Atuação de promotores contra políticos deve ser investigada pela corregedoria do MP

O relator do CNMP, Luiz Fernando de Mello, sugere que sejam apuradas eventuais alterações no tempo usual dos processos com o objetivo de causar "impacto nas eleições”

Escrito por Redação ,

O advogado Luiz Fernando Bandeira de Mello, relator do CNMP (Conselho Nacional do Ministério Público) emitiu nesta terça-feira (11) memorando em que sugere a investigação acerca de eventuais irregularidades na atuação de membros do Ministério Público (MP) contra políticos que disputam a eleição deste ano.

No documento, dirigido à Corregedoria Nacional do Ministério Público, o conselheiro do CNMP cita as recentes denúncias do MP contra os presidenciáveis Fernando Haddad (PT-SP) e Geraldo Alckmin (PSDB-SP), além do candidato ao Senado Beto Richa (PSDB-PR), preso nesta terça-feira em operação conjunta do MP do Paraná e Operação Lava-Jato.

Mello recomenda que sejam analisados “o tempo decorrido entre a suposta prática dos crimes delituosos e a propositura das ações”, a fim de identificar se eles sofreram alteração no tempo usual dos processos com o objetivo de causar "impacto nas eleições”.

O conselheiro ainda ressalta que "um promotor não pode deixar de ajuizar uma ação cujos procedimentos preparatórios foram concluídos, por acaso, à época da eleição, mas também não pode reativar um inquérito que dormiu por meses ou praticar atos em atropelo apenas com o objetivo de ganhar os holofotes durante o período eleitoral".

Veja o texto do documento na íntegra:

Ao Exmo. Sr. Corregedor Nacional do Ministério Público

Assunto: Apuração da regularidade da instrução de feitos que possam ter impacto nas eleições de 2018

Sr. Corregedor Nacional,

Cumprimentando-o, sirvo-me do presente para manifestar a V.Exa. preocupação surgida de recentes fatos envolvendo o Ministério Público brasileiro e o regular andamento das eleições gerais de outubro de 2018. 

Como é de conhecimento público, em 27 de agosto deste ano, o promotor de justiça do Ministério Público de São Paulo, Wilson Coelho Tafner, propôs ação civil pública por suposta prática de ato de improbidade administrativa contra o senhor Fernando Haddad, que 20 dias antes havia sido indicado como candidato a vice-Presidente da República na chapa do Partido dos Trabalhadores, por fatos supostamente praticados no exercício do cargo de prefeito municipal de São Paulo, em 2013.

Dias depois, em 04 de setembro, nova denúncia, dessa vez relativa à imputação de suposta corrupção e lavagem de dinheiro, é apresentada pelo promotor Marcelo Mendroni, também do MP/SP, contra o mesmo cidadão, por fatos vinculados à eleição de 2012, seis anos atrás, portanto. Ambas as ações teriam sido motivadas pelo teor das declarações feitas pelo sr. Ricardo Pessoa no âmbito de acordo de colaboração premiada.

No dia seguinte, 5 de setembro, nova ação por improbidade administrativa, desta feita contra o senhor Geraldo Alckmin, sabidamente candidato ao cargo de Presidente da República por coligação partidária capitaneada pelo Partido da Social Democracia Brasileira. Os fatos ilícitos teriam sido praticados de abril a outubro de 2014. Nesse caso, chama a atenção a notícia de que o promotor responsável pelo caso, Ricardo Manuel Castro, do MP/SP, teria convocado outros promotores para que comparecessem a entrevista coletiva, a fim de “contar com a presença do maior número possível de colegas, para demonstração de união”.

Na data de hoje, 11 de setembro, tomei conhecimento de operação conjunta do Ministério Público do Estado do Paraná e do Ministério Público Federal, que teria ocasionado a prisão do candidato ao Senado pelo PSDB do Paraná, Carlos Alberto Richa. Os fatos supostamente teriam sido praticados entre setembro e outubro de 2014. 

A mídia noticiou ainda fatos assemelhados nas últimas semanas, atingindo outros candidatos nas eleições atuais.

Considerando o tempo decorrido entre a suposta prática dos atos delituosos e a propositura das ações, e particularmente a coincidência de tal propositura com o processo eleitoral, solicito a V.Exa. que a Corregedoria Nacional verifique cada um desses casos, examinando os atos que foram praticados nos procedimentos preparatórios ou inquéritos nos últimos 24 meses para saber se ocorreram atos tendentes a acelerar ou retardar as investigações a fim de produzir tal coincidência temporal e consequente eventual impacto nas eleições.

Resta evidente que um promotor não pode deixar de ajuizar uma ação cujos procedimentos preparatórios foram concluídos, por acaso, à época da eleição, mas também não pode reativar um inquérito que dormiu por meses ou praticar atos em atropelo apenas com o objetivo de ganhar os holofotes durante o período eleitoral.

Em outras palavras, apertando a síntese: proponho que esta Corregedoria investigue a regular cronologia dos procedimentos preparatórios de tais ações (e se houve coincidência proposital com o calendário das eleições) e não o mérito das acusações contra os candidatos, já que essa análise é de competência exclusiva do Poder Judiciário e encontra-se protegida pelo Enunciado nº 6 deste CNMP.

Estou seguro, senhor Corregedor, que essa verificação da Corregedoria Nacional confirmará minha percepção de que tais procedimentos refletirão a conduta correta, imparcial e não dirigida ao calendário eleitoral dos membros do Ministério Público. Mas entendo que a ausência de uma apuração mínima permitirá que desconfianças maldosas possam fermentar dúvidas quanto à atuação do Ministério Público brasileiro, cuja imagem é nosso dever defender.

Atenciosamente,

LUIZ FERNANDO BANDEIRA DE MELLO

Conselheiro Relator