Editorial: Vocação de raiz

A notícia é auspiciosa: a safra de cereais, leguminosas e oleaginosas no Brasil deve concluir as temporadas deste ano com colheitas totalizando 240,7 milhões de toneladas. Isso representa, segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), crescimento de 6,3% em relação ao que se produziu em 2018. Nem os rigores do clima têm impedido as safras mais alentadas. 

Mais ainda: o estudo “Levantamento Sistemático da Produção Agrícola”, do IBGE, prevê que para setembro - com indicadores ainda em apuração e processamento - a safra deve ser 0,4% superior ao que havia sido estimado na pesquisa referente a agosto. 

Os números podem até parecer modestos, tendo em consideração as demandas gerais do País e a necessidade particular de a economia se recuperar, mas há leituras que merecem atenção especial. Uma delas diz respeito a uma das mais importantes culturas agrícolas do Ceará, a do algodão herbáceo - resultante em parcelas significativas de empregos, renda e tributos no campo. 

O IBGE indica para esse item um crescimento nacional de 39% - o que é, não se há de contestar, uma elevação em nível extremamente positivo, sobretudo por conta dos seis anos de seca verificados ultimamente no Nordeste e os já históricos estragos causados na lavoura pelo inseto bicudo. Essa mesma projeção se faz para o Ceará. 

Mas o algodão é apenas um recorte num panorama mais largo, e é a propósito desse horizonte que se amplia que se devem recapitular apreensões que o setor do agronegócio vem externando seguidamente. Este ano, líderes do segmento local já revelaram ao Diário do Nordeste esperar sensibilidade do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento para as dificuldades que o Estado enfrenta na produção rural. De outro modo, não se pode esperar que haja retomada num ritmo compatível com as necessidades. 

Mesmo atividades comezinhas do Ministério, como a fiscalização que precisa ser exercida em portos e aeroportos, acompanhada de medidas burocráticas, requerem, segundo produtores cearenses, incrementos oficiais. Do mesmo modo, o controle de agrotóxicos exige mais medidas e vontade política. 

Há, também, a legalização da produção de pequenas culturas, para as quais empreendedores apontam não haver ainda o suporte fitossanitário devido. Esse, de acordo com líderes do agronegócio, seria um dos pontos mais relevantes a serem tratados pelo Governo Federal. A vivência parlamentar da ministra Tereza Cristina Dias poderia ser uma referência para as correções que se pleiteiam. 

Avalia-se que o Brasil produza anualmente cerca de 23 milhões de toneladas dessas culturas de menor porte, entre frutas, flores, hortaliças e grãos, em geral com esforços da agricultura familiar e muitas vezes sem tecnologia ou mesmo amparo técnico das instituições públicas. Apesar desse montante, persiste uma fragmentação que isola, desagrega e, consequentemente, desorganiza setores inteiros. 

O fato é que o Ceará, o Nordeste e o País podem reencontrar com qualidade a vocação agropecuária que tanta serventia teve. O desafio é, também, fazer isso com base na modernidade. 


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