Editorial: Regulação necessária

As armas são, em princípio e fim, recursos materiais e tecnológicos dos quais forças bélicas e de segurança se valem para obter resultados conforme as estratégias que têm. Por isso, são de fato fundamentais para o Estado, que detém o monopólio desse nível de poder, a quem cabe regular seu uso e controlar o acesso, seja de quem for, a tais equipamentos. Armas não devem ser tornadas objetos da retórica política, uma vez que não se ajustam ao “toma lá dá cá” frequente no meio, considerando a letalidade que admitem como possíveis consequências.

Em síntese, trata-se de instrumentos que precisam, pela seriedade e pela atenção que exigem, ser mantidos distanciados dos interesses comerciais convencionais e preservados de comezinhos movimentos financeiros. As finalidades econômicas, importantes de serem consideradas em toda e qualquer questão, não devem ser determinantes dos debates e trâmites políticos que podem transformar a maneira como um povo tem acesso a armas. 

O gravíssimo caso dos rapazes que, na última quarta-feira, mataram um vendedor de automóveis e estudantes e funcionários de uma escola em Suzano (SP), que comoveu as opiniões públicas nacional e internacional, é mais do que um sinal de alerta para a perigosa política de descontrole de armas que se tem pregado. É um alarme para uma sociedade que, não tomando as rédeas da situação, tende a se tornar vítima e carrasco num cenário caótico.

O caso lembra as reiteradas tragédias sociais nas escolas de países como os Estados Unidos e, com menor frequência, do próprio Brasil. O caso é dos mais complexos e mostra o quão enganosos são os estereótipos e preconceitos que rondam os casos de violência. 

Em todos os episódios registrados no Brasil, assassinos em massa como esses tinham comportamento anterior pacato, sem envolvimento em ocorrências delituosas, eram retraídos e, em muitos casos, encobriam da família e de amigos as tendências homicidas, embora em algumas situações não escondessem a veneração por armas e por personagens violentos.

É cabível que se alegue que, diante de um quadro de dificuldades e inversões, as famílias têm a obrigação de se proteger de eventuais malfeitos. É fato. Mas esse direito não pode ser exercido de forma individualizada, apartada do todo. Deve, sim, ser implementado por intermédio do Estado – o ente legalmente constituído para agregar e organizar as pessoas, para respeitar os direitos e as obrigações comuns a todos. É imperativo que sejam seguidas regras rígidas, que haja a fiscalização minuciosa para que se minimize os riscos ao máximo e que se estimule uma postura responsável e não beligerante, compromissada não só com a segurança individual, mas também com a paz pública. 

Faz-se até desnecessário lembrar, frente a tantas e repetidas menções que, no bojo da Constituição Federal, a segurança e a educação, assim como o trabalho, a alimentação, a moradia, o lazer e a saúde ocupam os mesmos níveis de direitos sociais no Brasil. Mas cabe ressaltar que o bom-senso, a responsabilidade e a prudência também compõem o caráter de uma sociedade bem formada e que se respeita. Sem a solidez do presente, o futuro perde consistência.


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