tenente Elioma,subtenente J. Maria e soldado Gomes com os cães Uno e Anne do Corpo de Bombeiros do Ceará
Foto: Foto: Arquivo pessoal

Segundo o tenente, o clima quente do Ceará foi essencial para os cães desempenharem um melhor trabalho em Brumadinho. “Lá, estava muito quente, e os cães do Nordeste se adaptaram bem. Nossos cães encontraram muitos segmentos. Chegaram, inclusive, a encontrar um corpo inteiro. Quando ele foi encontrado, a família nos agradeceu, mesmo ainda estando triste. Eles esperam muito por isso para amenizar a dor”, recordou o militar.

O subtenente J. Maria, que também fez parte da equipe de resgate, ressaltou a importância de ter atuado em Brumadinho. “A gente, como bombeiro, também se comoveu com o que aconteceu. Todos nós queríamos estar lá ajudando. Além disso, ainda tem o aprendizado para a gente, como experiência para a nossa profissão”, destacou.

Ele explica que os cachorros que acompanharam a equipe cearense de bombeiros em Brumadinho são os mesmos utilizados para encontrar as vítimas do Edifício Andrea, que desabou no dia 15 de outubro em Fortaleza, onde nove pessoas morreram e sete foram resgatadas com vida dos escombros.

“Nós fomos a última equipe com cães a trabalhar lá (em Brumadinho). E isso acabou ajudando a gente nos trabalhos do Edifício Andrea. Os cães participaram”, relatou.

Em Brumadinho, há ainda cerca de 10 km de rejeito de minério em estado sólido, com vários metros de profundidade, segundo Eliomar.

Essa situação tem preocupado os bombeiros da região, por conta da proximidade do período chuvoso, que pode espalhar mais ainda os rejeitos.

As duas equipes da Companhia de Busca e Regaste com Cães do Corpo de Bombeiros do Ceará ajudaram nas buscas durante três meses (agosto a outubro), com revezamento. A primeira foi em agosto-setembro e era formado pelo tenente Eliomar, subtenente J Maria e soldado Gomes, além dos cachorros Uno (pastor-belga malinois) e Anne (labrador). O outro grupo foi em setembro-outubro, e era formado pelo sargento Charles, cabo Argeu, cabo Romening e os cachorros Athos (pastor-belga malinois) e Sutão (labrador). 

Denúncia

Por volta das 13h30 do dia 25 de janeiro de 2019, a barragem B1 da Mina Córrego do Feijão, operada pela Vale S.A na cidade, rompeu na zona rural, espalhando toneladas de rejeitos de minério de ferro pela região e deixando 259 mortos e 11 pessoas desaparecidas. Até hoje, a “lama contaminada” não foi completamente retirada dos locais atingidos. 

No último dia 16, o Ministério Público de Minas Gerais apresentou denúncia contra a Vale, a empresa de consultoria Tüv Sud e outras 16 pessoas por homicídio qualificado e crimes ambientais.

Na denúncia, O MPMG diz que a Vale e a Tüv Sud emitiram falsas declarações de condições de estabilidade de, pelo menos, 10 barragens espalhadas pelo País. Dentre elas, estava B1, que rompeu em Brumadinho. Alguns dos executivos e engenheiros (13, ao todo) das duas empresas chegaram a ser presos entre janeiro e fevereiro, durante investigação sobre as causas do rompimento da barragem, mas foram soltos logo depois. 

Após o acidente, a Justiça mineira provisionou R$ 24,1 bilhões da Vale para o pagamento de indenizações de familiares de vítimas e de pessoas afetadas pela tragédia. 

Além disso, a Advocacia-Geral da União informou que R$ 13,8 milhões foram pagos pela empresa em indenizações ao Governo Federal, pelo gastos com operações em Brumadinho. A empresa também realiza uma investigação interna, prevista para ser concluída neste mês. 

A apuração sobre o caso já dura um ano. Para os afetados pela tragédia, fica a sensação de impunidade.

Além das vidas perdidas, o rompimento da barragem destruiu casas, fauna e a flora da região, poluindo o rio Paraopeba e outros mananciais. [TEXTO1]O dano ambiental é incalculável. Um dos piores desastres do mundo e, principalmente, do Brasil, segundo a Organização das Nações Unidas. 

Em impactos ambientais para o País, o rompimento da barragem em Brumadinho só não supera a tragédia de Mariana, em Minas Gerais, que ocorreu em 2015, também envolvendo a mineradora Vale. 

Em Brumadinho, o principal rio prejudicado pelo desastre foi o Paraopeba, um dos afluentes do Rio São Francisco, que banha o Nordeste. 

Desde o rompimento, um estudo tem sido feito nas águas dos rios atingidos e no solo da região, para monitorar o nível de contaminação. No último dia 20 deste mês, a Vale publicou um balanço das ações para a reparação de Brumadinho, que tentam amenizar os impactos da tragédia.

Reparações

Segundo a Vale, R$ 5,5 bilhões foram aplicados em duas estações de tratamento de água construídas na região; R$ 2,8 bilhões foram gastos com o pagamento de indenizações e auxílios emergenciais; R$ 70 milhões foram doados às Forças de Segurança mineiras para ajudar nas buscas dos corpos das vítimas desaparecidas e demais ações; R$ 32 milhões para atendimentos de saúde na cidade; 28 estruturas foram montadas para o retirar os sedimentos que ainda estão na região; entre outras.

Ato em Fortaleza por Brumadinho

Grupos religiosos e movimentos de trabalhadores realizam, hoje, na Praia de Iracema, um protesto pela preservação do meio ambiente e para cobrar punições sobre a tragédia de Brumadinho. Eles também pedem investimentos e obras de infraestrutura em comunidades da Praia do Futuro.

Cães que ajudaram no resgate se aposentaram

Dois dos quatro cães da equipe cearense que ajudaram nas buscas em Brumadinho se aposentaram. São eles: os pastores-belgas Uno e Athos, com 8 e 9 anos respectivamente. Eles também atuaram na buscas do desabamento do Edifício Andrea, que duraram sete dias – a contar do dia 25 de outubro de 2019.