Reajuste extravagante

Após o presidente Michel Temer anunciar que não postergaria o reajuste dos servidores públicos para 2020, o governo voltou atrás e publicou, nesta segunda-feira (3), a Medida Provisória que adia o reajuste. Contudo, a matéria ainda precisa do crivo do Congresso, e a manifestação precipitada e hesitante do presidente deve dificultar ainda mais sua aprovação.

Trata-se de mais um episódio em que os interesses políticos e corporativistas sobrepujam as reais necessidades do País. O não adiamento fará com que o próximo chefe do Executivo herde números ainda piores nas contas públicas, como se já não bastasse o enorme déficit atual.

Caso houvesse se atido à dureza matemática e técnica, o governo federal não teria, em momento algum, desistido de barrar os aumentos em 2019. Sem a medida, deixará de economizar preciosos R$ 6,9 bilhões, tornando o Orçamento do próximo ano mais apertado.

Considerando o intervalo de 2017 a 2019, a folha do funcionalismo público terá incremento de 13,7% acima da inflação do período, o que não condiz com a situação de intenso desgaste no Tesouro. Somente no ano passado, o reajuste dos funcionários superou a inflação em 6,5%, enquanto o rendimento médio dos trabalhadores brasileiros foi apenas 2,4% maior que o índice inflacionário.

Ademais, os ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) fecharam acordo para terem seus vencimentos reajustados em 16,38%. A elevação provoca diretamente uma despesa adicional de R$ 250 milhões por ano, conforme cálculos do Ministério do Planejamento. Mas o impacto será maior, pois tal remuneração funciona como teto constitucional de salários para o serviço público de modo geral, e qualquer alteração nela ocasiona aumentos em outros cargos, num efeito cascata que custa caro ao País.

Ao fazer tantas concessões, a União passa a mensagem errada à sociedade. O perdularismo estatal é um desestímulo para os contribuintes, os quais já são avessos à agenda de reformas.

Se o governo não age com a devida parcimônia sobre suas próprias engrenagens burocráticas, convencer o povo acerca da importância das reformas estruturais, como a da Previdência, torna-se um desafio hercúleo. Aliás, a população tem plena consciência de que os recursos para essas imprudências financeiras saem do seu bolso.

A melancólica reta final do governo Temer está na contramão das promessas para reequilibrar as contas nacionais, sob máximo rigor possível com o erário. Essa gestão conseguiu aprovar medidas relevantes para a sustentação fiscal, mas em diferentes ocasiões, quando lhe fora politicamente conveniente, repetiu erros de administrações anteriores e não conteve gastos que poderiam ser evitados.

No caso do reajuste dos servidores, a poucos meses do fim do mandato, deveria ter sido priorizada a saúde fiscal do País. Deixar como herança um Orçamento menos restrito seria mais honroso. Alvo de massiva impopularidade e desgastado politicamente, Temer deveria usar os meses restantes à frente do Planalto para alicerçar o terreno a seu sucessor. Em vez disso, entregará as finanças em processo de corrosão.

Caso não haja o adiamento, a nova previsão é que o próximo governo tenha apenas R$ 94 bilhões para despesas não obrigatórias, R$ 30 bilhões a menos que neste ano. O eleito terá a missão de manter o funcionamento de serviços e órgãos importantes mesmo com o caixa tão debilitado. Embora o assunto tenha sido evitado em campanha, o futuro presidente terá de impor medidas severas.