Morte de músico em operação militar no Rio de Janeiro gera comoção e repúdio

Exército decretou a prisão de 10 militares; a ONG Rio de Paz pede rigor na investigação dos fatos

Escrito por Redação ,
Legenda: Luciana dos Santos Nogueira, mulher de Edvaldo dos Santos Rosa,comparece ao Instituto Médico Legal (IML) para liberar o corpo
Foto: Tânia Rêgo/Agência Brasi

O Exército decretou, nesta segunda, a prisão de 10 militares que, na véspera, dispararam mais de 80 tiros contra um veículo no bairro de Guadalupe, na zona norte do Rio de Janeiro, matando o motorista e ferindo duas pessoas. Evaldo dos Santos Rosa, de 51 anos, que era segurança de uma creche e músico em um grupo de pagode, dirigia o carro fuzilado pelos militares e no qual também estavam sua esposa, o filho de 7 anos, a afilhada do casal, de 13, e o sogro dele – baleado nos glúteos e que está internado em um hospital. Um pedestre que tentou ajudar as vítimas também foi atingido pelos tiros.

O incidente ocorreu no perímetro de segurança de uma área militar onde o efetivo realizava uma “patrulha regular”, informou o Exército. Por meio de nota, emitida logo após o crime na tarde de domingo, o Comando Militar do Leste (CML) disse que os militares revidaram a uma “injusta agressão” de criminosos a bordo do veículo. Mas ontem, em um segundo comunicado, o órgão informou que dez dos doze militares que participaram da operação foram presos em flagrante por “inconsistência dos fatos reportados”.

Legenda: "Por que o quartel fez isso, meu Deus?", questionou a viúva do músico, muito emocionada
Foto: Tânia Rêgo/Agência Brasil

Família

A viúva de Evaldo afirma que depois do primeiro tiro pediu ajuda aos soldados, mas eles continuaram disparando. “Por que o quartel fez isso? Os vizinhos vieram para nos socorrer mas eles continuaram disparando. Pedi a um deles: ‘Ajuda meu marido!’. Não fizeram nada, ficaram debochando”, afirmou Luciana Nogueira. Em entrevista à TV Globo, na noite de domingo, o delegado Leonardo Salgado, da Divisão de Homicídios, disse que “tudo indica” que os militares do Exército atiraram ao confundirem o carro com o de assaltantes na região. 

“Foram diversos, diversos disparos de arma de fogo efetuados, e tudo indica que os militares realmente confundiram o carro com um veículo de bandidos. Mas neste veículo estava uma família. Não foi encontrada nenhuma arma. Tudo o que foi apurado é que realmente era uma família normal, de bem, que acabou sendo vítima dos militares”, afirmou o delegado.

Investigação

A Polícia Civil realizou uma perícia no local, mas a investigação está agora a cargo da Justiça Militar, tal como estabelece uma lei aprovada em 2017.  Os militares participaram nos últimos anos de operações contra a criminalidade no Rio, estiveram inclusive entre fevereiro e dezembro de 2018 à frente do comando da Segurança no Estado.

A ONG Rio de Paz manifestou “repúdio” à ação dos militares detidos e exigiu uma manifestação da Presidência, a quem as Forças Armadas respondem em última instância. “Apesar de todos os bons serviços prestados pelas Forças Armadas na patrulha ostensiva no Estado do Rio, a ONG Rio de Paz pede que toda a sociedade exija as autoridades, principalmente as que estão sob ordens do Ministério da Defesa, todo o rigor na investigação dos fatos”. 

Autoridades

Nesta segunda, o porta-voz da Presidência, Otávio do Rêgo Barros, disse que o presidente confia na Justiça Militar. O governador do Rio de Janeiro, Wilson Witzel, que prometeu ao assumir o cargo, em janeiro passado, aplicar uma política dura contra crime, em um discurso sintonizado com o de Bolsonaro, não se manifestou.
Witzel defendeu recentemente que a Polícia tenha atuação contundente e letal contra criminosos que portem armas de guerra, além do uso de atiradores de elite (snipers) em operações policiais.