Editorial: Uma crise e duas visões

Há dúvidas sobre o que pretendem fazer, na economia, os presidenciáveis Jair Bolsonaro, do PSL, e Fernando Haddad, do PT, um dos quais será eleito presidente da República no próximo dia 28, quando se dará o segundo turno da eleição deste ano. O primeiro transmite insegurança quando desautoriza seu assessor econômico, Paulo Guedes, que por livre iniciativa chegou a insinuar a "privatização de tudo" e em resposta ouviu a opinião do chefe, para quem será privatizado "o que for possível". O segundo amplia a dúvida quando - de propósito ou não - omite o modelo previdenciário de sua lista de reformas. Ora, o atual regime de Previdência faliu, tem um déficit que cresce R$ 50 bilhões por ano, e subirá ainda mais porque a média de vida do brasileiro já passou dos 76 anos, o que amplia o universo dos aposentados e pensionistas.

São dois lados distintos representados pela dupla de candidatos. Um lado - o de Bolsonaro - atrela-se ao modelo liberal, que defende o Estado mínimo, com quase nenhuma intervenção estatal, o que pode não combina com as disparidades regionais. O espontaneísmo das forças do mercado tem hoje ou terá amanhã algum interesse no negócio de construir e manter redes de captação, tratamento e distribuição de água e esgoto em cidades como Tauá, Parambu ou Aiuaba? Claro que não, pois na região dos Inhamuns, onde elas se localizam, não há como retornar o capital investido. Aí, então, é e será o Estado necessário - e não o mínimo - que cuidará de levar saneamento básico às áreas mais pobres do País, e elas estão nos sertões e nas favelas das grandes metrópoles das quatro regiões.

O outro lado - que Fernando Haddad chama de social-democrata, ferindo a verdade, pois as forças que o apoiam são majoritariamente de ideologia socialista - quer reajustar as contas públicas por meio de uma reforma tributária, que transfira dos pobres para os ricos a pesada carga dos impostos; quer ainda uma reforma bancária, por meio da qual pretende abrir o mercado financeiro a uma concorrência maior - hoje restrita a cinco grandes bancos, o que força os juros para cima e leva a oferta de crédito para baixo, prejudicando o desenvolvimento nacional; e, por fim, propõe uma reforma política, algo com que o adversário também sonha. Olvidando a Reforma da Previdência, Haddad parece atender às corporações que se apropriaram da máquina pública nos três poderes da República, nos quais estão os privilegiados servidores com os mais altos vencimentos e os mais altos proventos da aposentadoria.

Como se observa, são pontos de vista diferentes sobre um tema que é o centro das preocupações de quem produz e trabalha no Brasil. Ou se conserta, e imediatamente, o rombo previdenciário por meio de uma reforma profunda, ou em pouco tempo - como adverte o economista Mansueto Almeida, secretário do Tesouro Nacional - faltará dinheiro para o pagamento das aposentadorias e pensões.

Para isso, será necessário e urgente que o presidente eleito - seja quem for - arregace as mangas no dia seguinte à eleição e passe a construir uma maioria que lhe garanta a aprovação não só da reforma previdenciária, mas das demais de que o País carece. Diz a tradição que um novo presidente dispõe de um tempo para as reformas - os seis primeiros meses de seu mandato. Perdidos estes, o governo terá poucas chances de êxito, e o sucesso da futura administração é o que deseja toda a sociedade. Afinal, o Brasil está, desde a desastrosa gestão de Dilma Rousseff, mergulhado numa crise que fez 13 milhões de desempregados. Estancá-la é tarefa a ser cumprida a 4 mãos: as do novo presidente e as do novo Congresso Nacional.


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