Editorial: Patrimônio do Nordeste

Está domiciliado e reside na região nordestina um terço da população brasileira que, por isto mesmo, deveria ser o destino imediato e automático de 33% dos investimentos do Governo da União. Por motivos até hoje não explicados, isto jamais aconteceu. A esta parte da geografia brasileira – quase toda ela localizada no semiárido, onde são raquíticos os índices de pluviometria e de boas manchas de solo para a agricultura – chegam menos de 13% dos recursos liberados pelos organismos federais de fomento, entre os quais – destacadamente – o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES). 

Os fundos setoriais – como a Financiadora de Estudos e Projetos (Finep), administrado pelo atual Ministério da Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicações – enxergam e tratam, igualmente, o Nordeste como uma área de segunda classe, sendo avaros na aprovação de projetos de interesse da região, cujo desenvolvimento econômico tem sido sustentado pelo que ela tem de melhor – o Banco do Nordeste (BNB), cuja ameaça de fusão com o BNDES ainda se hospeda em algumas mentes do Ministério da Economia. 

O BNB é, há quase 70 anos, o único e o principal organismo federal a financiar a atividade econômica regional. Assim, a notícia de que poderia fundir-se com o BNDES causou não apenas surpresa e comoção, mas revolta em toda a sociedade nordestina, mobilizando desde sua liderança política – com os governadores à frente – até o universo acadêmico, que vê na Instituição um centro de excelência do serviço público dedicado ao incremento da agricultura, indústria, comércio, serviços, infraestrutura e cultura nordestinos. 

Os tecnocratas do Ministério da Economia entendem que o BNB e o Banco da Amazônia (Basa), que também seria incorporado ao BNDES, envolveram-se com a má gerência, têm problemas de gestão e tornaram-se inchados (o Banco do Nordeste tem 7 mil funcionários; o Basa, 3 mil) e precisam enquadrar-se nos novos padrões de governança do poder público. A equipe do ministro Paulo Guedes parece disposta a matar a vaca em vez de extirpar o carrapato que a teria feito doente. 

O BNB sempre esteve focado na sua missão constitucional de fomentar o desenvolvimento regional. E o tem feito sob o rigor da análise eminentemente técnica, afastando-se das pressões da política e dos políticos. Contra a ideia de fusão do BNB com o BNDES levantaram-se – e mantêm-se pintados para a guerra – os governadores, as assembleias legislativas estaduais e toda a bancada nordestina de deputados federais e senadores, integrada também pelos parlamentares de Minas Gerais e do Espírito Santo, que têm parte do seu território incluída na área de atuação do banco. 

O Nordeste e os nordestinos apoiam a estratégia do Governo da União de – ética, moral e administrativamente – blindar o BNB das ingerências da má política. Mas rejeitam a ideia de extingui-lo pela via da fusão. Parte substancial da base industrial, comercial, agropecuária e de serviço – o turismo no meio – que a região do Nordeste exibe hoje é resultado dos financiamentos concedidos pelo BNB, cujos êxitos são infinitamente maiores do que seus circunstanciais equívocos. Estes, importante salientar, permeiam qualquer atividade humana.


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