O aumento do ICMS

Está em cogitação, no âmbito do Estado do Ceará, um aumento do ICMS incidente sobre energia elétrica, comunicações e combustíveis, que passariam a ser onerados pela alíquota de 27%. Trata-se de aumento considerável, especialmente se se considerar que tais produtos integram o custo de praticamente tudo o que é produzido, transportado, conservado e consumido no Estado.

Conforme tem noticiado a imprensa, entidades representativas elaboraram documento no qual demonstram a inconveniência desse aumento, em face de seu caráter inflacionário, do ônus que representaria para a produção, da redução que causaria no consumo, etc. Aliás, poderia haver até mesmo queda na arrecadação do ICMS, não apenas em face da redução no consumo, mas também por conta de possível aumento da evasão e da elisão fiscal. Enfim, as razões políticas que desaconselham o aumento são as mais variadas, e todas procedentes.

Há, porém, um outro aspecto da questão, de cunho jurídico, e que igualmente inviabiliza o aumento pretendido: trata-se da essencialidade dos bens a serem onerados pela alíquota majorada de 27%. De acordo com a Constituição Federal, o ICMS poderá, ou não, ser seletivo. Isso significa o Estado poderia optar entre estabelecer uma mesma alíquota para todos os produtos (imposto não seletivo), ou então poderia estabelecer, como efetivamente o fez, alíquotas diferenciadas para produtos distintos (imposto seletivo). Entretanto, uma vez adotado o ICMS seletivo, a Constituição exige que o critério dessa seletividade, ou seja, o critério pelo qual a alíquota do ICMS será menor ou maior, deverá ser necessariamente o da essencialidade das mercadorias e dos serviços onerados pelo imposto (Art. 155, § 2º, III).

É por isso que se diz que a alíquota de 25% do ICMS, a mais alta do Estado até o momento, onera produtos “supérfluos” tais como o fumo, bebidas alcoólicas, armas e munições, jóias etc., enquanto a generalidade das mercadorias submete-se ao imposto pela alíquota de 17%, e produtos essenciais, como os que integram a cesta básica, contam com alíquotas reduzidas de base de cálculo, isenções etc.

Nesse contexto, já soa completamente absurda, e inaceitável, a legislação atual do Estado, que equipara a energia elétrica, os combustíveis e os serviços de telecomunicação, de essencialidade indiscutível em qualquer sociedade moderna, a produtos como o fumo e as bebidas alcoólicas, a fim de sofrerem todos um ônus de 25%. Não é de hoje que, aliás, com afundamento nas lições do professor Ivan Lima Verde, criticamos essa inversão do critério da essencialidade (Cfr. Revista Dialética de Direito Tributário Nº 62, Pág. 70). Na verdade, o que ocorre na tributação de tais produtos é um evidente desvio de finalidade: o Estado os onera de modo excessivo exatamente porque são essenciais, e não se pode deles prescindir, além de ser muito cômoda e eficaz a arrecadação junto a apenas três ou quatro grupos de empresas (refinarias, concessionárias etc).

Caso seja aprovado o aumento que ora se cogita, que fará com que o ICMS incidente sobre energia elétrica, combustíveis e telecomunicações passe a 27%, ter-se-á agravada a situação descrita acima, tornando ainda mais clara a violação ao critério da essencialidade. Produtos indispensáveis à vida moderna, dos quais depende a fabricação, o transporte e a conservação de todos os demais, serão onerados por alíquota igual ou mesmo superior àqueles considerados realmente supérfluos, em solene demonstração do desprezo que nossos representantes têm pela Constituição.

O autor é advogado e membro do
Instituto Cearense de Estudos Tributários