Editorial: Participação Cidadã

A acalorada polarização política que varreu o Brasil – e foi determinante nas Eleições de 2018 – explicitou o desafio de fazer valer a representatividade na democracia nacional. Não é um problema simples, pois o que está em questão é um pilar do sistema político adotado no País; e, reconheça-se, um dos objetivos de qualquer regime democrático. A escolha nas urnas deve ser entre projetos que, mesmo sendo determinados por valores partilhados por este ou aquele grupo, contemplem todos os setores da sociedade.

O ideal, contudo esbarra no real. Há representantes que ignoram sua missão, seja no Poder Executivo, seja no Legislativo, como se seu trabalho devesse atender exclusivamente os interesses de sua base eleitoral ou de seus apoiadores. Mais do que isso, estes casos desviantes não se limitam à defesa do interesse de uns, protagonizando ataques a outros grupos, por vezes, por questões ideológicas.

Claro, não se deve julgar um conjunto de regras – e, no caso, um sistema político – a partir da conduta daqueles que o desrespeitam ou se aproveitam de brechas nele para agir em interesse próprio. A imperfeição é inerente aos feitos do homem; o ímpeto de aperfeiçoamento, por sua vez, é saudável disposição a se adotar, particular ou coletivamente. Portanto, há de se buscar meios, legais, de fazer-se cumprir as determinações oficiais e, no caso da política, dos valores e práticas delineados pela Constituição Federal de 1988.

O espaço onde é gestado tal aperfeiçoamento é o das casas legislativas. Mudanças são feitas, com resultados ora eficazes, ora regressivos. Fora dali, há também movimentações por parte da sociedade que, de certa forma, repensam o tipo de modelo representativo adotado no País. Agrupamentos que se originam e se desenvolvem à margem dos partidos políticos são exemplares nesse sentido. Há, ainda, as incursões individuais, no sentido de contribuir para ações e orientações do poder público.

Não se deve deixar de notar que tais iniciativas precisam respeitar a hierarquia das decisões no País e as funções dos agentes públicos. Abolir as regras e desrespeitá-las é ideia alimentada pelas paixões do momento ou pelas intenções que conflitam com o interesse público. Há meios de se atuar, valendo-se das estruturas das instituições em funcionamento pleno no Brasil.

Alguns caminhos são promissores e é mister incentivar a abertura de novas frentes, sempre pelas vias corretas e constitucionalmente responsáveis. Na última semana, o Senado Federal aprovou o primeiro projeto de lei, oriundo de uma sugestão legislativa popular, encaminhada por meio do Portal e-Cidadania. O PL 4.399/2019 altera a Lei 8.213, de 1992, passando a incluir a fibromialgia entre as doenças dispensadas de carência para o recebimento de benefícios do auxílio-doença e aposentadoria por invalidez. O portal visa estimular a participação de cidadãos nas atividades legislativas, orçamentárias, de fiscalização e de representação no Congresso. As ideias enviadas precisam ser endossadas por, pelo menos, 20 mil pessoas.

Episódios do gênero mostram que, no jogo democrático, há formas de aperfeiçoar mecanismos de representação. Em tempos que este ideal parece fragilizado, é algo que chega a ser inspirador.


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