Seu Alexandre e a violência

Alexandre é um senhor de meia-idade, pernambucano de nascimento, que conheci há cerca de dois ou três anos, perambulando pela rua onde moro e pedindo constantemente ajuda para a compra de remédios. Durante todo esse tempo, ele, que sofre de problemas neurológicos, falou-me de suas idas e vindas aos peritos da Previdência Social, tentando obter uma aposentadoria (ou "aposento", como costuma dizer ) que, no entanto, jamais conseguiu, embora seu estado de nervos justificasse plenamente tal concessão, pelos muitos medicamentos que precisa tomar para controlar seus distúrbios. Mas, da penúltima vez que o vi, há mais de ano, esse cidadão estava muito contente. Após muita luta, havia conquistado o direito de habitar seu próprio teto: um apartamento simples, do programa Minha Casa, Minha Vida, na região do Conjunto Prefeito José Walter. Desde então, não voltei a vê-lo, até que, na semana passada, ele voltou a tocar a campainha de minha casa.

Curiosamente vestido - blusa branca, paletó e calça social pretos, calçado apenas com um par de sandálias de borracha - e portando uma pequena bolsa de mão, igualmente preta, revelou-me a razão de sua visita. Contou-me que subitamente, como ocorrera a outros moradores do local onde tinha seu modesto lar, fora expulso à força pela ação de uma guerra de facções. Sem a aposentadoria, sem dinheiro para comprar os remédios de que precisa, resolvera pedir ajuda para a compra de uma passagem e voltar a Pernambuco. Lá, morará com a mãe num assentamento do Incra situado no Interior. 

"Seu" Alexandre desiludira-se, assustado, somando-se às vítimas dessa violência que atinge a periferia de Fortaleza, fomentada pela ação de bandidos perigosos. Marginais, gente impiedosa que não hesita em pôr na rua famílias inteiras, sem que sobre eles recaia, rápida e mais impiedosa ainda, a mão de um Estado hoje fraco e desmoralizado. Sofrem os humildes, já humilhados pela precariedade da saúde e educação públicas, agora também com a ação de traficantes perversos. Tomara que, após tanto sofrimento, melhor sorte tenha o "seu" Alexandre , de volta à terra natal. 

Gilson Barbosa
Jornalista