Unesp expulsa 27 estudantes por fraude no sistema de cotas raciais

O grupo será notificado e deixará oficialmente o quadro discente da instituição nesta sexta-feira (14); eles também ficarão proibidos de participar dos vestibulares da instituição pelos próximos cinco anos

Escrito por FolhaPress ,

A Unesp (Universidade Estadual Paulista) anunciou na quinta-feira (13) o desligamento de 27 alunos que faziam uso de cotas raciais por se autodeclararem negros e pardos, mas que não atendiam os requisitos previstos em lei.

A relação dos alunos será publicada no Diário Oficial desta sexta-feira (14), data quando o grupo será notificado e deixará oficialmente o quadro discente da instituição. Eles estarão proibidos de participar dos vestibulares para ingresso na Unesp pelos próximos cinco anos e poderão ter dificuldades para aproveitar o que já cursaram em outra instituição.

Esta foi a primeira vez que alunos são expulsos da Unesp por fraude no sistema de cotas, mas novos desligamentos estão previstos para os próximos meses. A instituição implementou uma comissão permanente para analisar denúncias e apurar suspeitas de irregularidades no processo de ingresso por cotas.

A instituição aceita alunos cotistas desde 2014, quando passou a reservar 50% das matrículas anuais para alunos oriundos da escola pública. Desse total, 35% destinam-se a pretos, pardos e indígenas.

De acordo com o professor de jornalismo e presidente da comissão da central de verificação das autodeclarações da Unesp, Juarez Xavier, a instituição precisou de tempo para se organizar e agir contra esse tipo de irregularidade. 

Ele diz que várias etapas foram estabelecidas para que os casos tenham uma resolução eficiente. A ideia, segundo ele, é que em pouco tempo se tenha a garantia de que apenas os alunos com o devido direito ingressem na universidade por meio das cotas raciais.

Ele conta que, após uma série de denúncias e questionamentos, uma comissão provisória foi montada no final de 2016 para apurar o caso. Apesar de mudanças administrativas que ocorreram ao longo desse período, o trabalho da comissão foi mantido e avançou.

O professor explica que ocorreram ações coordenadas para a verificação de inconsistências nas autodeclarações. Os alunos sob suspeita de fraude foram chamados para entrevistas tanto no próprio campus onde estudavam quanto na comissão geral da universidade. Eles puderam justificar-se verbalmente na entrevista e também apresentar um recurso para defesa sobre o que os motivaram a fazer uso da cota no vestibular. 

"A comissão convida o aluno para entrevista e o informa que a universidade tem dúvida quanto sua autodeclaração. Se ele tem a pele escura, não tem do que duvidar, mas ao contrário pode considerar válida ou inválida", disse.

Segundo Xavier, o que pode ter gerado confusão na interpretação é que a cota para pretos e pardos leva em consideração o fenótipo da pessoa, que representa as características da raça que incluem cor da pele, traços do rosto, textura do cabelo. No entanto, muitas pessoas que se autodeclararam como preto e pardo alegaram que o fizeram devido a miscigenação da população brasileira ou por terem ascendentes com tais características.

"Nós recebemos o apoio de consultores jurídicos e levamos dois anos para chegar na fase que estamos agora. Utilizamos como referência a legislação das universidades federais, normas de concursos públicos, a votação do Supremo sobre a legalidade das cotas e até um documento do conselho federal do Ministério Público. A partir disso fizemos as instruções normativas e avaliamos caso a caso", explicou.

Além dos 27 alunos desligados nesta decisão, outros 20 casos também já estão em andamento com características semelhantes e que devem ter o mesmo fim, a expulsão.

Os nomes dos envolvidos e o que eles estavam cursando ainda não foram divulgados.

Sobre a ação dos alunos que serão expulsos, Juarez Xavier diz que prefere não tratar como fraude. "Houve uma interpretação equivocada sobre o critério de pardo. Apesar disso, essa ação causou um problema irreparável para aqueles candidatos que teriam o direito de fato às vagas."

A Unesp tem 34 unidades em 24 cidades. As análises dos cotistas ocorrem em toda a instituição e cursos. Também não faz diferença se o aluno que descumpriu os critérios da autodeclaração esteja no primeiro ou no último semestre do curso de graduação. As penalidades serão as mesmas, incluindo o desligamento.

"Quando eles optaram pela cota causaram prejuízos concretos que não temos como remediar. Os alunos que perderam esse processo em anos anteriores não temos mais como chamá-los", disse o professor.

Frei David Santos, diretor executivo da ONG Educafro, considerou um avanço a ação da Unesp em relação aos alunos que usaram indevidamente as cotas raciais. "As cotas foram criadas para as pessoas fenotipicamente negra, que são as que sofrem com o preconceito. Quem é genotipicamente negro não tem direito a esse benefício", explicou.

Segundo Frei Santos, há cerca de dois anos a Educafro remeteu à Unesp um ofício com informações sobre fraudes entre os cotistas e pediu providências. A organização chegou a iniciar um pedido de providências ao Ministério Público, mas não deu prosseguimento quando obtiveram o compromisso da reitoria de que providências seriam tomadas.

"Nos reunimos com o reitor para mostrar provas contundentes de que haviam alunos usando as cotas de forma irregular. Ele mostrou disposição em agir, por isso confiamos que as medidas seriam adotadas", afirmou.

Para o frei franciscano, o desligamento dos 27 alunos é o início de uma ação bem maior que pode corrigir injustiças que ocorreram.

"Fomos atendidos nessa primeira ação, mas vamos lutar por outras duas causas. As pessoas que fraudaram as cotas precisam ser presas e processadas, e a Unesp precisa lançar um novo edital para oferecer de imediato as vagas que estavam ocupadas com uso de fraudes. É responsabilidade deles fazer com que as pessoas verdadeiras ocupem seus lugares agora", disse.

Frei David diz que a expectativa sobre o tema é positiva. Ele afirma que há muita burocracia e, assim como na Unesp, o grupo entrou com pedidos similares em outras universidades públicas, que ainda não se posicionaram.

Segundo explicou, a maior parte das irregularidades costuma ser apontada pelos próprios estudantes das instituições. "Quem nos ajuda a identificar as fraudes são estudantes, tantos os alunos brancos honestos, quanto os negros que se sentem lesados por essas irregularidades.